02/06/2015 - 17:23
O campo de ação dos diplomatas americanos em Cuba, em particular suas interações com a sociedade civil, constitui o ponto mais sensível das negociações entre Washington e Havana para a retomada das relações bilaterais.
Antes da última reunião entre os dois países no fim de maio, um funcionário cubano de alto escalão havia anunciado que, entre as principais questões a serem acertadas, estão “o regime de movimento dos diplomatas” e “seu comportamento”. Ele fazia, assim, uma clara alusão às ações de “promoção da democracia” por parte dos diplomatas americanos – o que incomoda Havana.
“É bem conhecida a atividade, em que as missões diplomáticas dos EUA se envolveram no apoio a ativistas de direitos humanos e ativistas pela democracia” em inúmeros países, destaca Marc Hanson, da organização Washington Office for Latin America (WOLA).
Em Cuba, “esses ativistas tendem a trabalhar, ou atuar na oposição ao governo cubano e, obviamente, o governo cubano não é muito adepto desse tipo de apoio”, comenta o especialista.
Desde 1977, em virtude de um acordo entre os então presidentes Fidel Castro e Jimmy Carter, existem Seções de Interesses que servem como embaixadas nos dois países. As relações bilaterais se encontram rompidas desde 1961.
Apesar de submetida – como sua homóloga cubana – a restrições drásticas de deslocamento de seus diplomatas e abastecimento, a missão americana não deixa de oferecer aos cubanos acesso à Internet – algo estritamente controlado na Ilha – ou capacitação em sua própria representação, ou nas residências oficiais.
Em discurso recente, o presidente cubano, Raúl Castro, advertiu que a reabertura de uma embaixada americana não pode acontecer, se certos “comportamentos” não forem corrigidos.
“Disse (…) ao presidente (Barack Obama), concretamente, que o que mais me preocupa é que (os diplomatas americanos) continuem fazendo as coisas ilegais que fazem agora”, como a capacitação de “jornalistas independentes, seja na SINA (Seção de Interesses dos Estados Unidos em Havana), ou nas casas dos diplomatas” americanos em Cuba.
“Essas coisas não podem ser feitas. Sinceramente, o que colocamos é que todos têm de se ajustar aos acordos sobre o comportamento dos diplomatas em todo o mundo, aprovado na Convenção de Viena de 1961”, insistiu.
“Nenhuma das funções detalhadas na Convenção de Viena (…) diz que as embaixadas são centros pedagógicos”, disse à imprensa um diplomata cubano.
Segundo Hanson, Washington pode recuar nessas atividades, levando-se em conta seu novo “interesse pela abertura de relações normais” com a Ilha comunista, após mais de meio século de antagonismo e desconfiança.
Se há um ponto sobre o qual a Casa Branca não pretende ceder, porém, é o que diz respeito à mobilidade de seus diplomatas, que atualmente podem sair de Havana apenas com permissão das autoridades cubanas.
“Este é o papel dos diplomatas nos países em todo o mundo, não apenas em Cuba, que interagem não somente com funcionários do governo, mas também com as pessoas dos países onde se encontram”, alegou o porta-voz da Casa Branca, Josh Earnest, na semana passada.
“E isso inclui encontros com cidadãos fora da capital. E inclui também encontros com cidadãos que não estão totalmente a favor das decisões políticas tomadas por seus governos”, completou.
Recentemente, em testemunho no Senado americano, a subsecretária de Estado para o Hemisfério Ocidental, Roberta Jacobson, declarou que direitos humanos e democracia continuam sendo o principal entrave nas negociações.
A reabertura de embaixadas, o que Washington inicialmente esperava que fosse acontecer em abril, ainda não se concretizou, apesar de quatro encontros de alto nível desde dezembro passado.
A retirada de Cuba da lista negra americana de países que apoiam o terrorismo alimenta as esperanças de avançar nesse sentido, mas “a tarefa não é fácil”, afirmou Jacobson, depois da última reunião.
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