26/02/2022 - 8:16
Imunizante à base de proteínas está finalmente disponível no país. Tecnologia já utilizada contra outras doenças pode ter papel central na campanha global de imunização anticovid – e convencer céticos da vacina.A Alemanha começa neste sábado (26/02) a adotar o imunizante contra o novo coronavírus Nuvaxovid. Em alguns estados como Hamburgo e o Sarre, as vacinações já se iniciaram.
Há vários dias já eram longas as filas de espera para a vacina produzida pela empresa americana Novavax. O interesse é grande, porque ela é à base de proteínas, diferenciando-se das demais disponíveis na União Europeia (UE) – que se baseiam em RNA-mensageiro (Pfizer-BioNTech e Moderna) ou na tecnologia de vetor viral (AstraZeneca e Johnson&Johnson).
No fim de 2021, a Agência Europeia de Medicamentos (EMA, na sigla em inglês) aprovou a Nuvaxovid como quinto imunizante contra a covid-19 em circulação na UE. A Alemanha encomendou um total de 34 milhões de doses do laboratório, e os primeiros 1,4 milhão de doses já devem estar disponíveis à população.
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Vacinas baseadas em proteínas podem ser uma verdadeira alternativa para os céticos da vacinação anticovid, uma vez que a tecnologia já é usada há décadas contra doenças como poliomielite, tétano, hepatite B e gripe. O imunizante também mostrou oferecer alta proteção contra o novo coronavírus e causar menos efeitos colaterais do que outros fármacos já aprovados.
Acima de tudo, porém, vacinas de proteínas são urgentemente necessárias para as campanhas de vacinação mundo afora, num momento em que, em países de baixa renda, apenas uma fração da população está vacinada. A contribuição desses imunizantes pode ser grande para uma campanha global, já que eles custam menos para ser produzidos e podem ser transportados e armazenados mais facilmente do que as complexas vacinas de mRNA.
“Muitas de nossas primeiras doses irão para países de baixa e média renda e que têm sido o objetivo desde o princípio”, afirmou Stanley Erck, presidente da Novavax, ao solicitar uma aprovação de emergência à EMA em 2021. Em tese, vacinas baseadas em proteínas podem também ser produzidas em países em desenvolvimento, se as farmacêuticas responsáveis liberarem a patente.
Como funcionam as vacinas de proteínas?
Vacinas anticovid baseadas em proteínas contêm pequenas partículas do vírus Sars-Cov-2, especificamente as que compõem a chamada proteína spike, espécie de porta molecular que o coronavírus usa para entrar nas células. O sistema imunológico reage a essas proteínas contidas na vacina, e a reação imunológica é muito mais rápida porque o organismo – diferente do que ocorre com outras vacinas – não precisa produzir primeiro as proteínas spike.
Como as nanopartículas produzidas pelo corpo não contêm nenhum material genético – como as vacinas de mRNA –, imunizantes de proteínas também têm menor probabilidade de causar efeitos colaterais. Contudo a resposta à vacina é também mais fraca.
A fim de aumentar a resposta aos imunizantes, são adicionados às vacinas os assim chamados adjuvantes. Com a Novavax, o adjuvante consiste em nanopartículas de saponina e fosfolipídios.
Opositores das vacinas alegam que alguns adjuvantes, como sais de alumínio, são prejudiciais à saúde. Contudo, nenhuma ligação com efeitos colaterais sérios ou alergias foi constatada nos estudos realizados.
Desenvolvimento duradouro
Antes de as vacinas de mRNA celebrarem seu sucesso em meio à pandemia de covid-19, imunizantes à base de proteínas já eram considerados uma tecnologia particularmente pioneira e amadurecida, afirma Carlos Alberto Guzmán, chefe do Departamento de Vacinologia e Microbiologia Aplicada do Centro Helmholtz, na Alemanha.
“Vacinas baseadas em proteínas são muito bem conhecidas, são geralmente mais bem toleradas, e não há grandes questionamentos a respeito. Uma desvantagem é que o desenvolvimento de vacinas de proteínas é mais demorado do que o de imunizantes de vetor viral ou mRNA”, disse à DW.
Isso ocorre porque leva tempo para integrar as instruções de construção de uma proteína spike em células obtidas em micróbios, mamíferos, insetos ou plantas. Os últimos meses mostraram quão complexo é adaptar proteínas purificadas de tal maneira que possam ser produzidas em larga escala sem qualquer erro.
Mas ao fim desse longo processo de desenvolvimento, vacinas à base de proteínas são importantes alternativas às já estabelecidas vacinas de vetor viral e mRNA.
Quão efetivas são as vacinas anticovid à base de proteínas?
Segundo a empresa Novavax, seu imunizante seria também eficaz contra a variante ômicron do coronavírus. A reação imunológica após duas doses da vacina é ainda comparativamente baixa. Mas após uma terceira dose – ou seja, uma dose de reforço seis meses após a segunda injeção – a proteção contra a ômicron aumenta significativamente.
O Instituto Paul Ehrlich, agência de pesquisa do Ministério da Saúde alemão, observa que por enquanto há dados limitados sobre a eficácia das vacinas baseadas em proteínas contra a ômicron e outras variantes de preocupação.
Em meados de 2020, a vacina da Novavax estava em pé de igualdade com os imunizantes da Pfizer-BioNTech e da Moderna em estudos nos Estados Unidos e no México, com uma eficácia geral de 90,4%. Mas isso foi antes do surgimento das variantes delta e ômicron, que também afetaram o funcionamento das vacinas de mRNA.
Por isso, o imunizante da Novavax também deve ser adaptado à nova variante do vírus. Segundo a empresa, uma vacina específica para a ômicron já está em desenvolvimento, com os ensaios clínicos programados para começar até o fim de março de 2022.
Proteção dupla contra coronavírus e influenza
Convenientemente, a vacina da Novavax foi projetada para proteger simultaneamente contra os vírus Sars-Cov-2 e influenza, causador da gripe. Essa pode acabar se provando uma estratégia inteligente, prescindindo de um intervalo entre as duas aplicações e possibilitando a inoculação contra os dois patógenos ao mesmo tempo.
Segundo Guzmán, o estudo recente envolvendo a Nuvaxovid “representa um avanço”. “Fornece a primeira evidência de que uma vacina para covid-19 e uma vacina contra a gripe sazonal podem ser administradas ao mesmo tempo, em dois braços diferentes, sem comprometer sua eficácia”, afirma o especialista do Centro Helmholtz.
Novavax tem capacidade para entregar tantas doses?
As expectativas para a vacina à base de proteínas da Novavax são, portanto, enormes. Ao todo, a empresa diz que fechou contratos para o fornecimento de 2 bilhões de doses, incluindo 110 milhões para os Estados Unidos. Mas no país natal da companhia, a aprovação para uso ainda deve demorar.
O imunizante foi primeiramente aprovado na Indonésia e nas Filipinas, e em seguida autorizado na União Europeia em dezembro de 2021. Para o importante mercado americano, a Novavax somente solicitou aprovação no fim de 2021, quase um ano depois do planejado.
O aval das autoridades regulatórias americanas ainda dependerá, entre outros fatores, de se a farmacêutica – relativamente pequena – será capaz de fornecer seu produto sem restrições. E há certas dúvidas, também na União Europeia.
Diversas vezes no passado, por exemplo, a Novavax informou que as entregas não poderiam ser feitas a tempo, afirmou em meados de fevereiro o ministro da Saúde alemão, Karl Lauterbach. Mas a empresa e o governo alemão estão em estreito contato, e ele garante que as entregas serão realizadas no prazo. Segundo o ministério, 4 milhões de doses da Nuvaxovid deverão estar disponíveis na Alemanha até o fim de março.
Outras candidatas promissoras
Outras empresas desenvolvedoras de vacinas, como a farmacêutica indiana Biological E e a concorrente chinesa Clover Biopharmaceuticals, também deverão solicitar aprovação para seus imunizantes à base de proteínas, num futuro próximo.
Também nos estágios iniciais estão a gigante farmacêutica britânico-francesa Sanofi-GlaxoSmithKline, a canadense Medicago e o grupo sul-coreano SK Bioscience.
Além disso, vacinas baseadas em proteínas estão sendo desenvolvidas em vários países. Em alguns, como Cuba, Rússia e Taiwan, imunizantes de proteínas têm sido há muito tempo um pilar central das campanhas nacionais de imunização contra o coronavírus.