01/11/2018 - 9:12
Sem-teto confinados em uma antiga sala de cinema, revestida de material inflamável e com fiação à mostra. Barracos espalhados em vielas ou locais fechados, sem rota de fuga. Prédios que não têm sequer um extintor. Seis meses após a tragédia no Edifício Wilson Paes de Almeida, no Largo do Paiçandu, no centro, outras ocupações de São Paulo ainda enfrentam riscos de incêndio e convivem com moradores vulneráveis.
Entre maio e junho, a Prefeitura fez vistoria em 51 invasões e interditou três. A gestão Bruno Covas (PSDB) ainda discute a situação de 27 – duas devem ser desocupadas neste mês e uma terceira também pode ser interditada, segundo a Prefeitura. As demais vão passar por reintegração de posse ou estão destinadas à construção de moradia popular.
Relatórios da Defesa Civil obtidos pelo jornal O Estado de S. Paulo mostram que o problema mais comum é com instalação elétrica. Também há locais com infiltrações e fissuras em paredes, lajes e marquises. “Processos avançados de degradação podem redundar em riscos estruturais”, aponta em sete casos.
Um dos mais graves está na Avenida Rio Branco, bem na frente dos escombros do Wilton Paes de Almeida, que desabou em maio, deixando sete mortos. Cerca de 70 famílias ficam em uma sala de projeção desativada, sem ventilação ou luz natural. Segundo relatório, há fios expostos em ambiente fechado, o que aumenta riscos de incêndio com concentração de chamas e fumaça, dificultando a fuga dos moradores.
Encampada pela Frente de Luta por Moradia (FLM), a invasão existe há sete anos. “Todos ficamos com medo depois que o prédio da frente caiu, mas ninguém mora aqui porque quer”, disse um sem-teto. O movimento não autorizou a reportagem a entrar. Em nota, a Prefeitura afirma ter visitado o local nesta quarta-feira, 31, e “houve mitigação dos riscos por parte dos ocupantes”.
Em agosto, a Prefeitura estabeleceu o Grupo de Trabalho Permanente, responsável pela negociação com os sem-teto. Segundo Márcia Telizzi, do grupo, a prioridade é resolver casos mais graves ou em que resta impasse judicial. “Estamos atuando, mesmo que parcialmente, com os que estão em pior situação, enquanto fazemos novas vistorias.”
Incerteza
Em um galpão na Vila Ema, na zona leste, a ausência de luz toma conta dos três andares e o ar é pesado de respirar, tamanha a umidade. No alto há gambiarras e vários mosquitos voando em círculos sobre a cabeça de 140 famílias, incluindo crianças e um jovem com síndrome de Down. A ocupação não conta com liderança de movimento social.
A Justiça já notificou sobre a reintegração de posse, marcada para o dia 15. Todos concordaram em sair. “Não consigo mais dormir à noite”, diz a desempregada Helena Silva, de 29 anos, que vive com três filhos – o mais novo de 7 anos. “Vamos ter de morar embaixo da ponte.”
Na Vila Ema, os banheiros são individuais. No barraco de Helena, feito de madeira, não há sanitário e é preciso usar uma caixa de areia. “Não queria sair, aqui meus filhos não passam fome.”
Os sem-teto até pensaram em investir em extintores, mas desistiram. “Muita gente não tem dinheiro. Qual o sentido de fazer vaquinha para depois ter de sair daqui?”, indaga Janaína Andrade, de 33 anos.
Já na Rua Alexandrino da Silveira Bueno, no Cambuci, no centro, moradores se juntaram para investir em segurança. Lá, os barracos ficam colados uns aos outros, sem saída de emergência. “Depois do Paiçandu, cada um deu R$ 10 e colocamos extintores”, diz o comerciante Guilherme Álvaro, de 42 anos. “A Prefeitura pediu, mas quem pagou foi a gente.” A gestão planeja interditar o local.
Auxílio
Há 291 famílias que passaram a receber auxílio-moradia de R$ 400 após o desabamento do Edifício Wilton Paes de Almeida, no Largo do Paiçandu, em maio. Dessas, 153 moravam no prédio e já estavam em um cadastro que a Prefeitura havia feito antes da tragédia. O restante é de famílias que acamparam na praça depois do desabamento e tinham vínculos com o imóvel. Todas também foram para a fila da moradia da capital. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.