04/02/2020 - 12:38
Estar há 20 anos no mercado corporativo confere a qualquer executivo uma gigantesca bagagem de experiências, vivências, situações adversas e, felizmente, de sucesso também; além de inúmeras histórias para contar. Histórias inusitadas, de momentos difíceis e de conquistas. Comigo, em cerca de duas décadas de carreira dedicada a corporações globais, não seria diferente.
O caso que vou relatar a seguir é emblemático para ilustrar situações bastante comuns no ambiente corporativo, onde sabemos que os conflitos e desafios são diversos, mas os objetivos muito semelhantes: crescimento, aumento da produtividade, redução de custos.
No segmento em que atuo – a área de Tecnologia da Informação (TI) – venho observando transformações e reinvenções intensas, não só porque novas tecnologias surgem a todo momento, mas porque os líderes corporativos estão redefinindo seus papéis para o sucesso dos negócios e a maneira com que encaram a área de TI. Espera-se dos diretores de tecnologia mais proatividade e alinhamento às estratégias de negócio, e não só “gasto de dinheiro” para manter sistemas funcionando. Diretores financeiros e CEOs, por sua vez, envolvem-se cada vez mais com a área de TI na busca por inovação e pelo sucesso na jornada digital. Para esses líderes, é crucial adquirir familiaridade com a área de tecnologia, para que ela deixe de ser uma “caixa-preta” e seja parte integrante dos resultados de negócio, já que economias e sociedades em todo o mundo são cada vez mais digitais e hiperconectadas.
Contando o caso – Dia desses, em uma reunião entre minha equipe comercial e o diretor de Tecnologia de um potencial cliente, levamos à mesa esse debate sobre o comportamento de CIOs frente às novas demandas. Debatemos casos concretos em que a área de TI de inúmeras companhias gasta mais tempo e recursos com manutenção de sistemas do que com inovação, uma prática que vai totalmente na contramão dos novos tempos. E seguimos: sua empresa pode reduzir pela metade os custos com suporte e manutenção de sistemas de TI, podendo direcionar essa economia para fins muito mais estratégicos e de inovação. “Mas como acontece esse milagre?”, perguntou desconfiado o diretor de tecnologia.
A verdade é que não há milagre algum! O que existe é o melhor gerenciamento de recursos. O que muitos líderes ainda não sabem, mas felizmente estão descobrindo, é que muitos dos contratos de serviço com grandes fabricantes de TI, que antes eram considerados intocáveis, podem sim ser revistos para que opções mais vantajosas sejam consideradas. Sua empresa não pode pagar mensalmente por serviços caros sem ver resultados concretos, tal como pagamos impostos sem ver retorno. Parece absurdo, mas isso acontece e muito no ambiente corporativo: as companhias assinaram contratos no passado e continuam pagando preços altíssimos por serviços que já não fazem o menor sentido, sem procurar alternativas mais racionais, simplesmente por não questionar práticas historicamente vigentes.
A princípio, o diretor de Tecnologia do nosso caso teve uma reação de negação ao ouvir o que argumentávamos durante a reunião. Afinal, não queria aceitar que se via exatamente naquela situação que narrávamos. Não queria aceitar que estava simplesmente reproduzindo o status quo sem propor inovação à corporação, sem rever contratos e seguindo no piloto automático. Diante daquela conversa, certamente se cobraria para sair de sua zona de conforto, questionar e reinventar o modus operandi que vinha seguindo. Aparentemente, a ficha foi caindo aos poucos e ele foi compreendendo que, de fato, não poderia simplesmente não repensar toda a estrutura de sua área de TI.
Ao final da conversa, em tom mais descontraído e entre alguns risos, disse: “Pelo amor de Deus, não deixem o Junior* saber!” Nós nos olhamos sem entender e perguntamos: “Quem é Junior?”. Junior era o presidente da empresa de nosso personagem, que completou: “Imaginem se o Junior descobre o tanto de dinheiro que meu departamento de TI está gastando sem necessidade? Preciso rever isso já!”
Pegando carona na história do Junior, eu pergunto: e você no lugar de nosso personagem? Também teria receio de que o presidente de sua empresa descobrisse que sua área não está fazendo tudo o que poderia para chacoalhar o negócio? Pois então, proponho um desafio: revolucione já sua área de atuação na empresa, aprenda coisas novas e proponha mudanças, questione fornecedores, reveja contratos, gerencie melhor seus recursos e faça além do esperado para atingir os melhores resultados. Antes que o Junior saiba!
Como Fazer?
Apresentamos a seguir algumas dicas práticas que líderes executivos, de TI e de outras áreas, podem aplicar em suas empresas levando em conta esse cenário em que é preciso questionar e reinventar os negócios continuamente:
Empodere seu CPO (Chief Purchasing Officer ou Diretor da área de Compras) – ele é seu parceiro. Tenha um retrato fiel de todos os contratos de fornecimentos, para então descobrir o que vem drenando custos desnecessariamente, qual o nível de satisfação dos usuários e como os serviços contratados vêm contribuindo para gerar valor ao negócio. Entenda como funciona a renovação desses contratos, em que período e com que frequência eles acontecem. Pense em uma força-tarefa que inclua as diretorias de Negócios, Tecnologia, Finanças, Operações, etc. Com esse panorama, você poderá partir para a execução de melhorias com muito mais segurança.
Tenha coragem para quebrar os silos organizacionais. Se como líder você decidiu executar esse plano de melhorias operacionais e de eficiência, certamente muitas mudanças serão implementadas. Porém, sabemos que propor mudanças muitas vezes esbarra em resistência dos que querem se manter estacionados na zona de conforto. Conheço o caso de uma CFO que implementou um projeto de transformação digital em sua companhia, com a mudança de toda a equipe de TI, que se recusava a abrir mão de contratos vigentes com medo de apostar em novas ideias. A mudança de paradigma deu tão certo que gerou economias significativas e imediatas para a companhia e ainda permitiu à CFO investir em inovação a favor do crescimento da empresa.
Traga novos parceiros após falar com referências. Referências são fundamentais para encorajar os líderes a apostar em novas ideias. Quando quiser implementar mudanças, consulte outras empresas de perfil e porte semelhantes e investigue o que deu certo e o que deu errado naquelas que ousaram partir para outros caminhos que pareciam mais vantajosos. Conhecendo casos, dividindo receio e desafios, você terá mais elementos para embasar sua decisão. Afinal, quem ousou mudar para melhor é estúpido ou é você quem está para trás?
Saia de contratos de adesão – liberte sua empresa. O contrato de adesão é uma espécie de contrato celebrado entre duas partes, em que os direitos, deveres e condições são estabelecidos pelo proponente, sem que o aderente possa discutir ou modificar seu conteúdo ou que tem esse poder de forma bastante limitada. Contratos unilaterais deste tipo são comuns no mercado de tecnologia. Procure parceiros com contratos bilaterais. Sua área jurídica não é especialista em propriedade intelectual. Portanto, contrate advogados especialistas. Não economize nisso.
Interesse-se por tecnologia – esse assunto não “morde”. Se você não é um CIO, pode ser que não se interesse pelo mundo da tecnologia. Como líder, você está acostumado a tomar decisões baseadas em seu bom senso, mas é preciso ir além. Com conhecimento sobre áreas como a de TI, você vai se livrar da sensação de risco e ter mais segurança para a tão esperada transformação de seu negócio.
Boa sorte em seus novos rumos. Essa hora já chegou!
*O nome do personagem foi alterado visando preservar sua identidade.
Por Edenize Maron, general manager da Rimini Street na América Latina