Ribeirão Preto, 05 – O cenário de incerteza da pecuária bovina, o aumento dos riscos e a falta de liquidez do mercado futuro levaram os grandes frigoríficos a suspenderem as compras de boi a termo. Por esse tipo de operação, comum no mercado até no ano passado, companhias e pecuaristas firmavam contratos para a compra futura de um volume físico de bovinos a preços prefixados pela arroba. Além disso, segundo executivos do setor que participam do encontro de confinadores e recriadores da Scot Consultoria, em Ribeirão Preto (SP), a queda na demanda pela carne freou a procura por animais de melhor qualidade e programas de certificação de raças feito pelas companhias com os pecuaristas foram suspensos.

Segundo Fabiano Tito Rosa, gerente de compra de gado da Minerva Foods, diante da baixa liquidez e da queda no número de contratos de boi gordo negociados na BM&FBovespa, as companhias têm mais dificuldade de buscar no mercado futuro a proteção para os negócios feitos no mercado a termo. “Quando a gente fazia o termo, 100% do risco era do frigorífico. Diante do mercado atual, com a ameaça ao fluxo de caixa das chamadas de ajuste, não vale a pena”, disse. “Este ano, ou uma parte deste ano, não vamos fazer (compras a termo). Mas, sim, no ano próximo, posso reavaliar”, disse.

A Minerva Foods, segundo ele, oferece outras opções ao pecuarista, entre elas as compras no balcão, e ainda está montando operações de “barter” que são as trocas de insumos para a pecuária pelo correspondente em arrobas de animais a serem abatidos no futuro. Leandro Bovo, sócio da Radar Investimentos, ratifica a posição de Tito Rosa e lembra que o número de contratos abertos na BM&FBovespa para o boi gordo chegou a 70 mil no passado e hoje está em 10 mil, o que mostra a baixa liquidez no mercado futuro. “Companhia precisava travar na bolsa para negociar com o pecuarista, o que está difícil. Para o pecuarista, uma saída são os contratos de opção de venda, os quais, na prática, ele compra um seguro para poder vender a arroba por um preço mínimo no mercado futuro ou negociar por um valor maior no mercado físico.”

Segundo Fabio Dias, diretor de relacionamento com o pecuarista da divisão de carnes da JBS, seria uma irresponsabilidade a companhia fazer operações a termo sem poder se proteger na bolsa. “Basicamente foi questão de gestão de risco. O problema é que ficou muito arriscado para os frigoríficos carregarem essas posições”, disse o executivo. Segundo ele, a JBS já tinha uma parcela baixa de aquisição de bovinos a termo desde o ano passado, com 20% de toda a compra feita por esse tipo de operação.

Já Mauricio Manduca, gerente da mesa de negócios da Marfrig Global Foods, diz que a companhia até tentou operar negócios a termo no começo de março, mas pecuaristas rejeitaram as ofertas feitas para a venda em maio e outubro. Segundo ele, antes da Operação Carne Fraca, o contrato futuro de maio apontava uma arroba do boi entre R$ 143 a R$ 145 e a empresa oferecia R$ 141 para venda a termo, por exemplo. “Para outubro a oferta era de R$ 145 a arroba, um ótimo negócio hoje (com a queda dos preços), mas ninguém fez”, afirmou.

Certificação

Já a paralisação da certificação de raças – programa pelo qual frigoríficos auditavam rebanhos e pagavam prêmios pela melhor qualidade das carnes – foi por conta dos impactos da crise econômica na demanda por proteína animal, de acordo com Manduca. “A gente vive um cenário em que o impacto da crise chegou ao setor produtivo e ao consumidor. Estamos ajustando produção frente à necessidade real, um ajuste normal de mercado”, disse. Manduca explicou ainda que, apesar de a companhia pagar uma premiação por todo animal certificado de uma determinada raça no passado, “infelizmente tínhamos inúmeros cortes de qualidade sem valorização no mercado, o que comprometia a rentabilidade”.

Fabio Dias, da JBS, afirmou que a certificação custa caro aos frigoríficos e é preciso demanda para mantê-la. “Há um problema de colocação de grandes volumes de carne de alta qualidade, apesar do crescimento na demanda”, disse. Já Fabiano Tito Rosa, da Minerva Foods, considera que frigoríficos têm de se ajustar às condições do mercado. “Certificar tem custo, pois é preciso que o frigorífico coloque um técnico para avaliar a qualidade do processo. Se mudarem as condições de mercado, mudará estratégia”, afirmou.