Os empréstimos imobiliários cresceram 46,8%, o que eleva o risco de inadimplência se o crescimento da economia diminuir. “Há uma bolha no crédito imobiliário e ela vai estourar em algum momento”, diz Fernando Blanco, ex-presidente da empresa de seguro de crédito Coface, que criou a ONG Instituto para o Desenvolvimento da Cultura do Crédito (IDCC).

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Há uma bolha no crédito imobiliário e ela vai estourar em algum momento

DINHEIRO – A inadimplência está sob controle?

FERNANDO BLANCO – Hoje está, mas isso não significa que estará controlada amanhã. A inadimplência está baixa porque a economia está crescendo e as pessoas estão empregadas. O aumento da inadimplência fica escondido no crescimento dos empréstimos dos bancos. À primeira vista, está perfeito. Mas os empréstimos de hoje têm de ser pagos amanhã.

 

 

DINHEIRO – O que pode ocorrer no curto prazo?

BLANCO – É preciso ficar atento com o comportamento das famílias das classes B, C e D que se endividaram há 24 meses. Muitas delas começaram a consumir sem controle, com a compra do imóvel e do carro novo. Essas pessoas não têm fôlego financeiro para se recuperar em caso de uma perda de emprego, por exemplo.

 

 

DINHEIRO – Qual linha de financiamento é mais preocupante?

BLANCO – O cartão de crédito, que utiliza o parcelamento sem juros com estratégia de vendas. Se o consumidor entrar no crédito rotativo ele pagará juros acima de 100% ao ano.

 

 

DINHEIRO – O que indica que o consumo está sem controle?

BLANCO – O endividamento perigoso é o de produtos não duráveis, como os alimentos. Outro exemplo está nas livrarias. É preocupante ver itens de pequeno valor como livros e CDs sendo parcelados. 

 

 

DINHEIRO – Há risco de formação de bolha em algum mercado?

BLANCO – Há uma bolha óbvia no crédito imobiliário e ela vai estourar em algum momento, afetando as pessoas que compraram imóveis sem ter posses. Não será nada sistêmico, como a bolha imobiliária de 2008 nos Estados Unidos, em que os bancos quebraram. Aqui, um imóvel de R$ 500 mil vai passar a valer R$ 400 mil ou menos. 

 

 

DINHEIRO – A recuperação de crédito vive um bom momento?

BLANCO – Sim. As empresas vendem mais, as pessoas têm emprego e todos conseguem pagar as contas atrasadas. É diferente do que ocorreu há um ano, quando houve muita inadimplência e não se tinha de quem cobrar.

 

 

DINHEIRO – Pessoas e empresas têm o mesmo acesso a crédito?

BLANCO – Os bancos começaram a emprestar ao varejo em março de 2009. As empresas, principalmente as pequenas, só começaram a ter crédito farto no segundo trimestre de 2010. Os bancos temiam o impacto da crise nos balanços, mas as empresas não estão muito endividadas e estão crescendo com solidez.

 

 

DINHEIRO – O País está perto da maturidade do uso do dinheiro?

BLANCO – Sim. Nosso crédito é jovem. Não temos dez anos consistentes de crédito. O que vivemos é um ótimo momento, mas só quando sofrermos o primeiro refluxo é que saberemos se os bancos continuarão a emprestar.

 

 

DINHEIRO – O que isso significa?

BLANCO – Se o crescimento econômico cair para 3,5% ao ano, será um motorista que dirige a 180 quilômetros por hora e pisa no freio para fazer uma curva a 80 quilômetros por hora. O risco de bater a cabeça no para-brisa aumenta.

 

 

DINHEIRO – Então, de que maneira agir?

BLANCO – O crédito é bom, promove a inclusão social, mas seu crescimento deveria ser menos acelerado, para evitar problemas no futuro. Os empréstimos deveriam vir com um aviso em vermelho: este produto pode causar problemas financeiros sérios.