01/11/2020 - 2:55
No final de janeiro, pouco depois da confirmação do primeiro caso nos Estados Unidos do que ainda não era chamado de covid-19, a Bolsa de Valores de Nova York registrou um recorde histórico e a maior preocupação de Donald Trump era o impacto dos problemas da Boeing na economia.
“O sonho americano está de volta, mais forte do que nunca”, declarou o presidente em Davos, onde se gabou de uma “prosperidade sem precedentes”.
Nove meses depois, 60 milhões de americanos tiveram covid-19, segundo um modelo estatístico, e mais de 300 mil morreram, direta ou indiretamente, devido à pandemia, tornando o coronavírus a terceira maior causa de morte em 2020 no país.
Milhões de americanos perderam seus empregos e, apesar de uma recuperação econômica impressionante no terceiro trimestre, muitos ainda não encontraram um novo trabalho. Uma catástrofe capaz de derrubar o argumento eleitoral mais sólido dos presidentes dos EUA em busca de um segundo mandato: a força econômica.
Apesar de tudo, Trump está otimista e confiante de que seu rival democrata, Joe Biden, será penalizado pelos eleitores por não ter feito uma real campanha neste terreno. Mas sem dúvida a gestão da crise provocará a perda de votos para o presidente.
Kimberly McLemore, uma joalheira de 56 anos, é uma das pessoas que não votarão no presidente por sua abordagem da pandemia. Pela primeira vez na vida, essa cidadã de St. Augustine, Flórida, vai votar nos democratas.
“Pelas minhas convicções, não posso votar naquele homem”, disse à AFP. “Ele espalhou desinformação”. Seus pais, de 86 e 89 anos, republicanos como ela, também votarão em Biden.
Mas quantas Kimberly haverá no país?
– Alguns votos –
“Covid, covid, covid! A mídia de ‘notícias falsas’ só fala disso”, reclamou recentemente o presidente durante um comício.
Desde o início de sua campanha, o vírus frustrou Trump. Seu primeiro comício pós-confinamento em junho, em Tulsa, Oklahoma, pode ter sido um foco de contágios. E a Casa Branca teve vários casos confirmados, incluindo o próprio presidente.
Há meses, as pesquisas mostram que a maioria dos americanos desaprova a maneira como ele lida com a crise de saúde. Apenas 40% dos entrevistados aprovam Trump, de acordo com uma pesquisa recente da Gallup, em comparação com 60% em março.
A mudança é notável em um dos alvos tradicionais dos republicanos: os idosos. Pesquisadores fizeram uma análise para isolar o “efeito covid” nas eleições, publicada sexta-feira na revista Science Advances.
A partir de um grupo de 300 mil pessoas em 2019 e 2020 e dados locais de mortalidade do vírus, eles conseguiram vincular a queda na popularidade de Trump ao número de mortes por covid-19 a nível local, por condado.
A duplicação do número de óbitos nos 30 dias anteriores em um determinado condado está relacionada a uma redução de 0,14 ponto percentual nas intenções de voto para Trump, e de 0,28 para os candidatos republicanos ao Senado, segundo seus cálculos.
“É bem possível, de acordo com nossos resultados, que a covid retire do presidente e seu partido entre meio ponto e um ponto em alguns estados e condados”, afirmou o principal autor do estudo, Christopher Warshaw, da Universidade George Washington.
Pode ser o suficiente para Biden. Em 2000, as eleições presidenciais foram decididas por algumas centenas de votos na Flórida. E quatro anos atrás, uma pequena margem de 77 mil votos em três estados (Pensilvânia, Michigan e Wisconsin) deu a Trump a vitória sobre Hillary Clinton.