01/02/2012 - 21:00
O ano de 2011 poderia ter sido um período dos sonhos para os negócios da BMW no Brasil, com um aumento de 60% nas vendas da empresa e a intenção de construir uma fábrica no País, que seria a primeira unidade da montadora na América do Sul. Mas a elevação de 30 pontos percentuais promovida pelo governo federal no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) dos carros importados ameaça transformar o futuro em um pesadelo. O imposto vai se refletir em carros mais caros e numa queda prevista de quase um terço nas vendas. Pior ainda: coloca em xeque os projetos da fábrica no Brasil , como revela o presidente da empresa, o carioca Jörg Henning Dornbusch. Confira a entrevista do executivo à DINHEIRO:
“Aumento no IPI dos automóveis pode não justificar o investimento
necessário para uma fábrica no Brasil.”
Como foi o ano de 2011 para a BMW?
O grupo teve o melhor período de sua história em termos de crescimento no mercado global. Foram 14% de aumento na comparação com 2010, com 1,68 milhão de carros vendidos. O crescimento foi puxado pela China, mas também foi alto nos EUA, onde somos líderes do segmento premium do mercado. Foi importante crescer mesmo em meio à crise mundial.
No Brasil, como foi o desempenho?
O aumento do IPI veio justamente em um momento excepcional para nós. Após um crescimento médio de 25% a 30% nos últimos cinco anos, tivemos uma elevação de 60% nas vendas em 2011. E isso foi em todas as nossas marcas: aumento de 57% para a BMW, 91% para a Mini e 49% para a Motorrad (segmento de motos). Obviamente a elevação do imposto alterou nossa perspectiva para 2012. Agora estamos prevendo uma retração forte nas nossas vendas este ano, possivelmente em torno de 30%. Se, no ano passado, a linha BMW vendeu aproximadamente 12,4 mil carros, devemos ficar em torno de 8 mil a 9 mil unidades em 2012.
O aumento do IPI será integralmente repassado para o consumidor?
Ainda estamos fazendo reuniões para definir de quanto será o repasse, mas será menos do que os 30 pontos percentuais de elevação do imposto. Haverá sacrifício de todos para isso, tanto da rede de concessionárias quanto da montadora. A tendência é que nenhum de nossos modelos fique abaixo de R$ 100 mil, com exceção talvez do Mini One.
O presidente mundial do grupo, Norbert Reithofer, chegou a anunciar a intenção de construir uma fábrica no Brasil. Em que pé está realmente esse projeto?
Existe hoje um impasse sobre a fábrica por causa do IPI. Já havíamos começado a conversar com o governo desde março do ano passado. Apresentamos nossos planos e nosso cronograma. Mas, no dia 15 de setembro, fomos surpreendidos pelo anúncio (da elevação do imposto). Isso alterou todo o nosso business case. Tínhamos então uma curva ascendente de vendas, mas agora mudou tudo. Entre o anúncio da fábrica e o início da fabricação no País, são pelo menos três anos. Se prevemos uma queda de 30% nas vendas com o imposto, o que fazemos até lá? Como eu vou encaixar essa diferença em nossas planilhas de custos? Essa queda pode não justificar uma empreitada dessas.
O IPI pode então inviabilizar a fabrica?
A decisão de fazer algo no Brasil está avançada, mas surgiu esse soluço forte (o IPI). Essa decisão está forte, mas não está tomada. É preciso negociar, porque financeiramente você tem problemas para justificar o investimento. O Brasil ainda representa menos de 5% do faturamento total do grupo no mundo. A fábrica já deveria ter sido anunciada em novembro. Nosso projeto para ela era quase um livro, tudo muito sério, muito alinhado com a matriz. Nem gosto de pensar na ideia de que o investimento possa ser direcionado para outro país. Mas é fato que toda a concepção do negócio sofreu um solavanco.
Qual a reivindicação do grupo?
Queremos que o governo estabeleça uma flexibilização para empresas que têm todo o cronograma de instalação da fábrica pronto, o que faria com que chegássemos ao índice de nacionalização exigido (65%) em alguns anos. E estamos falando de uma fábrica modelo full plant (fabricação completa dos veículos) e não de SKD (Semi Knocked Down, em que as partes do carro já vêm completas e são apenas montadas localmente). Temos apoio de alguns setores do governo, mas há uma resistência de outras áreas, como a Fazenda, que temem perder receita. O que é meio sem sentido, na minha opinião. Afinal, os carros importados só representam 5,8% do mercado brasileiro. A queda nas vendas é que vai gerar perda de receita, não a flexibilização dessa cobrança.
Fala-se principalmente em Santa Catarina e no Paraná como locais da nova fábrica. Quais são os locais em estudo?
Eu não posso falar nada sobre isso. É uma negociação estratégica relevante para nós. Se eu falo qual lugar é mais provável, no dia seguinte tem vários governadores e prefeitos me ligando para cobrar. Só posso dizer que as negociações estão avançadas para o anúncio, caso a construção da planta seja viabilizada.
Qual será a estratégia do grupo para enfrentar um ano que promete ser difícil?
Para a linha BMW, vamos prosseguir com nossa estratégia-mãe, que é fazer eventos em locais onde temos revendas. Vou focar mais a parte cultural. Teremos novamente o BMW Jazz Festival, que foi um grande sucesso na última edição, com os ingressos para as três noites vendidos em duas horas. E também vamos concentrar nossos esforços na linha esportiva. Já no caso do Mini, abriremos novas revendas.
Quais serão os maiores lançamentos da BMW em 2012?
Nossos dois principais novos modelos no Brasil deverão ser o Série 3 (sedã esportivo de luxo, com preço estimado a partir de R$ 200 mil), em maio, e a nova geração do Série 1 (hatch de entrada da marca, com custo inicial em torno de R$ 100 mil), já no início do ano.
Por que há tanto investimento em carros híbridos e elétricos se esse é um mercado estagnado?
A reação não é imediata a investimentos desse tipo. Você trabalha para os próximos 10 a 20 anos, à medida que as fontes de combustíveis fósseis vão se tornando mais raras. Talvez daqui a uma ou duas décadas já possamos ter uns 10% do mercado formado por veículos com propulsão elétrica ou híbrida. É importante lançar modelos para estar sempre na vanguarda desse segmento, até porque essas tecnologias ainda precisam se desenvolver mais.