24/10/2018 - 22:04
Somente em abril de 2018, o site YouMail calculou que 3,4 bilhões de chamadas de robôs foram realizadas nos Estados Unidos. Recentemente, a Comissão Federal de Comunicações (FCC, na sigla em inglês), órgão responsável pela regulamentação das telecomunicações nos EUA, multou em U$ 120 milhões Adrian Abramovich, um homem que realizou 96 milhões de chamadas de robôs oferecendo pacotes de viagem falsos durante um período de três meses.
No Brasil, apesar não haver dados oficiais sobre o assunto, é difícil encontrar uma pessoa que não sofra, pelo menos uma vez por semana, com chamadas desconhecidas, que quando atendidas tem dois destinos: 1. Fica muda e depois cai 2. Descobre-se que do outro lado da linha há uma mensagem gerada por computador, muitas vezes se passando por alguma empresa de telefonia ou banco.
Dos males da modernidade, as chamadas de robôs com certeza estão entre as mais insuportáveis justamente por atacar o modo de comunicação que até agora vinha se mostrando o mais seguro contra falhas: a ligação telefônica. Para entender como lidar com esse problema, trouxemos um pequeno FAQ (do inglês “Frequently Asked Questions”) que explica os detalhes das robocalls, além de algumas dicas para tentar fugir desses robôs que só servem para torrar a paciência.
O que são as tais chamadas de robôs?
Em estudo de 2016 intitulado “Everyone Hates Robocalls: A Survey of Techniques against Telephone Spam”, realizado pela Arizona State University, definiu o fenômeno como o spam da telefonia. Assim como os famosos e-mails indesejados, este tipo de ligação tem como objetivo aplicar golpes ou mesmo circular para o maior número de pessoas pelo menor tempo possível mensagens e promoções. Elas são realizadas através de mensagens pré-gravadas ou mesmo programas de sintetizador de voz.
Qual a diferença entre chamadas convencionais?
Ainda segundo o estudo, o uso de redes VoIP (Voice over IP) propiciou a propagação deste tipo de ação. Antes as redes usadas para realizar telefonemas eram as PSTN (Rede Pública de Telefonia), clássicas que usavam fios de cobre para realizar os contatos, porém, com a internet, redes via IP começaram a ser utilizadas para ligações.
“Se antes o desenho do modelo de ligação era analógico – digital – analógico, hoje todo o processo é digital, um ambiente mais propenso a fraudes e hackers”, explica Wolmer Godoi, diretor de cibersegurança e serviços profissionais da Cipher, empresa de segurança digital. Ele também ressaltou o fato de que ao tirar as ligações do domínio das grandes operadoras, fez com que servidores menos seguros fossem utilizados na hora das chamadas, aumentando a falta de segurança.
Quem utiliza?
Este é um dos pontos mais problemáticos das chamadas de robôs. Se no spam de e-mail, quem disparava eram golpistas em busca de dinheiro fácil. Nas robocalls esse grupo se junta a grandes empresas em busca de um método barato de divulgar promoções e novos serviços.
“Esse serviço de robocalls tem sido bastante disseminado pelo telemarketing hoje em dia. As empresas contratam empresas terceirizadas especializadas nesse tipo de automação, pela qual milhares de chamadas são realizadas ao mesmo tempo para pessoas diferentes”, explica a pesquisadora em direitos digitais do Idec, Barbara Simão. Segundo ela, quando uma dessas pessoas atende, a ligação se inicia de fato e é direcionada ao atendente de telemarketing, para que ele então realize a oferta. “É por isso que muitas vezes atendemos o telefone e a ligação cai, ou ficamos sem resposta. Provavelmente, era uma ligação de telemarketing já atendida por outra pessoa”, afirma.
“As empresas fazem isso para gerar economia de tempo, já que anteriormente as ligações eram feitas pelo próprio atendente e a espera entre uma chamada e outra acabava sendo maior. Acontece que isso gera um grande incômodo ao consumidor, especialmente quando são efetuadas várias chamadas em um mesmo dia e, muitas vezes, ofertando produto ou serviço já anteriormente oferecido e negado.”
O que a legislação diz sobre isso?
Em nota, a Anatel declarou ciência e preocupação em relação a questão, e afirmou estar trabalhando para encontrar uma solução contra ligações indesejadas. Comentou sobre o artigo número 3 do Regulamento Geral de Direitos dos Consumidores de Serviços de Telecomunicações (RGC) que defende o direito do usuário não receber mensagens de cunho publicitário em seus dispositivos móveis, que infelizmente é limitado a mensagens gravadas e SMS.
Por que é tão difícil fugir das ligações indesejadas?
Segundo o estudo da Arizona State, o principal ponto é a sofisticação das robocalls, que utilizam técnicas de obtenção e cruzamento de dados. Os golpistas utilizam programas que tornam mais crível o golpe, mudando o número exibido na tela – para que a vítima visualize uma linha da área de onde está falando – e até sintetizadores de voz para que ela pareça com a fala de alguém próximo. Dependendo da database utilizada para realizar as robocalls, é possível cruzar dados a fim de encontrar relação entre as vítimas e assim direcionar o golpe, usando até “vozes personalizadas” feitas por sintetizadores digitais na hora de tentar aplicar o golpe.
“Um dos principais pontos para realizar esse tipo de fraude é ter uma grande quantidade de números. Os hackers então focam em pequenas datas base, como de lojas de roupa ou restaurantes, que são menos protegidos e oferecem dados de nicho, mais direcionados. Vão juntando isto, cruzando informações e criam uma grande database”, explica Calos Nazareth, vice diretor do Instituto Nacional de Telecomunicações (Inatel).
Ainda de acordo com o estudo, o imediatismo do telefone dificulta o controle de uma chamada spam. Enquanto no e-mail é possível direcionar e analisar uma mensagem antes de chegar a caixa de entrada, em uma ligação só se descobre seu conteúdo ao atendê-la.
Como se prevenir?
Como ainda não existe uma legislação específica para o problema, o jeito é buscar alternativas, como o site Quem Perturba, um fórum da internet dedicado a reunir reclamações sobre linhas usadas para golpes em geral. Lá é possível descobrir que um mesmo número se passa por diversas empresas, tentando aplicar golpes ou mesmo divulgando promoções. Infelizmente, os dados não se aprofundam na questão para tentar descobrir quais linhas são usadas por golpistas e quais são usadas por empresas terceirizadas contratadas por grandes marcas.
Outra opção é a lei de Bloqueio do Recebimento de Ligações de Telemarketing, de outubro de 2008, encabeçada pelo Procon SP. Uma vez inscrito, o consumidor recebe uma senha por e-mail. Com essa senha é possível excluir e incluir números de telefones e registrar reclamações contra as empresas que não respeitarem o bloqueio. O número de telefone cadastrado fica bloqueado por prazo indeterminado e é possível cancelar o bloqueio a qualquer momento.
Infelizmente a opção diz respeito apenas a empresas, tirando da equação possíveis golpistas. Há ainda a opção de bloquear número por número que liga em seu celular, mas aí, haja paciência.