Com os trabalhos voltados ao entorno do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do 8 de Janeiro aprovou nesta quinta, 24, a quebra dos sigilos bancário e fiscal da deputada Carla Zambelli (PL-SP) e do hacker Walter Delgatti Neto. Preso no início de agosto, Delgatti implicou Bolsonaro e Zambelli em tentativa de invasão do sistema das urnas eletrônicas e, em depoimento à própria CPMI, na semana passada, ampliou as suspeitas do envolvimento do ex-presidente em uma ação golpista.

Os integrantes da comissão decidiram, ainda, reconvocar o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, o tenente-coronel Mauro Cid, e aprovar a convocação do assessor do ex-presidente, o segundo-tenente Osmar Crivelatti. Em julho, Cid compareceu à CPMI e permaneceu calado – não respondeu nem mesmo quantos anos tem. Ontem, o militar repetiu a estratégia em outro colegiado, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Atos Antidemocráticos, instalada na Câmara Legislativa do Distrito Federal para apurar os atos golpistas em Brasília.

Os requerimentos da CPMI relativos a aliados de Bolsonaro foram aprovados em bloco. Durante sessão, o presidente do colegiado, deputado Arthur Maia (União Brasil-BA), propôs a que a leitura do relatório final da CPMI seja feita no dia 17 de outubro.

Arrependimento

Após a aprovação dos requerimentos, o colegiado ouviu mais um nome ligado ao ex-presidente. O sargento do Exército Luís Marcos dos Reis, ex-assessor de Bolsonaro, disse que participou dos ataques às sedes dos três Poderes, mas se arrepende. Afirmou, ainda, que não havia nenhum tipo de segurança impedindo a entrada dos radicais nos prédios públicos. “Eu subi a rampa (do Congresso), estava cheio de gente ali, tirei a foto e fui embora para casa”, declarou o militar aos parlamentares da comissão.

Reis é suspeito de pagar as contas da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro com dinheiro repassado por uma empresa de material de construção que tinha contratos com o governo Bolsonaro. Questionado sobre o assunto, o sargento optou pelo direito ao silêncio, sob a justificativa de que a sua versão foi dada em depoimento à Polícia Federal.

“Existe muita confusão nesse emaranhado de transações financeiras”, afirmou a relatora do colegiado, senadora Eliziane Gama (PSD-MA). Segundo ela, a comissão busca saber a origem do dinheiro que ajudou a financiar o 8 de Janeiro.

Operação Venire

Reis está preso desde maio por suspeita de participação no esquema de fraudes nas carteiras de vacinação de Bolsonaro – Cid foi detido na mesma operação. Como mostrou o Estadão, o sargento movimentou R$ 3,3 milhões em suas contas e repassou parte do dinheiro para Mauro Cid, no que foi identificado pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) como movimentações atípicas. O militar recebia R$ 13 mil por mês. O sargento justificou as movimentações em suas contas como parte de um “consórcio”.

Na Câmara Legislativa do Distrito Federal, Mauro Cid disse que, por orientação de sua defesa, faria uso do direito constitucional de silêncio. O depoimento do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro foi o primeiro sob a condução do advogado Cezar Bitencourt.

Na semana passada, o defensor afirmou que seu cliente confessaria a participação no esquema suspeito de desvio e venda ilegal de joias recebidas por Bolsonaro como presidente da República. Depois, no entanto, o advogado mudou de versão. “Eu vou dar 20 ou 30 versões, posso dizer o que quiser”, declarou Bitencourt em entrevista ao Estadão.

Atribuições

Antes de anunciar que permaneceria em silêncio, Cid leu um breve discurso aos deputados. Afirmou que não foi nomeado ajudante de ordens de Bolsonaro por motivos políticos. Disse também que, entre as funções do seu cargo, está a recepção de correspondências recebidas pelo presidente da República. “Não questionávamos o que era tratado nas respectivas agendas e reuniões. Não estava na minha esfera analisar propostas de apoiadores”, declarou o tenente-coronel.