27/11/2021 - 12:36
Quem eram? O que fazer com seus corpos? Após o naufrágio trágico de imigrantes no Canal da Mancha esta semana, alguns voluntários começaram a árdua tarefa de identificar as vítimas a fim de dar-lhes um sepultamento digno.
Jan Kakar, com o telefone na mão, entra no necrotério de Lille (norte da França) na sexta-feira, dois dias depois do drama que matou 27 pessoas a caminho do Reino Unido.
Ali são realizadas as autópsias dos corpos recuperados. Por horas, Kakar, presidente de uma associação afegã em Paris, não para de receber em seu celular fotos e mensagens de oito famílias daquele país, que acreditam ter um de seus membros entre os falecidos.
Em uma das fotos você pode ver um jovem sorridente com cabelos pretos e uma camisa laranja. Ele está entre os mortos? As famílias do outro lado da linha ainda esperam um erro.
E é isso que Kakar está tentando descobrir, que também tem a missão das famílias de repatriar os corpos ao Afeganistão, para que sejam enterrados.
Ele não tem tempo para muitas ilusões: “Eles têm irmãos ou parentes nos campos de Calais (na costa noroeste francesa, ndlr) que confirmam que faziam parte” do embarcado, explica este homem à AFP.
– Um autêntico trabalho de investigação –
Por enquanto, a justiça nega o acesso aos corpos.
“Ainda pode demorar uma ou duas semanas”, disse Samad Akrach, chefe da associação Tahara, que é responsável por garantir um sepultamento digno e gratuito para imigrantes e indigentes.
Os corpos não identificados são mantidos em armazém provisório. Se em cinco anos ninguém da família os reivindicar, eles são cremados ou transferidos para um ossário, explica Akrach.
“Não queremos isso: acreditamos que todos merecem um sepultamento digno! […] Nós fazemos um verdadeiro trabalho investigativo”, diz Akrach.
No momento, não há dados sobre a identidade ou nacionalidade dos que morreram no mar há três dias. A Promotoria de Paris, quando indagada pela AFP, não pôde responder no momento, pois recebeu o dossiê na quinta-feira.
– Redes sociais –
Os migrantes interrogados pela AFP na costa norte da França afirmam ter compartilhado os últimos momentos das vítimas. Eles dizem que foram curdos iraquianos, iranianos e afegãos.
Como acontece com todo falecido na fronteira com o Reino Unido, voluntários e membros de associações militantes irão para os campos de imigrantes para fazer seu trabalho meticuloso.
Conhecidos como “morte em grupo” desde 2017, buscam “devolver identidade” aos imigrantes para evitar que seu nome quando enterrado seja um X.
No entanto, esse grupo, acostumado a trabalhar em um ou dois casos por vez, enfrentou 27 mortes durante três dias.
Como vamos fazer isso?, Lamenta Mariam Guerey, uma das promotoras do grupo, que vasculha as redes sociais em busca de informações sobre parentes e amigos dos falecidos.
“Por uma vez, esperamos que o estado se mobilize” porque “temos uma grande tarefa pela frente”, diz Juliette Delaplace, que também faz parte desse grupo.
Por sua vez, Jan Kakar e Samad Akrach aguardam com resignação que as autoridades lhes permitam ver os corpos, uma vez que se trata de uma “corrida contra o tempo”.