03/04/2023 - 19:08
(Reuters) – O governo anunciará uma nova rodada de medidas que podem gerar incremento anual superior a 100 bilhões de reais aos cofres federais, informou nesta segunda-feira o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, citando a restrição de um benefício fiscal dado a empresas, além de tributação das apostas esportivas online e das vendas de comércio eletrônico que classificou como contrabando.
Na medida de maior impacto, de 85 a 90 bilhões de reais por ano, o governo vai ao Supremo Tribunal Federal para tentar restringir o uso por empresas de benefícios tributários concedidos pelos Estados em estratégia para que achatar a base de cálculo do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). O objetivo é fazer com que esse incentivo só beneficie investimentos feitos pelas companhias, não incluindo despesas de custeio.
“Quando esse conceito fica em torno de custeio, qual é o sentido de uma empresa que está lucrando mais por conta de um benefício fiscal do Estado abater da sua base de cálculo dois tributos federais, não tem a menor lógica. Nós vamos restringir ao conceito de investimento”, afirmou em entrevista à GloboNews.
A segunda medida, já comentada anteriormente por Haddad, vai regulamentar sites de apostas esportivas, que são autorizados a funcionar no país, mas não são tributados. Segundo ele, a estimativa de impacto anual da iniciativa subiu de 6 bilhões de reais para algo entre 12 e 15 bilhões de reais.
Na terceira frente, o governo deve atacar a compra pela internet de produtos importados que acabam chegando ao país sem a devida tributação. A iniciativa é planejada em meio a reclamações de varejistas locais como o que chamam de concorrência desleal de empresas como AliExpress, Shein e Shopee.
Nessa área, o ministro projeta que o governo perca anualmente entre 7 e 8 bilhões de reais com o que chamou de contrabando.
“Uma empresa que tem comércio eletrônico, escamoteia aquele comércio eletrônico e faz passar por uma remessa de pessoa a pessoa para não pagar impostos… As empresas brasileiras e estrangeiras que estão sofrendo a concorrência desleal de um ou dois players mundiais estão pedindo providências à Receita”, disse, sem mencionar nomes das companhias.
O ministro não definiu prazo para apresentação das propostas. Segundo ele, a pasta ainda tem outras três medidas para lançar, mas deve aguardar o andamento da reforma tributária para que elas sejam mais bem calibradas.
Duas fontes com conhecimento do assunto afirmaram à Reuters que a pasta quer fechar o cerco a empresas exportadoras que usam offshores para reduzir o pagamento de tributos.
Em outro ponto, segundo as fontes, o governo avalia passar a fazer cobrança periódica de Imposto de Renda, por meio do chamado come-cotas, de fundos exclusivos de investimento, que hoje pagam o tributo apenas no momento resgate.
Na entrevista, Haddad disse que a reforma tributária buscará “cobrar de quem não paga” impostos, o que deve elevar a receita e contribuir para o cumprimento dos objetivos fiscais previstos no novo arcabouço recém-apresentado pelo governo.
O ministro disse que, para o país ficar completamente adequado ao proposto pelo arcabouço fiscal, seria necessário um incremento de receita entre 110 bilhões e 150 bilhões de reais.
“Qualquer que seja o parâmetro do arcabouço para o ano que vem, (com um aumento de receita) entre 110 bilhões e 150 bilhões de reais, isso é zero déficit”, afirmou o ministro.
Segundo Haddad, a reforma tributária também deve contribuir para o aumento da arrecadação, na medida em que o Imposto Sobre Valor Agregado (IVA) proposto pelo governo seria “muito mais à prova de sonegação” do que os impostos como estão organizados atualmente.
O ministro argumentou ainda que, por conta disso, a reforma tributária pode permitir a redução de impostos sobre consumo –que, segundo ele, são “muito altos” no Brasil– num prazo mais longo.
BANCO CENTRAL
Haddad disse na entrevista não ter conhecimento de uma decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre suas indicações para a diretoria do BC.
“Eu mandei cinco nomes para o presidente Lula, e não tive uma reunião com ele depois para saber se ele tomou uma decisão a respeito… Eu não tive, da parte do presidente, uma sinalização do tipo ‘convida ciclano e beltrano'”, afirmou Haddad.
No mês passado, três fontes com conhecimento do assunto haviam dito à Reuters que Lula aprovara as indicações de Rodolfo Fróes para o cargo de diretor de Política Monetária do Banco Central e de Rodrigo Monteiro para a área de Fiscalização da autarquia. Num geral, os nomes foram recebidos de forma positiva pelos mercados financeiros e por servidores do BC.
Segundo Haddad, Lula comentou com algumas pessoas próximas que gostou de alguns dos nomes indicados por Haddad, mas o presidente não disse ao chefe da Fazenda quais dos cinco sugeridos foram os preferidos.
O ministro também aproveitou a entrevista para voltar a criticar a condução da política monetária por parte do Banco Central, defendendo que não faz sentido manter a taxa básica de juros próxima ao patamar de 14%. A taxa básica de juros Selic está inalterada em 13,75% ao ano desde setembro de 2022.
Haddad voltou a dizer que enxerga espaço para corte de juros no Brasil, em parte via aumento da credibilidade fiscal com a apresentação do novo arcabouço.
Nesta segunda-feira, Haddad e o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, tiveram a primeira reunião oficial desde que a proposta de novo arcabouço fiscal foi apresentada pelo governo.
(Luana Maria Benedito, Bernardo Caram e Marcela Ayres)