13/04/2011 - 21:00
Aos 71 anos, o italiano Angelo Gaja, é considerado um rei em seus domínios, a prestigiada vinícola Gaja, plantada em Barbaresco, vilarejo de 600 habitantes próximo a Alba, no Piemonte. Gaja começou cedo no negócio familiar, à época com mais de um século de tradição, como uma espécie de príncipe regente, aos 21 anos. Nessas cinco décadas, ele se tornou o soberano dos vinhos Barbaresco, produzidos com a uva nativa nebbiolo, reforçando a fama nobre do produto, que em 2010 rendeu à sua família uma receita de 18 milhões de euros.
Este ano, Gaja começa a preparar sua retirada do dia a dia. Ou pelo menos da parte mais cansativa. A filha mais velha, a bela Gaia, 31 anos, responsável pela área de relações internacionais, deverá substituí-lo a partir deste ano. Isso não significa que Gaja pretende se aposentar para valer. “Vou continuar dando expediente diário na vinícola. Só não pegarei mais o avião para sair por aí propagando o nosso vinho”, disse ele em sua última viagem ao Brasil, com seu timbre peculiar, que vai se avolumando conforme se empolga ao falar de seu “lavoro”.
Meu vinho, minha vida: o orgulho de produzir um dos melhores vinhos do mundo e de ter passado
às filhas a arte da família faz desse italiano um homem rico em histórias
Além da primogênita, Gaja também conta com a colaboração da filha do meio, Rossana, 28 anos, que o ajuda no escritório. A mulher, Lucia, também está no negócio, a cargo da importadora dos Gaja, que garimpa boas marcas pelo mundo para oferecer aos italianos – sim, eles são orgulhosos de seu produto, mas sabem também que gosto não se discute e que uma oportunidade de negócio não deve ser desperdiçada.
“Somente Giovanni, meu filho mais novo, de 18 anos, ainda não se decidiu se vai se envolver com a vinícola. Prefiro não pressioná-lo”, diz o italiano brincalhão, de impressionantes olhos azuis, que raramente foge à oportunidade de contar uma história.
A grande joia: O produtor considera o Barbaresco safra 1982 o melhor vinho que produziu na vida
Como a da influência das mulheres da família, chamadas por ele de os pilares dos Gaja. “Minha avó, Clotilde, foi uma mulher forte, que impulsionou meu avô na direção da qualidade e da perfeição”, afirma. O produtor recorda-se de um ensinamento desse avô: “Quando você tem a seu lado uma boa mulher, que seja forte, só há duas coisas a fazer. Ou você segue seus conselhos ou a mata!”
Como marido, Gaja resolveu seguir o caminho menos doloroso, apoiando-se nas ponderações de Lucia, sua mulher, na superação dos desafios. “ O maior deles foi o investimento em terras na Toscana”, diz. A família adquiriu, na década de 1990, a vinícola Pieve Santa Restituta, produtora do famoso vinho Brunello de Montal–cino, e a Ca’Marcanda, na região de Bolgheri, na qual produz vinhos de cabernet sauvignon e merlot.
“Desejávamos abocanhar um mercado maior, mas não queríamos aumentar nossa produção no Piemonte”, diz ele. Há 22 anos, a Gaja se limita a colocar no mercado 350 mil garrafas por ano. “Para não arriscar um comprometimento da nossa qualidade, optamos por adquirir novas vinícolas.” A grande preocupação era reproduzir a qualidade dos Gaja numa região diferente. “Conseguimos”, diz.
A primogênita, Gaia, 31 anos, foi preparada para assumir os negócios da família,
um posto que seu pai herdou aos 21 anos. Será ela a nova rainha do Barbaresco?
Gaja afirma que uma de suas grandes alegrias se traduz no melhor vinho que produziu em cinco décadas: o Barbaresco safra 1982. A uva não estava ainda tão madura, como acontece hoje, no outono – um efeito do aquecimento global, segundo ele. “Mas, mesmo assim, o vinho daquele ano saiu perfeito”, afirma. “Embora jovem, poderia ser degustado como um Barbaresco formado.” A má notícia para os aficionados da vinícola é que a joia de Gaja não está mais à venda. Portanto, quem tem, armazena com carinho.
“Nós mesmos guardamos poucas garrafas”, diz. “Elas só são abertas em ocasiões especialíssimas ou para receber convidados ilustres, em visita a nossa vinícola.” Ciro Lilla, o importador brasileiro dos vinhos de Angelo Gaja, diz que se esse vinho estivesse disponível em sua empresa não seria vendido por menos de US$ 1 mil a garrafa. A safra de 2005, atualmente à venda no Brasil, não sai por menos de US$ 430 a garrafa.
Ele afirma que sua maior alegria, que perdura até hoje, é fazer parte de uma família que mantém uma unidade, que se esmera, a cada ano, em fazer um dos melhores vinhos do mundo. “E de ter aprendido os segredos do negócio não na faculdade de economia, que cursei, mas com o meu pai. Meu grande mestre.”