14/11/2013 - 6:30
Em um mercado conhecido pela carência de informações consolidadas e dados confiáveis, como o setor imobiliário, o executivo Sérgio Freire é um privilegiado. Comandando a empresa de intermediação e consultoria imobiliária Brasil Brokers, de capital aberto, ele tem acesso a uma visão geral dos negócios no setor através do desempenho de seus clientes, que incluem as maiores incorporadoras do País. Freire revela à DINHEIRO o perfil do setor no Brasil, passado o período de alta desenfreada dos preços dos imóveis dos últimos cinco anos.
Como está o setor imobiliário em 2013?
Desde o fim do ano passado, deixou de ser fácil. Isso não significa que ficou difícil, mas, sim, que voltou ao normal. Nunca foi uma métrica de mercado vender 100% de um empreendimento em um fim de semana, como estava acontecendo até recentemente. Durante muito tempo, isso era um mau sinal. Significava que se vendeu barato.
Por que houve tanta euforia?
Durante muitos anos, o mercado foi reprimido. Os compradores e as construtoras não tinham acesso a crédito. Quando o crédito apareceu, o mercado explodiu e, então, apareceu uma série de gargalos. De repente, todas as construtoras queriam comprar o mesmo terreno, contratar o mesmo engenheiro e alugar a mesma grua.
O comprador mudou?
Ele está mais seletivo. Quando o mercado explodiu, os clientes sabiam que, se não comprassem naquela hora, o imóvel custaria 3% a mais no dia seguinte. Se alguém vendesse um imóvel e quisesse adquirir um novo, não podia demorar muito, senão iria perder dinheiro.
Agora o comprador pode escolher com calma e comprar melhor?
Há muita oferta. Algumas incorporadoras estão fazendo descontos. Então, o comprador tem muito mais poder do que antes. Até há pouco, o vendedor era quem tinha mais força. Ele escolhia para quem vender. Hoje o comprador escolhe o imóvel que vai comprar.
Mas o ritmo de lançamentos ainda não é alto?
Os lançamentos têm de acontecer. Existe muito terreno comprado, e não se pode ficar guardando isso. Obviamente o número caiu. A Brasil Brokers chegou a lançar R$ 38 bilhões em 2011. No ano passado foram R$ 25 bilhões.
O excesso de estoque é um problema?
Em alguns mercados, sim. Em Salvador, por exemplo, construiu-se muito, mas como lá não há grande liquidez de vendas as construtoras ficaram com até três anos de estoque.
O nível de lançamentos anual é suficiente para conseguir baixar o déficit habitacional?
Não estamos conseguindo suprir 100% da demanda criada a cada ano. Ainda há muita gente saindo de casa ou se casando. Nós projetamos que no futuro o brasileiro vai se mudar mais vezes. O Brasil tem uma dinâmica diferente da de países muito similares. Atualmente, o brasileiro muda 1,8 vez na vida. Nos outros países emergentes, chega a quatro vezes. Já nos EUA, são dez vezes.
Por que temos um índice tão baixo?
Devido à dificuldade de acesso ao crédito, criou-se uma barreira cultural, que vai ser mudada nos próximos anos. É a pouca utilização dos mecanismos de financiamento. Cinquenta por cento das pessoas ainda pagam à vista.
Quanto o crédito pode aumentar?
A relação do crédito imobiliário com o PIB duplicou nos últimos cinco anos. Saiu de 3,5% e foi para mais de 7%. Mas no Chile e no México, chega a 20%.
Isso é uma prova de que não existe uma bolha imobiliária?
Essa discussão voltou depois que o americano Robert Shiller foi um dos vencedores do Prêmio Nobel de Economia, mas não dá para comparar a nossa situação com a dos EUA. Lá, 100% do mercado comprava com financiamento. Havia casas com mais de uma hipoteca. Também nunca houve uma bolha no mundo em países em que o consumo de cimento estivesse abaixo de 400 quilogramas por pessoa. No Brasil, chegou a 360 kg. Na Espanha, subiu até 1,2 mil kg.