23/08/2006 - 7:00
Se você passou anos brigando na Justiça contra o governo, recebeu um precatório como crédito e não quer esperar outros tantos anos para receber o que tem direito, pode tentar vender o papel no mercado paralelo. O atraso no pagamento pelos Estados e municípios, que em muitos casos chega a uma década, tem fomentado o comércio desses títulos. Só o Estado de São Paulo tem uma montanha de cerca de R$ 13 bilhões de precatórios, numa fila de espera que se estende desde 1997. Aberta esta oportunidade de negócio, já existem escritórios especializados em intermediar a compra e venda de precatórios referentes a ações de indenização a pensionistas, ex-servidores públicos e cidadãos que tiveram imóveis desapropriados. O comandante aposentado da Vasp Péricles Leonardi, de 67 anos, está no primeiro grupo. Recentemente, procurou um desses escritórios e pôs à venda um precatório no valor de R$ 160 mil, referente a uma pensão que deveria ter recebido do governo do Estado de São Paulo. O crédito está disponível, à espera de um interessado, mas sua venda é considerada difícil, pelo alto valor ? em média, essas dívidas variam entre R$ 8 mil e R$ 15 mil. ?Entrei na Justiça em 1991 e só depois de sete anos ganhei a causa e recebi o precatório?, conta. ?Desde então, já se passaram mais sete anos e ainda não vi a cor do dinheiro. Não tenho muito mais tempo para esperar o governo resolver me pagar o que deve.?
Assim como o ex-piloto, muitos credores de Estados e municípios, em ações judiciais, já são idosos e não têm condições de esperar para receber o que lhes é devido. Nesses casos, a saída para não carregar, durante anos, um crédito que pode acabar virando pó é vender o direito do recebimento futuro. As taxas de desconto, porém, chegam a até 70% do valor de face do precatório. ?Mas, se o dinheiro (recebido com a venda) for aplicado no mercado financeiro, a perda com o deságio pode ser reduzida?, pondera o advogado Marco Antônio Innocenti, do escritório Innocenti Advogados Associados, um dos maiores negociadores de precatórios de São Paulo.
Segundo Innocenti, os precatórios vencidos são comprados por empresas para a compensação de débitos tributários, sobretudo referentes ao ICMS, com os mesmos governos devedores. Embora a compensação não seja aceita pelos Estados e municípios, a Justiça, muitas vezes, tem acatado a prática. ?As companhias oferecem esses papéis como garantia para impedir que seu patrimônio seja penhorado no caso de uma discussão judicial?, explica Innocenti. A exemplo das empresas, algumas pessoas também estão utilizando precatórios para quitar débitos com o governo. O casal de advogados gaúchos Eunice Casagrande e Omar Ferri, por exemplo, ganhou na Justiça o direito de compensar um precatório de R$ 2 mil pelo valor devido no IPVA.
Palavrão saído dos tribunais, precatório nada mais é do que uma dívida do Estado cujo pagamento é determinado pela Justiça em última instância. Ou seja, quando não há mais possibilidade de recurso. Se não for paga, o STF pode até mesmo decretar intervenção federal no Estado devedor. A lei garante que, para quitar os débitos, o Estado pode emitir títulos correspondentes ao valor da dívida. Mesmo assim, o estoque de débitos judiciais vencidos é estimado em dezenas de bilhões de reais.
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DÍVIDA ETERNA Total de precatórios emitidos por Estados e vencidos há uma década |
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Minas Gerais | R$ 14 bilhões |
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São Paulo | R$ 13 bilhões |
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Paraná | R$ 09 bilhões |
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Rio Grande do Sul | R$ 02 bilhões |
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