A Justiça proibiu a instalação de uma estátua gigante da Padroeira do Brasil em área municipal de Aparecida, interior de São Paulo. Também determinou a retirada de cinco monumentos construídos em homenagem aos 300 anos do encontro da imagem de Nossa Senhora Aparecida, em 2017, e vetou o uso de verba pública em qualquer evento relacionado à padroeira. A decisão, da juíza Luciene Bela Ferreira Allemand, considerou que o emprego de verba pública na promoção da fé católica fere o princípio do Estado laico. A prefeitura vai recorrer.

A sentença foi dada no último dia 14, em ação movida pela Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos (Atea). Em sua defesa, a prefeitura alegou que os recursos foram liberados para incentivar o turismo religioso, principal fonte de receita do município. A juíza reconheceu que os católicos têm o direito de defender suas crenças, mas isso não significa que esses religiosos exerçam, em Aparecida, o papel de “algoz do espaço democrático de todas as outras crenças”. Segundo ela, o artigo 19 da Constituição veda, em seu primeiro inciso, que instâncias de governo subvencionem cultos religiosos ou igrejas.

A magistrada ressaltou que, no Brasil, há separação entre Estado e Igreja, e que o interesse público não pode ser prejudicado, o que ocorre quando o Estado patrocina evento de conteúdo religioso. Ela determinou que a doação das áreas onde foram instalados os monumentos seja revogada. Também condenou o prefeito afastado de Aparecida, Ernaldo Marcondes (MDB), a ressarcir os valores empenhados em todas as homenagens. Segundo a juíza, Marcondes dispendeu vultosa quantia para a realização de obras dos 300 anos de Aparecida, desconsiderando “outras destinações de recursos de suma importância”, o que caracteriza mau uso do dinheiro público.

Estátua

A decisão judicial atinge a instalação da estátua de 37 metros de Nossa Senhora Aparecida, doada ao município pelo artista plástico Gilmar Pinna. Desde 2017, as partes da escultura, em aço inoxidável, estão amontoadas no local. Com o pedestal, a imagem da santa teria 50 metros e seria maior que a do Cristo Redentor, no Rio de Janeiro. A prefeitura pretendia fazer uma Parceria Público-Privada (PPP) para instalar a atração turística.

Outros cinco monumentos feitos pelo artista e já instalados em rotatórias retratam os milagres de Nossa Senhora Aparecida. As esculturas, em aço inoxidável, atraem turistas. A prefeitura informou que ainda não foi notificada e vai entrar com recurso junto ao Tribunal de Justiça de São Paulo, por entender que as esculturas representam a identidade da própria cidade, além de estarem voltadas para o turismo, base da economia do município.

O prefeito afastado Ernaldo Marcondes disse em nota que a existência histórica de Aparecida se deve “exclusivamente ao encontro da imagem de Nossa Senhora Aparecida, sem a qual a cidade não existiria”, nem receberia os 12 milhões de turistas que recebe anualmente. Ao instalar monumentos de caráter turístico em áreas municipais, a prefeitura buscou “criar novos roteiros e eixos turísticos que já estão beneficiando o comércio local e trazendo recursos para os espaços localizados fora da área tradicionalmente frequentada”.

Conforme Marcondes, os recursos investidos são oriundos do governo do Estado para aplicação exclusiva no turismo, dada a condição de estância turística da cidade. Os monumentos, segundo ele, beneficiam pessoas de diferentes crenças religiosas, “já que entre os comerciantes e hoteleiros, há pessoas de fé católica, evangélica, espírita, umbandista e até ateus, que ganham seu sustento do turismo religioso, que é vocação de Aparecida há séculos”. A cidade, que abriga o Santuário Nacional de Aparecida, é considerada o mais importante destino de romarias do País.