Com um enredo “Planeta Água”, inspirado na música de Guilherme Arantes, a Mancha Verde se sagrou campeã do Grupo Especial do carnaval de São Paulo em 2022. É o segundo título da escola, também campeã em 2019. Uma das escolas mais tradicionais do País e grande vencedora da folia paulistana, o Vai-Vai foi rebaixado no mesmo ano em que retornou da então inédita passagem pelo Grupo de Acesso I. A Colorado do Brás – penalizada em 0,5 pontos por uma violação do regulamento – também foi rebaixada.

A leitura das notas foi acompanhada pelos integrantes das escolas na tarde desta terça-feira, 26, no Sambódromo do Anhembi, zona norte de São Paulo. A disputa foi acirrada. A Mocidade Alegre chegou a assumir a liderança na metade da apuração, mas perdeu a posição em seguida. O resultado só foi definido no último quesito, a comissão de frente, a partir de critérios de desempate. Além da campeã e da Mocidade, a Império de Casa Verde e a Tom Maior também somaram 269,9 pontos.

O presidente da Mancha Verde, Paulo Serdan, disse, após a vitória, estar vivendo um misto de sentimentos por ter perdido o último carnaval na mesma categoria em que venceu neste ano. “A Mancha está em um grau de maturidade que a gente espera poder estar sempre.”

Ele ressaltou que a escola soube ter frieza para avaliar a situação quando teve problemas com o abre-alas, que cruzou a linha amarela, de início da pista, após mais de 10 minutos, com a queda do braço de uma das esculturas de Oxum. “A gente teve humildade para chegar na faixa amarelo, que é onde tudo acontece. A gente soube lidar com problemas”, justificou. “Vamos ser lembrados como a primeira escola que venceu em São Paulo depois do início da pandemia. Foi um período triste, claro, mas a vitória fica marcada como uma espécie de retomada da alegria”, disse Serdan.”

Ligada à torcida homônima do Palmeiras, a Mancha desfilou na primeira noite do grupo especial, na sexta-feira, 22. Apesar do problema com o carro alegórico, não estourou o tempo regulamentar. O enredo “Planeta Água” começou com uma comissão de frente com referências a Oxalá, saudada por lavadeiras, e trazia também Exu e Xangô, também entidades do candomblé.

No abre-alas, em referência à Oxum, divindade das águas doces, havia uma fonte em que a água jorrava da boca de alegorias de peixes. Telões exibiam quedas d’água, mesmo recurso utilizado em outro carro.

Já o mestre-sala (Marcelo Silva) vestia chapéu e tinha uma capa de rede de pescador, enquanto a porta-bandeira (Adriana Gomes) era Nossa Senhora Aparecida, alusão à história dos que encontraram a imagem da santa. A escola fez paradinhas longas, de cerca de meio minuto, em que segurou o canto somente com o coro dos integrantes, que repetiam “Iemanjá, Iemanjá, rainha das ondas, senhora do mar…”

O segundo carro da Mancha trazia referências indígenas, com uma alegoria giratória próxima ao topo, com bustos de mulheres e uma escultura de serpente à frente. Entre os destaques da alegoria, estava o torcedor Nickollas Grecco, que é cego e ficou conhecido por assistir aos jogos do Palmeiras a partir da descrição da mãe, Silvia Grecco.

Mais atrás, alas com plantas vitória-régia, peixes e pescadores, em que os desfilantes seguravam varas e ficavam dentro de canoas. Já o terceiro carro também exibia imagens do fundo do mar em telões, com uma grande sereia à frente e uma Iemanjá. O carnavalesco do desfile foi Paolo Bianchi. A última alegoria trazia referências ao “ciclo da vida”, com engrenagens, cavalos-marinhos e uma grande escultura de Poseidon.

A bateria liderada por Guma Sena trouxe ritmistas com fantasias inspiradas no sertão nordestino, alusivas às roupas de couro e chapéus meia-lua. À frente, desfilou Duda Serdan, filha do presidente da Mancha, como princesa da bateria. Nos últimos metros da pista antes da dispersão, torcedores da Mancha utilizaram sinalizares, criando uma grande nuvem verde no sambódromo.

“Na hora que mais precisei se entregaram, correram e resolvemos o nosso imprevisto. O nosso título dedico a eles (trabalhadores da agremiação)”, disse Serdan. “A gente sabia o que estava fazendo, a gente só mudou a jornada estética do desfile.”

Ele afirmou ter sentido que a escola poderia ser campeã na hora em que fez a primeira paradinha no samba-enredo. “A gente estava precisando. E aí teve aquela explosão de canto”, afirmou. O presidente da escola também agradeceu ao cantor Guilherme Arantes, cuja música Planeta Água inspirado inspirou o enredo. “Honramos a sua música.”

A escola estreou no carnaval paulistano como uma ala dentro da Águia de Ouro, em 1988, por iniciativa de um dos fundadores da torcida Mancha Verde Cléo Sostenes, que morreu meses após o desfile e antes de realizar o sonho de implantação da agremiação.

Em outubro de 1995, foi criado o Grêmio Recreativo Bloco Carnavalesco Mancha Verde. Em 2000, passou a desfilar como escola de samba e, cinco anos depois, entrou no grupo especial. Além dos títulos de 2019 e 2022, também teve três quartos lugares (2010, 2011 e 2012), um terceiro em (2018) e um vice-campeonato, em 2020.

Troféu foi recebido com festa na quadra

O troféu da campeã chegou à quadra da escola, na Barra Funda, às 19h20, e foi recebido com sinalizadores verdes acesos pela torcida dentro do galpão. “É sempre uma grande emoção. Nossa comunidade trabalha muito, é muita dedicação”, diz Raquel Lima, de 45 anos, que desfilou no abre-alas da escola. Ela está desde 2004 na Mancha Verde.

“A gente passou uma situação muito complicada antes da linha amarela, e superar isso na pista, chegando a ser campeão do carnaval, é surreal, é demais”, diz Vanessa Oliveira, de 38 anos. Na escola há 14 anos, ela é coordenadora das passistas e faz parte da diretoria da escola. “A gente estava acreditando. Mas como houve o problema, a gente estava com medo de perder nota em Alegoria”, diz ela, que acredita que esse foi o carnaval da superação.

Apuração acirrada no Grupo Especial; Estrela do 3º Milênio e Independente Tricolor sobem

A vitória da Mancha foi definida pelos critérios de desempate. A Mocidade terminou em segundo lugar; a Império, em terceiro; e a Tom Maior, na quarta colocação. Com 269,1 pontos, Vai-Vai e Colorado do Brás terminaram nas duas últimas colocações.

Integrantes da tradicional escola do Bixiga saíram do sambódromo logo após a confirmação do rebaixamento. Fundado em 1930, o Vai-Vai é o maior campeão do carnaval paulistano, com 15 títulos, e havia acabado de voltar do grupo de acesso após uma crise interna e financeira. No enredo de 2022, falava justamente sobre a necessidade de voltar às origens, com base da simbologia da ave sagrada “sanfoka”, de origem africana.

Já a Colorado do Brás começou a apuração com 0,5 ponto a menos, por ter sofrido uma punição por exibir a imagem de uma marca de roupa na fantasia de um componente, o que foi avaliado como “merchandising” em reunião na segunda-feira, 25, da Liga Independente das Escolas de Samba de São Paulo (Liga-SP). A Acadêmicos do Tatuapé também foi punida por ter utilizado maquinário para empurrar um carro alegórico que teve problemas técnicos, mas conseguiu evitar o rebaixamento, ficando em 12º entre as 14 agremiações.

A apuração começou pouco após as 16h20 e só terminou duas horas depois. “Com todos obstáculos e adiamentos, apresentamos um espetáculo maravilhoso”, disse a todos o presidente da Liga-SP, Sidnei Carriuolo. Antes da leitura das notas, foi feito um minuto de silêncio em memórias às vítimas da covid-19 nas escolas, seguido de palmas.

O regulamento previa notas de 9,0 a 10,0, com uma escala decimal após a vírgula. As notas foram apresentadas na seguinte ordem: harmonia, mestre-sala e porta-bandeira, enredo, evolução, bateria, fantasia, alegoria, samba-enredo e comissão de frente. As notas da comissão de frente serviram como critério de desempate. Ao todo, cada quesito foi avaliado por quatro jurados, com o descarte da menor nota em cada categoria.

Na apuração do Grupo de Acesso I, a Estrela do Terceiro Milênio foi a campeã, com a Independente Tricolor (ligada à torcida do São Paulo) em segundo lugar. Ambas tiveram nota máxima (270 pontos) e desfilarão pelo Grupo Especial no próximo carnaval, enquanto a Leandro de Itaquera foi rebaixada (com 268,4 pontos). A Estrela do Terceiro Milênio desfilou com “Ô, abre-alas que elas vão passar.” Já a Independente desfilou com o enredo “Brava gente é hora de acordar”.

Apesar de algumas terem atrasado o início a entrada na pista e enfrentado problemas técnicos, todas as 14 escolas do grupo especial desfilaram dentro do tempo máximo, de 65 minutos. Neste ano, ainda estavam em vigor algumas regras de transição para a pandemia, como a redução para quatro (em vez de cinco) carros alegóricos e de cerca de 25% no máximo de componentes.

Segundo a São Paulo Turismo (SPTuris), ligada à Prefeitura, 64 mil pessoas assistiram aos desfiles do Grupo Especial, 29 mil na sexta-feira, 22, e 35 mil no sábado, 23.

Desfile das campeãs é nesta sexta-feira

O desfile das campeãs está marcado para a noite desta sexta-feira, 29, com as cinco primeiras colocadas do Grupo Especial, a campeã e a vice-campeã do Grupo de Acesso I e a primeira colocada do Grupo de Acesso II.

As entradas individuais custam de R$ 70 (arquibancada A, E e F) a R$ 400 (camarote) e estão à venda no site Clube do Ingresso (clubedoingresso.com) e nas bilheterias do Anhembi, no portão 1, diariamente, das 12 às 20 horas.

Veja abaixo a classificação geral do Grupo Especial das escolas de samba do carnaval de SP 2022:

1º – Mancha Verde (269,9)

2º – Mocidade Alegre (269,9)

3º – Império de Casa Verde (269,9)

4º – Tom Maior (269,9)

5º – Unidos de Vila Maria (269,8)

6º – Águia de Ouro (269,8)

7º – Dragões da Real (269,6)

8º – Gaviões de Fiel (269,5)

9º – Rosas de Ouro (269,5)

10º – Barroca Zona Sul (269,5)

11º – Acadêmicos do Tucuruvi (269,4)

12º – Acadêmicos do Tatuapé (269,3)

13º – Colorado do Brás (269,1)

14º – Vai-Vai (269,1)