21/05/2022 - 8:30
Quem nunca ouviu que a educação é capaz de mudar o mundo? No Brasil, a frase mais parece chavão, clichê, especialmente em ano eleitoral, quando as promessas de priorizar o ensino passam a fazer parte dos discursos políticos. Mas não para a professora pública Rosângela Moura, que resolveu colocar a máxima em prática ensinando português de graça a imigrantes venezuelanos. Isso em plena pandemia, sem estrutura e de forma online.
O projeto Esperança Venezuela surgiu bem antes da chegada do novo coronavírus ao Brasil. Coordenadora do Centro de Ensino de Línguas (CEL) de Osasco, do governo do Estado, Rosângela, que é formada em Letras pela USP, passou a debater a crise venezuelana de 2018 com os alunos durante as aulas de espanhol. Já naquele ano, eles resolveram arrecadar donativos aos refugiados que chegavam a São Paulo.
“Os próprios alunos começaram a pensar em como ajudar, apesar de eles próprios serem de famílias carentes. Eu levei o que conseguimos juntar em roupas, bilhetes de metrô e alimentos para a Casa do Migrante da Missão Paz, em São Paulo, e lá percebi que eles precisavam de muito mais”, contou.
Depois de alguns anos, em plena pandemia, a professora decidiu ajudar com o que mais sabe fazer: ensinar. “Para quem muda de País o idioma faz toda a diferença. Sem conseguir pronunciar o português fica difícil procurar emprego ou entender como se tirar documentos, por exemplo. É difícil para eles palavras com acento circunflexo, como avô, e também com ‘lh’”, disse.
Determinada, Rosângela montou um currículo e foi atrás dos alunos por meio de uma página no Facebook. “Entrei nos grupos (de refugiados) e alertei sobre o curso que seria dado pelo google meet. Pensei que iria aparecer uns 30 e pronto. Mas vieram 100, 200, 500. De repente, numa única noite, tinham 600 interessados. Fiquei surpresa e preocupada porque não sabia como iria dar aulas para tanta gente”, lembrou.
ADESÃO
A solução foi buscar ajuda e ali mesmo, no CEL. Eva Cristina Esteves e Daniela Cavalcanti, também professoras estaduais, aceitaram o convite e o trio então se dividiu para atender inicialmente quatro turmas, de cem alunos cada – quantidade máxima permitida pelo sistema online.
“E foi aí que descobrimos as outras tantas dificuldades. Tinha gente com problema de conexão para assistir às aulas, outros com urgência em aprender determinado vocabulário para trabalhar ou ainda em busca de ajuda para traduzir um currículo. Cheguei a ensinar receita de bolo para uma venezuelana com entrevista marcada em uma doceria.”
O curso foi montado com 15 aulas de 1 hora e 2o minutos cada. O foco foi ensinar em grupo o básico de gramática e, especialmente, de pronúncia. Dúvidas individuais eram atendidas pelo WhatsApp. “Não pudemos avançar muito porque nos faltava recursos e mais gente para assumir esse compromisso.”
Ainda assim, Rosângela conseguiu abrir outras três turmas, alcançado 650 alunos no total. “Ao final do curso, o que nós percebemos é que, com ajuda, eles melhoraram muito rápido a pronúncia e passaram a se sentir mais seguros para conversar e procurar emprego. Já a gente aprendeu muito também, como se colocar no lugar o outro. A educação faz isso.”
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.