Aos poucos, as eleições de novembro começam a voltar ao noticiário. A reeleição de Donald Trump, que parecia certa no cenário pré-Covid-19, foi atacada em cheio pelo vírus.
Trump ganhou a eleição de 2016 com uma campanha eminentemente nacionalista, e soube capturar a insatisfação do eleitorado americano com o status quo. Àquela época, segundo pesquisa divulgada pela The Economist e pelo site YouGov, a criação de empregos, a segurança nacional, o sistema de saúde e a luta contra o terrorismo eram os temas mais relevantes a serem enfrentados pelo próximo presidente. “Make America Great Again” estava afinado com tudo isso.
 
Trump pouco fez pela segurança nacional e pelo combate ao terrorismo, além de não ter conseguido mexer na grande marca do governo de Barack Obama: o sistema de saúde regulado pelo Obamacare. Conseguiu, entretanto, emplacar um gigantesco pacote de redução de impostos corporativos e dar um impulso relevante à atividade econômica, gerando a menor taxa de desemprego da história. Provavelmente ganharia a eleição deste ano surfando nessa onda. No início da pandemia, em 22 de março, dados do instituto Gallup mostravam que Trump contava com a aprovação de 49% dos americanos, o maior índice desde sua posse em janeiro de 2017.
 
A Covid-19 acabou com tudo isso. Hoje os Estados Unidos têm o maior índice de desemprego desde a depressão dos anos 1930 e a perspectiva de uma recuperação em “V” fica cada vez mais distante. Os efeitos econômicos da pandemia ainda estarão por aqui quando novembro chegar. E, aparentemente, o vírus também.
 
Ganhará a eleição o candidato que conseguir convencer o eleitorado de que está melhor preparado para enfrentar o coronavírus e suas múltiplas sequelas. Na minha visão, neste quesito, tanto Trump quanto o democrata Joe Biden estão com a guarda aberta. Milhas à frente dos dois está o governador do Estado de Nova York, Andrew Cuomo, que, pelo menos até agora, não é candidato a nada.
 
Trump teve momentos decisivos no combate à crise: proibiu viagens para a China, invocou o “Defense Protection Act” para a produção de equipamentos de proteção e ventiladores hospitalares, mandou navios-hospital para Nova York e Los Angeles, direcionou o corpo de engenheiros do exército para construir hospitais de campanha pelo país, aprovou um pacote de estímulos econômicos com rapidez e dimensão sem precedentes. Por outro lado, teve também momentos em que tentou tapar o sol com a peneira: disse que o vírus iria desaparecer sozinho, que a crise estava contida e diminuindo, e colocou ênfase demasiada em tratamentos ainda pouco efetivos contra a doença. Tudo isso será usado contra ele durante a campanha.
 
E Biden? Nada. A superexposição de Trump está sendo enfrentada por um Joe Biden escondido no seu porão, literalmente. Quem veio para o ataque foi Barack Obama, que nesta semana chamou a reação da administração Trump ao coronavírus de “um absoluto e caótico desastre”. Será que Biden vai escolher Cuomo como companheiro de chapa? Na minha visão, tornaria a candidatura democrata bastante mais competitiva: traria para a disputa um governador com um track-record impecável no quesito mais importante dessa eleição. Uma pesquisa publicada no começo de abril pelo Siena College Research Institute diz que 87% dos nova-iorquinos aprovam a atuação de Cuomo no combate à Covid-19. Mais interessante ainda é a quebra por filiação partidária: 70% dos filiados ao partido Republicano e 87% dos independentes avaliam o governador de maneira positiva. O ex-vice-presidente Biden, no entanto, já indicou que deseja dividir a chapa com uma mulher como candidata ao seu lado.
 
As últimas pesquisas colocam Biden à frente de Trump, com uma diferença de cerca de 5% entre eles. Sem dúvida ainda é muito cedo para uma definição do cenário, mas a eleição deve começar a dividir a atenção do noticiário em um futuro cada vez mais próximo. Enquanto isso, todos os olhos estão voltados para a reabertura da economia. Começamos a semana com as bolsas americanas em alta expressiva por conta de resultados positivos, em oito pessoas, para uma potencial vacina. Sim, oito pessoas. Nem 80, nem 800, nem 8000, mas oito. Para os mercados, a esperança parece ser uma estratégia.
 
Todos esperamos ansiosamente algo que nos proteja dessa ameaça invisível. Infelizmente, ao que parece, ainda estamos um pouco longe. O próximo presidente americano será aquele que conseguir mostrar ao eleitorado que, diferentemente dos mercados, não tem a esperança como estratégia.