06/08/2018 - 19:05
O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), admitiu que alguns dos recentes arquivamentos de inquéritos feitos sem pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR) podem ser revistos na Corte no julgamento de recursos. Mas defendeu o poder de a Suprema Corte arquivar investigações mesmo sem que haja posicionamento favorável da Procuradoria e mesmo em casos que, em tese, não deveriam mais ser analisados no tribunal devido à recente restrição da regra do foro privilegiado.
A Segunda Turma do STF discutirá nesta terça-feira, 7, se é possível arquivar casos que, pela limitação do foro, segundo a PGR, deveriam seguir para a primeira instância. Esse debate será travado no pedido da defesa do ministro de Relações Exteriores, Aloysio Nunes, que quer o fim do inquérito aberto com base na delação da Odebrecht, e não o envio à Justiça Federal, que foi sido solicitado pela Procuradoria. A PGR poderá sustentar da tribuna os argumentos que tem colocado em recursos nos quais aponta ser incabível arquivar casos sem pedido do Ministério Público.
“Eventualmente, pode acontecer uma ou outra revisão. Ou, se a Procuradoria, de fato, tiver fatos novos, poderá fazer novas investigações, abrir novas investigações”, disse Gilmar Mendes, nesta segunda-feira, 6, em Brasília, em resposta ao Estadão/Broadcast, após um seminário sobre as Constituições norte-americana e brasileira sob a perspectiva de auxiliares das supremas cortes de ambos os países.
“Mas a questão básica é essa. Temos, de fato, investigações que se alongam e que às vezes até se transformam em denúncias, e que depois dão no que nós temos verificado que dão. Caso, por exemplo, recente de Gleisi Hoffmann (senadora do PT do Paraná e presidente nacional do partido) e Paulo Bernardo (ex-ministro), e tantos outros: a denúncia foi recebida e depois o tribunal acabou absolvendo por inconsistência da investigação e das provas trazidas”, afirmou.
Quatro ministros – Dias Toffoli, Luís Roberto Barroso, Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes – já deram uma soma de sete decisões de arquivamentos desde junho sem que a PGR tivesse se posicionado neste sentido. A Procuradoria já recorreu em cinco casos, envolvendo autoridades como os senadores Aécio Neves (PSDB-MG), Jorge Viana (PT-AC), Ricardo Ferraço (PSDB-ES), Omar Aziz (PSD-AM) e Eduardo Braga (MDB-AM) e os deputados Daniel Vilela (MDB-GO) e Bruno Araújo (PSDB-PE).
No último agravo (tipo do recurso) apresentado pela PGR, na sexta-feira, 3, a procuradora-geral Raquel Dodge afirmou que seria uma “irresponsabilidade” trancar a investigação contra o senador Aécio Neves sobre suposta participação em esquema criminoso na estatal Furnas mesmo com a recente inclusão de um material obtido em cooperação internacional com o Principado de Liechtenstein, que representaria uma nova frente de investigação apontando “indícios de materialidade e de autoria delitivas”.
Dodge tem insistido que não pode haver arquivamento sem o MPF pedir e muito menos quando já não há prerrogativa de foro na Suprema Corte, fruto de uma decisão do próprio tribunal que restringiu a competência para analisar crimes cometidos por autoridades no cargo e em razão do cargo.
“Nós estamos decidindo essas matérias. O regimento interno do Supremo permite que o relator excepcionalmente já encerre os inquéritos cuja perspectiva de desdobramento e êxito se revele exígua. Nós temos casos que tramitam por muito tempo, ás vezes a própria polícia pede o encerramento e o MP persiste em uma ou outra investigação. Há casos em que o MPF simplesmente pediu que a investigação prosseguisse na primeira instância”, disse Gilmar Mendes.
“Os ministros já têm aproveitado para se posicionar de que até aqui não há provas suficientes para nada no inquérito. Me parece que é uma medida profilática e positiva neste contexto para o qual eu estou chamando atenção, de (o Supremo ser) um poder moderador, um poder de contenção de eventuais abusos neste contexto. A simples mantença de um inquérito sem perspectiva de oferecimento de denúncia, afinal, é um peso que não se justifica”, afirmou o ministro.
Na palestra que realizou em Brasília nesta tarde, Gilmar Mendes disse que o Supremo “tem cumprido papel importante que é moderação de ímpetos autoritários”. “Se o tribunal tivesse se acovardado, PF e MPF já eram Poderes no Brasil. “A ideia do combate à corrupção é importante mas dentro dos casos legais”, disse.
Além do inquérito de Aloysio Nunes, o ministro Gilmar Mendes liberou nesta segunda-feira, 6, para julgamento da Segunda Turma um outro pedido de arquivamento feito por outra defesa, no caso, do deputado federal Rodrigo Garcia (DEM-SP), em investigação também aberta com base na delação da Odebrecht.
Além de Gilmar, a turma é formada por Ricardo Lewandowski, Edson Fachin, Celso de Mello e Dias Toffoli, este último apenas até meados de setembro, quando assumirá a Presidência.