31/05/2000 - 7:00
João Carlos Paes Mendonça, 61 anos de idade e 52 anos de varejo, está se despedindo das gôndolas e caixas registradoras. Na terça-feira, 23, passou as primeiras horas da manhã redigindo um comunicado interno aos 21,5 mil funcionários da rede Bompreço, anunciando a decisão de vender sua parte na empresa aos sócios holandeses do Royal Ahold, gigante de US$ 30,4 bilhões que mantém uma parceria com a rede nordestina desde dezembro de 1996. Na carta, João Carlos justificou a venda como uma ?decisão serena, pensada e que objetiva atender aos interesses maiores da empresa?. Entenda por interesses a pressão da rede holandesa, ávida pela expansão no Brasil. Pelo acordo, estimado em R$ 600 milhões, os holandeses levam o Bompreço Supermercados do Nordeste, o Bompreço Bahia (antiga Supermar), o Bomclub (clube de fidelização) e o Hipercard (cartão de crédito com 1,4 milhão de clientes). No total, 102 lojas.
Apesar do clima de ?adeus?, o sexagenário empreendedor está longe de vestir o pijama. É bem verdade que repassou aos sócios o filé mignon da holding BompreçoPar. Mas ainda manteve importantes negócios nas áreas de comunicação, alimentos e imobiliária. João Carlos mantém sob sua guarda 1,3 mil funcionários distribuídos entre o Sistema Jornal do Commercio (sete emissoras de rádio, uma de tevê e um jornal); o Shopping Center Tacaruna; a Avícola da Gema e a Frutivale Fruticultura Irrigada. João Carlos ainda mantém atividades paralelas como a exportação de mangas (colhidas em sua fazenda em Juazeiro, na Bahia) para a Europa e EUA e o trabalho social que faz em sua terra natal, Serra do Machado (SE), através da Fundação Pedro Paes Mendonça. Na sede do Bompreço, no Recife, executivos próximos a João Carlos garantem que ele está entusiasmado com a possibilidade de atuar de forma mais direta nas demais atividades da BompreçoPar. Analistas de mercado sustentam outra tese, a de que o empresário já não tinha mais fôlego financeiro nem disposição para acompanhar o crescimento desejado pela Ahold. ?A última grande aquisição foi a rede Supermar, na Bahia. Depois disso o Bompreço ficou muito tímido em relação aos concorrentes?, diz o consultor Eugênio Foganholo, da Mixxer Desenvolvimento Empresarial. Tanto que, em1999, a rede nordestina perdeu o terceiro lugar do ranking para o português Sonae, mesmo aumentando seu faturamento de R$ 2,5 bilhões para R$ 2,7 bilhões.
Ciente disso, os holandeses armaram o bote. O próximo passo, de acordo com o vice-presidente do Royal Ahold, Hans Gober, é avançar em direção ao Sudeste. ?O Ahold pode vir a comprar uma cadeia de supermercados em São Paulo. A possibilidade e o dinheiro existem?, disse em entrevista a DINHEIRO. Acontece que qualquer movimentação no varejo brasileiro depende diretamente dos acordos que estão sendo feitos na Europa ? berço da maior parte dos grupos supermercadistas presentes no País. Depois da união entre Carrefour e Promodés, no ano passado, os holandeses se aproximaram do português Jerônimo Martins, que por aqui é dono da rede Sé. Essa seria uma boa chance para a Ahold fincar seus pés na região Sudeste. O problema é que o Jerônimo Martins e o Sonae também querem se juntar e aguardam um aval do governo português. Além disso, continuam os boatos de união entre o Ahold e o francês Casino, sócio do Pão de Açúcar. O Bompreço não poderá mais carregar a bandeira ?orgulho de ser nordestino?.