07/06/2024 - 16:50
Desde que a sociedade se organizou em clusters, a música passou a ser usada como forma de moldar e dar sentido às emoções. Foi assim na explosão da beatlemania, no Reino Unido, até os festivais de MPB na antiga TV Excelsior, passando pelas febres das boybands norte-americanas e, mais recentemente, o K-pop. E o que todas essas eras da música têm em comum? Uma imensidão de fãs que desejam ter uma experiência única com seus ídolos. E onde há pessoas, existe potencial de mercado.
Na era de valorização das experiências dos consumidores, os festivais e mega shows se tornaram oportunidades de fortalecimento e conexão entre empresas e o público, que no último ano lotou diversos espaços para assistir desde Billie Eilish até Paul McCartney.
• No período, foram realizados 298 festivais, crescimento de 138% sobre 2022, de acordo com a pesquisa Mapa dos Festivais: Panorama 2023.
• Os patrocínios também são atrações à parte. São investimentos de até R$ 5 bilhões anualmente, segundo estimativa da Associação Patrocínio Brasil (APBR).
• Com expectativa de incremento de até 12% na receita em todo mercado em 2024, os festivais estão ganhando cada vez mais destaque no palco das marcas e se aproximando dos esportes, mercado tradicionalmente conhecido por levar a maior fatia de investimentos de publicidade — atualmente na cada R$ 12 bilhões anuais.
No line-up do Grupo Heineken, as principais atrações vão além dos grandes eventos esportivos, como a Champions League. No Brasil, a cervejaria tem investido em festivais e grandes shows. Na estreia do The Town no ano passado, a empresa estava lá. Na passagem de Paul McCartney, também. E, em maio deste ano, uma long neck da Heineken foi parar nas mãos da Madonna durante show em Copacabana, no Rio de Janeiro, assistido por 1,6 milhão de pessoas na praia e outras milhões pela televisão.
Uma espécie de reedição da histórica apresentação de Freddie Mercury no Rock’n Rio de 1985, em que uma garrafinha de Heineken em cima do piano dele recebeu tanta atenção quanto o cantor. Para Adauto Gudin, presidente da APBR, a companhia de origem holandesa, que tem no Brasil seu principal mercado global, é um dos grandes patrocinadores em alta do segmento. “A Heineken se tornou uma das cervejarias mais faladas do mundo, pois sabe quando e como ativar seus produtos”, afirmou.
Com 22 marcas de cerveja e seis bebidas não alcoólicas no cardápio, a cervejaria traça estratégias para definir quais serão seus feats (expressão usada para parcerias musicais) de patrocínios. A Eisenbahn, marca premium do grupo, realizou o seu primeiro patrocínio de show internacional no ano passado, com a turnê de Paul McCartney. À DINHEIRO, Anna Luisa Dafico, gerente de marketing da Eisenbahn, afirmou que “levar o produto para as ocasiões que conversam com seus consumidores é essencial”. Para este ano, a marca fechou contratos com as turnês de Iron Maiden e de Eric Clapton no Brasil, que ocorrerão no segundo semestre.
Quando o assunto é show, as estreias de artistas em solo brasileiro são sempre muito aguardadas. Foi o que aconteceu com a cantora Billie Eilish e o trio Blink-182, que se apresentaram pela primeira vez no Lollapalooza, em 2023 e 2024, respectivamente. Acompanhando esses momentos inéditos estava a Vivo.
Para Marina Daineze, diretora de marca e comunicação da operadora de telefonia, os eventos são formas de amplificar temas de diversidade e inclusão e alcançar diversos públicos distintos. “É a oportunidade de criar conversas fora do contexto publicitário, reforçar que somos uma marca de tecnologia e gerar experiências memoráveis”, disse à DINHEIRO.
EXPERIÊNCIAS
Depois do período de isolamento social, causado pela pandemia, e com a pulverização da audiência nas redes sociais, as empresas querem mais do colocar sua marca em um local de destaque nos eventos. Elas desejam fazer parte dos espetáculos por meio de experiências aos fãs. Essa é a proposta do Grupo Heineken e da Vivo para a 21ª edição do João Rock, um dos principais festivais de música do País, realizado no sábado (8), em Ribeirão Preto, no interior de São Paulo.
As novas patrocinadoras se somam a outras 15 marcas, como Banco do Brasil e Coca-Cola, que apresentarão pista de skate, roda-gigante e karaokê. Segundo Marcelo Rocci, um dos organizadores do João Rock, é o recorde de patrocínios do festival, com crescimento dos investimentos de marcas de 20% em relação ao último ano. “Além de parcerias duradouras, fechamos novos acordos com empresas que conectam seus produtos à experiência do evento”, disse.
Diante do crescimento exponencial de festivais no País — só em 2023 foram 71 novos eventos —, como permanecer em destaque no palco das marcas? Para Rocci, o segredo é a capacidade de se reinventar, desde palcos, line-ups até em medidas de organização e segurança, que garantem experiências e oportunidades para os patrocinadores brilharem.
Na edição deste ano, são 30 atrações, que incluem artistas consagrados, como Djavan e Lulu Santos, e novos nomes do rock, rap, reggae e MPB. Com ingressos esgotados, o festival deve reunir 70 mil pessoas.
“Os shows são estratégicos para conectar a marca e seus produtos ao público-alvo.”
Anna Luisa Dafico gerente de marketing da Eisenbahn
Quanto vale entrar para história? A vinda da rainha do pop, Madonna, ao Brasil, em maio deste ano, certamente será lembrada por muitas gerações e, ao lado dela, estava também o Itaú. Se as marcas acompanhavam o ritmo dos grandes espetáculos apenas como patrocinadoras, o Itaú inovou. Em celebração aos seus 100 anos, a instituição apresentou, de forma gratuita, o show de encerramento da turnê da artista. No total, foram investidos R$ 60 milhões, valor dividido entre o banco, a Heineken, Prefeitura e Governo do Estado do Rio de Janeiro.
Apesar do sucesso e impactos positivos para o banco, o presidente da ABPR ponderou que o patrocínio nessas proporções não será repetido tão cedo. “Não é uma tendência. Foi um investimento especial para comemorar o centenário da empresa. O Itaú já era conhecido como grande player de patrocínios no País”, afirmou.
Para o publicitário, o futuro dos festivais e shows é apostar na diversificação de gêneros, artistas e espaços — fora das capitais, inclusive. Para os patrocinadores, o topo das paradas será promover ainda mais experiências por meio de ativações durante os shows, abrindo portas para diferentes perfis de empresas, muito além dos setores de bebidas e alimentação.
Um exemplo disso é o patrocínio da seguradora Prudential ao Rock In Rio 2024. A edição histórica que marca os 40 anos do maior festival de música do Brasil não contará apenas com estrelas no palco — como Katy Perry, que retorna ao País depois de seis anos —, mas também no line-up de patrocinadores.
Já são 11 marcas, como Ipiranga, Volkswagen e Seara. Portanto, os investimentos de empresas em festivais e shows refletem um novo momento desse mercado. Assim como canta Ivan Lins, “um novo tempo, apesar dos perigos, de tantos castigos, estamos crescidos, estamos atentos, estamos mais vivos”. Para sobreviver e, claro, viver experiências.