02/01/2022 - 17:00
Há quase um ano, a enfermeira Mônica Calazans exibiu em rede nacional o sorriso da esperança de que a pandemia poderia um dia acabar. Era uma tarde de domingo quando ela se tornou a primeira brasileira vacinada contra a covid-19. “Não tive medo em momento nenhum. Fui com muita segurança na vacina, desde o início”, conta.
A primeira agulhada, em 17 de janeiro de 2021, ocorreu após embates políticos, desinformação e resistência do governo federal em começar logo a aplicação de doses – o cenário se repete agora com a imunização infantil. “Uma coisa que sempre falo e repito: quando a gente nasce, a primeira coisa que a nossa mãe faz é vacinar. É questão de carinho, de segurança”, diz.
A imagem da picada no braço esquerdo de Mônica, enfermeira negra do Hospital Emílio Ribas, de São Paulo, foi o pontapé inicial de um movimento que reduziu casos e mortes por covid-19 em todo o País. Atualmente, já são quase 70% dos brasileiros vacinados com duas doses.
Com o avanço da vacinação, os hospitais têm aberto mais leitos para tratar pacientes que ficaram à espera de alívio na pandemia. A luta de Mônica continua, mas em outras frentes. “Estamos conseguindo respirar em relação à covid19. Agora, temos pacientes com outras comorbidades”, afirma ela, que tem 55 anos.
O cotidiano de Mônica exemplifica a própria dinâmica do hospital. Durante meses, a UTI esteve inteiramente dedicada ao tratamento de pacientes com covid e chegou a ter 70 leitos – hoje, são 50. Em março, 100% dos leitos estavam ocupados; 97% por causa do coronavírus. Atualmente, o hospital ainda recebe pacientes graves encaminhados de outros serviços públicos e também sente a alta dos casos de gripe: duas pessoas estavam internadas na semana passada. Mas a pressão diminui.
Hoje, o endereço da Avenida Dr. Arnaldo, na zona oeste paulistana, voltou a tratar doenças infectocontagiosas, sua especialidade. O centro é referência na América Latina nos cuidados com pacientes de HIV e doenças como febre amarela e H1N1. E Mônica já conhece de cor todas as antessalas que funcionam como barreiras para o contágio. “O paciente com HIV é muito bem acolhido no hospital, do ponto de vista emocional e clínico.”
O foco no atendimento de outras doenças se repete no Pronto Atendimento de São Mateus, mantido pela Prefeitura de São Paulo, na zona leste. Este é o segundo emprego de Monica. Com a queda dos casos de covid, ela atende mais pacientes com pressão alta, dores abdominais, infecções urinárias, cefaleias e problemas decorrentes de diabete. O número de transferências de pacientes também diminui – o posto onde trabalha não tem estrutura de internação. No pico da pandemia, em maio do ano passado, ela cruzava a cidade quatro ou cinco vezes por dia acompanhando pacientes para os hospitais de campanha. Cruzar está aqui no sentido literal, de São Mateus, no extremo da zona leste, até Parelheiros, no extremo sul, por exemplo. Agora, as transferências caíram para uma por dia e se resumem a pacientes com suspeita de covid.
FAMA. Paciente de risco para o coronavírus por ser obesa, hipertensa e diabética, Mônica recebeu a primeira dose da Coronavac aplicada no País, no mesmo dia em que a vacina foi aprovada emergencialmente pela Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa). “Naquele momento, tínhamos 220 mil mortos no Brasil. A vacina fez uma diferença enorme. A gente trabalha com mais confiança porque temos a vacina”, afirma.
De lá para cá, a torcedora do Corinthians se tornou a cara da campanha de vacinação. Foi ela quem aplicou a primeira dose da Coronavac no governador João Doria (PSDB), meses depois. Vencedora do 1.º Prêmio Notáveis da emissora CNN Brasil para empresas, pessoas e entidades por ações positivas na pandemia, a enfermeira costuma ser reconhecida nos atendimentos, mas algumas pessoas estranham que ela esteja mesmo na linha de frente. “Muita gente pensa que eu não trabalho”, conta, antes de dar uma gargalhada gostosa.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.