31/10/2018 - 17:11
Ao decretar a prisão de 7 investigados na Operação Tritão, deflagrada nesta quarta-feira, 31, pela Polícia Federal, o juiz Roberto Lemos dos Santos Filho, da 5.ª Vara Federal, apontou para a ação “estruturada e ordenada” de organização criminosa que teria montado esquema de fraudes em licitações do porto de Santos. “Os elementos de convicção coligidos, embasados em trabalhos realizados pela Controladoria-Geral da União e pelo Tribunal de Contas da União, indicam a ocorrência de conjunção de ideais, de esforços e de vontades entre os investigados para o cometimento de ilícitos, com o fim de obtenção de lucros fáceis e indevidos, em detrimento da Companhia Docas e da União.”
Por ordem de Roberto Lemos dos Santos Filho, a PF prendeu inclusive o diretor-presidente da Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), José Alex Botelho de Oliva. A cúpula das Docas está sob suspeita de envolvimento em fraudes a licitações que podem ter provocado prejuízos de R$ 37 milhões aos cofres públicos.
“Ao menos em tese, o conjunto de provas até aqui produzidas sinaliza a união de esforços e de desígnios entre os investigados, indicativas de autoria e/ou participação dos sindicatos em condutas ilícitas, causadoras de prejuízos de grande magnitude à Companhia Docas do Estado de São Paulo e à União”, destacou o magistrado.
Roberto Lemos alertou para o risco de os alvos da Operação Tritão destruírem provas. “A providência (prisão dos sete) se apresenta imprescindível em razão da real possibilidade de os representados adotarem condutas prejudiciais ao aprofundamento das investigações, tanto no que toca à sua produção, quanto no que tange ao seu resultado.”
Na avaliação do juiz, os investigados da Operação Tritão “em liberdade poderão causar embaraços e prejudicar o desenvolvimento das apurações em curso, bem como comprometer o resultado visado”.
O magistrado aponta que a investigação revela “casos intrincados”. “Tudo estando a revelar, ao menos em tese, que foram e/ou estão sendo perpetrados por pessoas possuidoras de elevados poder político e/ou econômico.”
Roberto Lemos ordenou a prisão temporária de Oliva e dos outros alvos da Operação Tritão. Ele transcreveu trechos de uma decisão em habeas corpus da ministra do Superior Tribunal de Justiça Laurita Vaz sobre outra demanda em que foi decretada a prisão de investigados. “É imperioso que os operadores do Direito na atualidade passem a interpretar os requisitos da prisão temporária, bem como a sua necessidade, não mais com base naquela mentalidade individualista daquele contexto histórico em que foi elaborada uma legislação com base unicamente em delitos capazes de atingir bens jurídicos individuais e determinados.”
Em outro trecho da decisão de Laurita, que Roberto Lemos incluiu em seu despacho, ela acentua. “No atual contexto da criminalidade de ‘colarinho branco’ em que se procura pelas atuais legislações cada vez mais proteger bens jurídicos de natureza transindividual, visando delitos que atingem a destinatários não determinados, mas efetivamente bens coletivos pertencentes à todos os cidadãos e inclusive às futuras gerações, corno o caso dos delitos financeiros e contra a Administração Pública cujos reflexos mais amplos atinqem a toda coletividade, passa a ser necessário que se reinterprete os requisitos da prisão temporária com base no risco de se atrapalhar o curso das investigações criminais, dada a existência de indicativos de que o paciente possui notório domínio dos fatos perpetrado pela organização criminosa, com efetivo poder de gerenciamento das atividades ilícitas perpetradas e, atuando de forma bastante organizada, com o aferimento de ganhos extraordinários, os quais espelhados pelos elementos constantes nos autos de investigação, demonstram o risco ao conjunto probatório e à ordem econômica caso, em liberdade, possa ostentar a estímulos para a deturpação das investigações.”
“O respeito ao Estado de Direito demanda medida severa, e, havendo fundada razão diante das circunstâncias concretas, mostra-se inevitável a adoção de medidas amargas que cessem a cadeia delitiva e sirvam de referência aos que tratam com desprezo às instituições públicas, sempre acreditando na impunidade”, assinalou a ministra.
O magistrado decidiu, então. “A princípio, tenho que as providências até aqui adotadas pela autoridade policial fazem emergir os contornos da aparência do bom direito dessa parte da representação em exame, dada a existência de indicativos da conjunção de esforços e de vontade entre os investigados, de forma estruturada e ordenada, para a prática de fraudes em detrimento da Companhia Docas do Estado de São Paulo, da União e de eventuais outras entidades públicas.”
Na avaliação de Roberto Lemos, a medida cautelar é “invasiva”, mas “se mostra necessária, verdadeiramente imprescindível, para a apreensão de coisas obtidas por meios criminosos, apreensão de instrumentos utilizados para a prática de crimes ou destinados a fim delituoso, descoberta de objetos necessários à prova de infrações, e colheita de outros elementos de convicção a amparar a formação da convicção do Ministério Público Federal para a instauração de ações penais”.
O juiz aborda passagem dos autos da Operação Tritão que cita uma modelo e ex-dançarina do cantor Latino. Em 2016, o diretor-presidente da Companhia Docas nomeou sua assessora a “Latinete” Daniele Elise Rodrigues, que reside em Laguna (SC). Ela ficou no cargo apenas uma semana e recebeu R$ 154 mil. A PF suspeita que a dançarina tenha sido usada como “laranja” para repasse de propinas a políticos.
“Saliento a existência de sinais de irregularidades em aditamentos de contratos para prestação de serviços de dragagem, e na de serviços relacionados à área ambiental, o que merece apuração acurada. Ao que parece, o descaso com a coisa pública chegou ao ponto de, inclusive, ocorrer contratação de modelo e dançarina residente em Santa Catarina para atuar como assessora da presidência da Codesp”, apontou o magistrado.
Nota da Codesp
Em nota oficial, o Conselho de Administração da Codesp Dise que “em reunião ordinária previamente programada para hoje (31), constatou pela manhã a realização, pela Policia Federal, da Operação Tritão, que envolveu a prisão temporária do Diretor Presidente e do diretor de Relações com Mercado e Comunidade, além do superintendente Jurídico da Codesp”.
“Consciente de sua responsabilidade e comprometido com a governança e operação do maior Porto da América Latina, o Conselho de Administração decidiu substituir o Diretor Presidente e o diretor de Relações com o Mercado e Comunidade, por, respectivamente, Luiz Fernando Garcia, e José Alfredo de Albuquerque e Silva”, diz a nota.
“Por fim”, prossegue a nota, “o Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Civil indicou o novo presidente do Conselho de Administração, Ogarito Borgias Unhares, em razão do atual presidente do colegiado ter sido indicado para a diretoria executiva da empresa.”