Com a atividade econômica em forte retração no Brasil, o Banco Central surpreendeu boa parte do mercado financeiro e anunciou na quarta-feira, 6, um corte de juros maior que o esperado. Em decisão unânime, os dirigentes da autarquia cortaram em 0,75 ponto porcentual a Selic (a taxa básica de juros), de 3,75% para 3% ao ano. Esta foi a sétima redução consecutiva e a taxa atingiu o menor patamar da história.

A decisão do BC foi motivada pelos efeitos da pandemia do novo coronavírus, que colocou em isolamento social uma parcela considerável da população brasileira, com reflexos sobre a economia.

No comunicado que acompanhou a decisão de quarta, o BC avaliou que a contração econômica no Brasil será “significativamente superior” à prevista pela instituição em sua decisão anterior, em março. Para dirigentes do BC, a atual conjuntura prescreve juros “extraordinariamente” baixos.

Esta visão mais pessimista sobre a atividade econômica surpreendeu uma parte do mercado financeiro. De um total de 58 instituições consultadas pelo Projeções Broadcast, 48 esperavam um corte de 0,50 ponto porcentual da Selic, para 3,25% ao ano. A minoria – dez casas – aguardavam pela redução de 0,75 ponto, para 3,00% ao ano.

Além de citar perspectiva de retração econômica ainda maior este ano, o BC já sinalizou que em seu próximo encontro de política monetária, entre 16 e 17 de junho, a Selic deve sofrer novo corte, de até 0,75 ponto porcentual. Se isso ocorrer, a taxa básica atingirá o piso recorde de 2,25% ao ano.

As preocupações dentro do BC com o mergulho da atividade ficaram claras. Isso porque dois dos oito dirigentes que tomaram a decisão sobre a Selic chegaram a defender que o corte previsto para junho fosse feito na quarta, de uma só vez. Assim, a Selic já ficaria abaixo dos 3,00% ao ano. Mas, por cautela, a decisão final foi por voltar a reduzir a Selic mais à frente.

Efetividade

Apesar do esforço do BC para segurar a atividade, a consultora econômica Zeina Latif afirma que o movimento de corte de juros ocorreu em um momento em que a política monetária (a calibragem da taxa de juros) não tem efetividade. “Não é a política monetária, não é a Selic. Quando olhamos as taxas de juros de um ano, que são as mais longas e definem o custo do dinheiro no mercado, a pressão é fruto do ambiente global de incertezas e dos riscos internos do Brasil”, diz.

Segundo a economista, o benefício de um juro mais baixo agora no mercado de crédito é próximo de zero. “É pouco, porque o que está limitando o mercado de crédito agora certamente não é a Selic”, diz. “Está havendo melhoras no crédito por causa dessas medidas todas (ações governamentais emergenciais), mas tem restrições por causa do risco do crédito ser muito alto”, explicou a economista.

Contaminado

Sinal dos tempos, o novo coronavírus atingiu o próprio núcleo de decisão do BC. Na semana passada, o presidente Roberto Campos Neto e os oito diretores da autarquia fizeram teste para detectar covid-19. Isso porque, tradicionalmente, as reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom) são sempre presenciais, na sede de Brasília.

O exame do diretor de Organização do Sistema Financeiro, João Manoel Pinho de Mello, deu positivo. Numa segunda testagem, Mello recebeu resultado negativo. Como não havia tempo hábil para um terceiro teste, ele ficou fora das discussões e não votou sobre a Selic. / COLABOROU FRANCISCO CARLOS DE ASSIS

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.