10/08/2025 - 18:10
Professor, economista e escritor, Eduardo Giannetti acaba de lançar o livro Imortalidades (Ed. Cia das Letras), onde, em suas próprias palavras, discute o “anseio humano pela perenidade”. Esse também é o tema de sua palestra no Rio Innovation Week (RIW), que acontece de 12 a 15 de agosto, no Pier Mauá, no Rio de Janeiro – o Estadão é parceiro de mídia do RIW. Ele vai falar sobre os dilemas éticos e existenciais envolvidos na busca da longevidade extrema.
Em entrevista ao Estadão, Giannetti, que também é membro da Academia Brasileira de Letras (ABL), falou longamente sobre imortalidade, ciência da vida longa e o sentido da existência. Abaixo, alguns destaques da entrevista:
O ser humano e o anseio pela perenidade
“A condição humana tem duas características que a diferenciam do restante dos seres vivos. Temos a autoconsciência, estamos cientes da nossa existência, e, ao mesmo tempo, temos a consciência antecipada da morte. Como todos os seres vivos, do mais simples ao mais complexo, somos movidos pelo instinto de sobrevivência. Queremos continuar vivos, cada célula do nosso corpo quer continuar viva. No caso do ser humano, por conta das características que mencionei, o instinto de sobrevivência ganha nova e radical dimensão, que é o anseio de perenidade, o anseio de viver eternamente, de não desaparecer, de não deixar a consciência simplesmente se esvair e o corpo morrer.”
A imortalidade biomédica
“Um biólogo molecular e médico japonês, Shinya Yamanaka, fez uma descoberta espantosa, pela qual ele acabou levando um prêmio Nobel em 2012. Ele sintetizou quatro proteínas produzidas por células-tronco (que ficaram conhecidas como fatores de Yamanaka), misturou essas proteínas com células adultas, retiradas do órgão de um mamífero, e verificou que, ao serem misturadas, as células adultas regrediam à condição de célula-tronco pluripotente (que tem capacidade de se transformar em qualquer outra célula do corpo). Ou seja, o relógio biológico regride. Você pega uma célula adulta e faz com que ela volte a ser embrionária. Isso já é exequível. Há problemas com órgãos mais complexos, muitos teratomas surgem, de fato. É um processo não muito domesticável. Mas estão tentando novas combinações mais adequadas para a reconstituição de órgãos mais complexos sem o risco do desenvolvimento de tumores. Isso delineia o caminho da imortalidade no sentido biomédico. Não é que a pessoa vá ser imortal, ela será imortal no sentido biomédico. Ou seja, desde que ela não seja atingida por uma morte violenta, externa, ela teria condições de renovar sua existência corporal e cerebral indefinidamente. Não é mais uma questão de se, mas de quando: a opção da imortalidade biomédica já está no horizonte.”
A imortalidade digital
“O outro caminho é o de imortalidigitalização que, no fundo, é uma versão da imortalidade da alma em registro cibertnético, digital. A pessoa faria um “mind uploading”, transformaria em código toda a rede neural de um cérebro adulto, e a transferiria para um suporte digital. Ou seja, haveria uma réplica do mundo mental de uma pessoa em sua integralidade acoplada a uma máquina ou mesmo a um clone. Mas vejo um limite intransponível na imortalidigitalização que é a interioridade do ser humano. Uma máquina pode mimetizar exatamente a personalidade de alguém que já existiu, responder do mesmo jeito, com a mesma voz e entonação, com as mesmas características sutis de uma personalidade humana individual, a ponto de enganar o interlocutor que acha que está interagindo com alguém que já se foi. Mas o que isso não contempla é que a experiência humana não é só exterioridade, existe uma dimensão que é a sensação de ser quem se é, uma experiência interna, subjetiva, intransferível. O meio digital é completamente incapaz de recriar.”
O preço da vida eterna
“A questão interessante e filosófica na qual me aprofundo, é justamente essa: vale a pena viver para sempre? Será que nos damos conta das imensas implicações e ramificações de vivermos não mais 100 anos, mas dez mil anos, 300 mil anos, o tempo que for? Há um debate rico entre os chamados mortabilistas e os imortabilistas. Os mortabilistas defendem o ciclo de vida natural argumentando que o que suscita valor à vida é justamente a sua finitude; a beleza da vida, todo o seu encantamento, é ligado à nossa condição finita. Já os imortabilistas querem abolir a morte. Para eles, enquanto me for dado mais um dia, aceitarei viver, desde que em condições razoáveis de saúde física e mental. Estamos apenas começando a entender as imensas consequências disso.”
A morte vista como doença a ser combatida
“Houve uma discussão interessante, recente, entre médicos nos EUA, sobre se deveriam classificar a morte como uma doença no novo compêndio das patologias. Ela chegou a ser incluída, mas houve uma discussão muito grande e ela foi retirada da categoria das patologias. Eu particularmente acho que a morte é parte do ciclo natural da vida, tão natural quanto nascer, crescer e envelhecer. A morte surge no mundo natural com a reprodução sexuada. No momento em que dois seres precisam se unir para gerar um terceiro, os corpos deles perdem a razão de ser do ponto de vista biológico depois da reprodução, são cápsulas descartáveis. Já os seres unicelulares não têm a morte inscrita em seu genoma, como nós. Eles se dividem em dois, em quatro e vão infinitamente assim, se o ambiente não criar restrições. A morte é algo que vem de fora para dentro. No nosso caso, seres de reprodução sexuada, a morte é também de dentro para fora, ela está inscrita em nosso DNA, bem como a senescência. Não só somos sujeitos aos caprichos do acaso, aos acidentes, mas também carregamos a programação para a senescência e o colapso. E isso nasce justamente no momento em que a reprodução sexuada se afirma como método natural de procriação. Em resumo, com o sexo nasce a morte.”
Informações sobre o Rio Innovation Week 2025
Data: 12 a 15 de agosto de 2025;
Horário: 10:00 às 21:00;
Local: Pier Mauá, Av. Rodrigues Alves, 10 – Praça Mauá, Rio de Janeiro;
Ingressos: neste link