07/02/2020 - 19:14
Em resposta à informação confidencial de que o Brasil considera o país europeu sua principal ameaça nos próximos 20 anos, a embaixada da França mencionou a “imaginação sem limites” dos autores da minuta do Ministério da Defesa.
No documento secreto, obtido pelo jornal Folha de S. Paulo, o Brasil cita a França como sendo a maior ameaça para o país nos próximos 20 anos, sob justificativa das tensões na Amazônia, onde os dois países possuem uma fronteira comum.
Paris, responsável pela fronteira da Guiana Francesa com o território brasileiro, no entanto, não levou a minuta a sério.
“Forças Armadas de todos os países realizam frequentemente esse tipo de exercício de análise de cenários. Entretanto, nós saudamos a imaginação sem limites dos autores desse relatório”, indicou a Embaixada Francesa em sua conta no Twitter.
A minuta confidencial, intitulada “Cenários de Defesa 2040”, foi elaborada a partir de entrevistas com 500 membros da elite militar brasileira em onze reuniões que ocorreram ao longo do segundo semestre de 2019.
Segundo a Folha, o documento, de 45 páginas, “traz considerações geopolíticas realistas e hipóteses algo delirantes”, como a de um atentado biológico em que “ultranacionalistas do Sudeste Asiático” espalham o coronavírus que provoca a Sars durante a edição do Rock in Rio em 2039.
A França é o único país citado como ameaça nos quatro cenários imaginados no documento.
Em um deles, espera-se que até 2035 a França formalize um “pedido de intervenção das Nações Unidas na Região Ianomâmi, anunciando o seu irrestrito apoio ao movimento de emancipação daquele povo indígena”, seguido de mobilização de “um grande efetivo suas forças armadas, posicionando-os na Guiana Francesa”.
“O fato é que o Brasil é o nosso principal parceiro estratégico na América Latina e que a França conserva, há décadas, relações de cooperação diárias, estreitas e amigáveis com as Forças Armadas brasileiras”, acrescenta a diplomacia francesa no Twitter.
Nelson Düring, à frente do site especializado em notícias militares, o Defesanet, disse à AFP que o documento “pega as coisas reais, outras muito loucas”. “Vejo muita incoerência” e o reflexo de uma “diplomacia por impulso”.
Segundo Düring, as considerações contidas na minuta estão “muito contaminadas pela discussão entre Macron e Bolsonaro”, acrescenta.
A tensão entre os dois países ganhou força em agosto passado, quando imagens dos incêndios na Amazônia causaram comoção internacional.
Na cúpula do G7, Macron fez um chamado de mobilização global pela Amazônia, que considera como sendo um “bem comum” do planeta. Na época, Bolsonaro acusou o presidente francês de ter uma “mentalidade colonialista” e de “questionar a soberania” do Brasil.
A divulgação da minuta confidencial “vai causar mais estrago nas relações Brasil-França”, alerta Düring.
A escalada de tensão pode ser consideravelmente prejudicial para o Brasil, dada a “importância da associação estratégica” bilateral. A França produz, por exemplo, submarinos e helicópteros para as Forças Armadas brasileiras.