14/03/2021 - 16:12
O restabelecimento dos direitos políticos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva impactou as estratégias e alterou a projeção que líderes políticos envolvidos com a sucessão presidencial vinham fazendo do cenário de 2022. De imediato, além de acelerar o processo de articulação de futuras candidaturas, a entrada de Lula no jogo eleitoral estreitou o espaço para candidatos. Por dois motivos: por um lado porque o ex-presidente cria uma expectativa de aliança na esquerda e por outro porque fica mais restrita a viabilidade de candidaturas que queiram se oferecer como alternativa à polarização.
No contexto atual, há três nomes que se apresentam no chamado “centro expandido” da política nacional: Ciro Gomes (PDT), Luciano Huck e o governador de São Paulo, João Doria (PSDB). Como mostrou o Estadão, em meio à novidade Lula, Doria admitiu pela primeira vez que pode deixar de lado o projeto presidencial e optar por disputar a reeleição no ano que vem.
A raia mais estreita da corrida eleitoral afeta também as articulações de Huck e Ciro. O ex-ministro e presidenciável do PDT terá agora de partir para negociações mais efetivas no campo do centro, já que a esquerda passa a gravitar na órbita de Lula. No caso do empresário e apresentador da TV Globo, as tratativas com o PSB ficam mais incertas e um dos pilares de sua retórica – o combate à desigualdade social – passa a ter forte concorrência.
“A entrada de Lula acelerou o processo sucessório e também acelerou para o Huck. A pressão agora não é mais só profissional”, disse o ex-deputado Roberto Freire, presidente do Cidadania. “Lula força uma discussão mais profunda sobre a criação de um polo alternativo.”
Freire tem conversado com Ciro e dirigentes do PDT não descartam que o Cidadania se alie ao ex-ministro caso Huck decida não concorrer.
Huck deverá, até meados do ano, tomar a decisão de renovar ou não o contrato com a Globo, indicando sua disposição de manter ou não o projeto eleitoral para 2022. Ele voltou a conversar com o DEM e abriu diálogo com emedebistas – a senadora Simone Tebet (MDB-MS) jantou recentemente na casa do apresentador. Seu grupo político, porém, agora tem dúvidas se o PSB vai caminhar para um convite formal e público a Huck.
A interlocução entre Huck e os pessebistas tem sido feita pelo prefeito do Recife, João Campos. A avaliação é que o rumo do partido em 2022 será ditado justamente pelo arranjo que melhor favorecer os interesses eleitorais da ala dominante do PSB, concentrada em Pernambuco – onde Lula é forte catalisador de votos.
“Já estamos conversando com o centro. O Ciro tem aprofundado o diálogo com o PSD, DEM, PV e Rede”, afirmou o presidente nacional do PDT, Carlos Lupi, para quem Huck “perde base popular” com a volta de Lula. Ciro tem, prioritariamente, investido na construção de uma ponte mais sólida na ala nordestina do DEM – um dos seus interlocutores mais frequentes é o ex-prefeito de Salvador ACM Neto, presidente nacional do partido.
Caso mantenha os direitos políticos até a eleição do ano que vem, Lula também impacta o projeto do PSOL. O apoio ao petista ainda sofre resistências internas, especialmente dos líderes da legenda que foram expulsos do PT, mas o debate ganha volume na sigla. O presidente nacional do PSOL, Juliano Medeiros, disse ao Estadão que “a presença de Lula no debate público reforça a luta da oposição contra Bolsonaro”. “Queremos criar um espaço formal para discutir a unidade com os partidos.”
Moro. Analistas e líderes partidários ainda avaliam, e também divergem, a respeito do impacto que o fato da última semana tem sobre o ex-ministro Sérgio Moro. Apesar da decisão do ministro Edson Fachin de anular as condenações de Lula na Lava Jato em Curitiba, a Segunda Turma da Corte manteve o julgamento que analisa a suspeição do ex-juiz titular da operação.
Recolhido desde que deixou o governo federal, Moro se tornou sócio-diretor da consultoria americana Alvarez & Marsal no ano passado. Mantém conversas com Huck e Doria, mas sem indicar pretensão de ser protagonista no ano que vem. Diante do fator Lula, o ex-juiz é visto por dois ângulos: um cenário em que é considerado parcial e perde capital político para uma investida eleitoral e outro em que a presença do ex-presidente revitaliza também o antipetismo e abre uma “estrada” para Moro.
Seus apoiadores confiam na segunda hipótese e reforçaram a pressão para que ele tome o mais rápido possível uma decisão sobre 2022. “Moro está sendo convocado à luta para defender a causa do combate à corrupção, que se enfraquece. Esta é uma decisão muito pessoal: aceitar a convocação para o enfrentamento ou se acomodar. A Lava Jato está sendo golpeada de forma fatal. Vejo como uma convocação ao enfrentamento”, disse o senador Alvaro Dias (PR), principal interlocutor entre o ex-ministro e o Podemos.
No campo governista, parte dos aliados de Jair Bolsonaro admite que o retorno de Lula pode dividir o apoio que o presidente tem hoje dos partidos que integram o Centrão. Aliados articulam a volta dele ao PSL e pregam que, para enfrentar Lula, é preciso entrar na disputa com uma sigla bem estruturada – ou seja, com dinheiro em caixa e tempo de televisão.
“O tsunami que elegeu Bolsonaro em 2018 não vai se repetir em 2022. Vai voltar o jogo da estrutura partidária”, disse ao Estadão o deputado bolsonarista Luiz Philippe de Orleans e Bragança (SP), que integra o círculo político mais próximo da família Bolsonaro. As conversas entre o PSL e o presidente foram retomadas e o partido isolou a ala de oposição ao governo no Congresso.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.