31/10/2020 - 7:22
Incêndios em hospitais são cada vez mais frequentes no Brasil porque falta manutenção preventiva em sistemas elétricos e de ar-condicionado. A maioria dos prédios é antiga e não tem instalações adequadas para equipamentos cada vez mais modernos, como os de UTI. Falta conscientização dos gestores sobre riscos nas unidades de saúde, onde a fiscalização é falha. Além disso, as equipes têm pouco treinamento específico.
Para especialistas e representantes do setor, esse cenário marca o aumento de casos como o do Hospital Federal de Bonsucesso, no Rio: 4 pessoas morreram e 150 tiveram de ser removidas esta semana. Não é um caso isolado. O Instituto Sprinkler Brasil e a Associação Brasileira para o Desenvolvimento da Edificação Hospitalar, com apoio da Sociedade Brasileira para Qualidade do Cuidado e Segurança do Paciente, revisaram ocorrências de incêndio em estabelecimentos de saúde veiculadas pela mídia nos últimos dois anos. Em 2019, foram 39. De janeiro a outubro deste ano, são 54, alta de mais de 50% ante o mesmo período do ano anterior. São Paulo é o Estado com mais registros (9), seguido de Minas e Rio (7 cada).
Especialistas destacam que os números refletem pequena parte das ocorrências, pois vários incêndios não são registrados – há subnotificação. “O ideal seria termos números oficiais repassados pelos Corpos de Bombeiros do País, mas isso não ocorre. A estimativa é de que o número encontrado por nós corresponda a 3% do número total de casos”, diz Marcelo Olivieri de Lima, diretor geral do Instituto Sprinkler Brasil.
Um dos problemas centrais é a falta de manutenção preventiva em prédios já envelhecidos. A maioria dos hospitais tem estruturas antigas. Nesses imóveis, os sistemas elétricos necessitam de modernizações para receber respiradores e monitores em uma UTI, por exemplo. Nem sempre isso acontece.
O engenheiro Felipe Melo, presidente da Associação Brasileira de Sprinklers, explica que são comuns situações em que o maquinário está ligado ao mesmo tempo em uma rede elétrica que pode não estar preparada para a carga e estoque de produtos inflamáveis sem as corretas medidas preventivas.
Também há limitações físicas. José Luiz Spigolon, diretor-geral da Confederação das Santas Casas e Hospitais Filantrópicos por quase 30 anos e hoje consultor da entidade, cita um “puxadinho” de um hospital de Fortaleza para receber um acelerador linear para tratamento por radioterapia. O equipamento de R$ 3 milhões havia sido doado pela União. Como o hospital não tinha espaço, precisou comprar uma casa vizinha e construir um túnel para acessar a sala do novo acelerador.
Além dos problemas estruturais, o País ainda enfrenta a pandemia. Mesmo que a pressão sobre o sistema de saúde não tenha sido a causa direta dos incêndios recentes, especialistas concordam que pode haver sobrecarga em breve. “A lotação dos hospitais, causada pelo alto número de pacientes com covid-19, pode sobrecarregar um sistema já fragilizado e perto do colapso”, avalia Felipe Melo.
Walter Cintra, professor de Administração Hospitalar da FGV, aponta que projetos hospitalares atuais levam em consideração as normas mínimas, visando só à aprovação dos órgãos reguladores.
“Para prevenir incêndios de forma eficiente, é preciso ter um planejamento detalhado e manutenção preventiva. Parte dos hospitais não tem nem alvará de inspeção do Corpo de Bombeiros. Há certa liberalidade no setor. Quem vai fechar um hospital?” Para Spigolon, a saída passa por dinheiro. “É investir na modernização dos edifícios, reformas estruturais e treinamento das equipes para tenham outra visão da questão da segurança”, diz.
Recursos
“Se o setor de Saúde fosse financiado adequadamente, não teríamos essa situação, principalmente nos hospitais públicos”, opina Yussif Ali Mere Jr., presidente da Federação dos Hospitais, Clínicas, Casas de Saúde, Laboratórios de Pesquisas e Análises Clínicas e demais Estabelecimentos de Serviços de Saúde de São Paulo. O setor, diz ele, vive dificuldades e o total de usuários da rede privada caiu de 51 milhões para 47 milhões nos últimos anos. O Ministério da Saúde e a Anvisa, que tem desde 2014 manual de segurança contra fogo em unidades de saúde, não comentaram a alta de incêndios.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.