05/02/2024 - 15:54
O número de empresas que entraram com pedidos de recuperação judicial bateu recorde histórico em 2023. Segundo o Indicador de Falência e Recuperação Judicial da Serasa Experian, a Justiça recebeu 1.405 solicitações do tipo no ano passado, o índice mais alto desde o início da série histórica, em 2005. O número representa uma alta de 68,7% na quantidade pedidos em comparação a 2022.
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“Em 2023, testemunhamos um surpreendente aumento no índice de recuperações judiciais no Brasil, ultrapassando o patamar de 1.400 pedidos, assim como os anos de 2017 (1.420) e 2018 (1.408)”, comenta o economista da Serasa Experian, Luiz Rabi.
“O ano passado foi marcado por um recorde de inadimplência das empresas, influenciando significativamente o panorama da recuperação judicial. Embora os sinais de melhoria tenham começado a surgir, como a queda da inflação e das taxas de juros, a reação no cenário de recuperação judicial mostra-se mais lenta”, acrescenta.
O mês com maior concentração de pedidos de recuperação judicial foi novembro. Se no décimo primeiro mês de 2022 foram protocolados 59 pedidos, em novembro do ano passado foram 175. Confira o gráfico a seguir:
Pedidos de recuperação judicial por setor
O setor de serviços foi o que registrou a maior parte dos requerimentos de recuperação judicial em 2023, com 651 pedidos. O setor de Comércio vem na sequência, com 379 solicitações. A Indústria registrou 254 protocolos, enquanto no setor primário foram 121 empresas que entraram com a solicitação à Justiça. Abaixo, o gráfico com os números por setor:
Já em relação aos portes, as “micro e pequenas empresas” (MPEs) foram as que mais demandaram por recuperação judicial, com 939 pedidos. Em seguida, estavam os “médios negócios” (331) e os “grandes” (135).
O Indicador Serasa Experian de Falências e Recuperações Judiciais é construído a partir do levantamento mensal das estatísticas de falências (requeridas e decretadas) e das recuperações judiciais e extrajudiciais registradas mensalmente na base de dados da Serasa Experian, provenientes dos fóruns, varas de falências e dos Diários Oficiais e da Justiça dos estados. O indicador é segmentado por porte.
Solicitação de falências fecha o ano com alta de 13,5%
Os pedidos de falências também tiveram alta em 2023: foram 983 pedidos ante 866 registrados em 2022, um aumento de 13,5%. Foram as “micro e pequenas empresas” que puxaram a alta (546), seguidas pelas “médias” (231) e pelas grandes companhias (206). O setor que mais demandou pelos pedidos foi o de “Serviços” (373), seguido por “Indústria” (311), “Comércio” (292) e “Primário” (7).
A seguir, confira o gráfico com todas as informações na íntegra:
Pedidos de recuperação judicial devem continuar subindo
O número de pedidos de recuperação judicial deve continuar em nível elevado, com a possibilidade de bater novos recordes no início de 2024. A previsão é da Siegen Consultoria, especializada em recuperação de empresas, que com base em experiência de mais de 300 projetos realizados com companhias de vários setores considera que a tendência para 2024 é de um número expressivo de pedidos, em que pese uma provável melhora do cenário econômico.
“A tendência é que tenhamos em 2024 o mesmo volume do 2º. semestre deste ano”, afirma o CEO da Siegen, Fabio Astrauskas.
O executivo atribui os seguidos recordes no volume de solicitações de recuperação em 2023 a quatro principais fatores: baixo crescimento da atividade econômica; queda na margem de contribuição (valor do preço de venda menos os custos e despesas variáveis) por conta do aumento da MP sem repasse total para o preço final; aumento dos custos fixos, incluindo com Pessoal, pelos dissídios coletivos expressivos acumulados em 2021 e 2022; e crescimento das despesas financeiras, pelo aumento da taxa de juros a partir de 2022.
Por que os pedidos de recuperação judicial subiram em 2023?
Para o sócio sênior da OLR Advogados, Wesley Garcia de Oliveira Rodrigues, a pandemia, o efeito da recuperação judicial da gigante varejista Americanas, e a desmistificação do processo contribuíram para o aumento vertiginoso dos pedidos. A OLR Advogados é um escritório especializado na reestruturação financeira de empresas.
“Muitas empresas que atravessaram os anos de 2020 a 2022 acumularam prejuízos consideráveis e, para se manterem ativas, buscaram alavancagem no mercado financeiro – com juros altíssimos, para honrar as dívidas contraídas em razão da Covid 19”, explica.
Ainda segundo o advogado, o efeito da Recuperação Judicial das lojas “Americanas” levou o mercado financeiro a restringir ainda mais a concessão de crédito, por força do default que as instituições absorveram naquele processo, ainda, em razão da desconfiança que foi gerada no mercado na medida que as empresas apresentavam balanços aos bancos que não refletiam a realidade das Companhias.
“Atualmente, o Mercado Financeiro se encontra bastante retraído, exigindo garantias reais para fomentar as empresas na concessão de dinheiro novo, e também nas renovações de crédito anteriormente concedidos”, lembra.
Para Rodrigues, tal fator gera um efeito nefasto nas empresas, pois, muitas delas passaram a trabalhar com dinheiro de terceiros: bancos, e na medida que suas linhas não foram renovadas/concedidas, outra alternativa restou foi pedido de recuperação judicial como forma de sobrevida.
Outro fator importante citado pelo especialista é de que a Recuperação Judicial no Brasil não foi banalizada, mas sim desmistificada.
“Anteriormente, muitos empresários traziam consigo a ideia de que pedir recuperação é entrar com a falência. Com o acesso a informação, principalmente de casos de notoriedade, os empresários passaram a consultar escritórios especializados e, então, entenderam que a Recuperação Judicial, se usada corretamente e com boa-fé, possibilita a superação da crise transitória”, continua.
No entanto, ele ressalta que o empresário tem que ter em mente que mudanças na gestão devem ser realizadas no imediato pedido, não adianta permanecer ‘blindado’ por um período se não promover readequação administrativa, corte de despesas desnecessárias, melhoria nos processos industriais e de vendas e, principalmente, reduzir despesas financeiras (caso o empresário não tenha essa mentalidade, ele pode até aprovar o plano de recuperação judicial, porém não vai conseguir cumprir).
“Isso explica o alto índice de empresas que pedem recuperação e não saem do outro lado; não adianta seguir no mais do mesmo”, aponta o advogado.
Questionado sobre o alto percentual de empresas do setor de serviços solicitando recuperação judicial, Rodrigues explica que a principal causa é a alavancagem de passivo em empresas nas empresas que se alocam nesse setor.
“Há uma rotatividade acentuada de funcionários nessas empresas e, todos ajuízam ação requerendo sempre ‘algo a mais’ daquilo que teriam direito, se pode considerar que houve uma singela mudança na mentalidade da justiça laboral em não mais condenar em pedidos absurdos, em alguns casos, até condenando Advogados que formulavam as petições iniciais por litigância de má-fé”, complementa.