Após tocar o nível de R$ 5,48 no início da tarde, o dólar à vista desacelerou bastante o ritmo de alta na última hora de negociação e encerrou a sessão desta quarta-feira, 19, cotado a R$ 5,4418, avanço de 0,14%. Foi o quarto pregão seguido de valorização da moeda americana, que já acumula ganhos de 1,11% na semana e de 3,64% em junho. Sem a referência do mercado de Treasuries, fechados em razão de feriado nos EUA, os negócios no mercado de câmbio local foram guiados pelas expectativas em torno da decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) após o fechamento do mercado.

Os momentos de maior estresse, quando o dólar registrou máxima a R$ 5,4827, foram atribuídos ao receio de dissenso no comitê, com possibilidade de os diretores indicados pelo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, optarem por nova queda da taxa básica. Em maio, os diretores antigos, que formam um grupo apelidado de “G5”, foram vitoriosos ao votar por redução de 0,25 ponto, enquanto a ala mais nova, que assumiu no atual governo, preferiu corte de 0,50 ponto.

Já o alívio no fim do pregão veio com a circulação de informação da colunista da GloboNews Ana Flor de que a expectativa do Palácio do Planalto é por uma decisão unânime (9 x 0) por manutenção da taxa básica em 10,50% ao ano, como havia sido adiantado na terça pela Coluna do Estadão. Um alinhamento entre diretores antigos e novos reforçaria a autonomia da gestão da política monetária.

Analistas argumentam que, à luz das declarações de terça de Lula de que o próximo presidente do BC não vai se submeter ao mercado e buscar também o crescimento econômico, uma divisão será vista como mais um sinal de uma política monetária mais frouxa a partir de 2025. Além da substituição do atual presidente do BC, Roberto Campos Neto, no ano que vem a maioria da diretoria será composta por nomes apontados por Lula.

A fala do presidente na terça também esquentou a temporada de especulações sobre quem será o escolhido para ocupar o BC e trouxe à baila nomes mais historicamente ligados ao PT, o que aumentou a tensão no mercado cambial. A liquidez reduzida, em razão de feriado nos EUA, contribuiu para exacerbar a volatilidade.

“O real já sofre nos últimos meses com a perda de credibilidade da política fiscal, que eleva o nosso risco em relação a outros emergentes. Isso piorou com o presidente dando sinais de que quer interferir na tomada de decisão do Banco Central”, afirma o economista-chefe da Frente Corretora, Fabrizio Velloni. “Os problemas internos hoje influenciam mais o câmbio do que a economia americana, que deus bons sinais nas últimas semanas e abriu a chance de corte de juros pelo Federal Reserve nos próximos meses”.

O real tropeça em junho apesar dos números positivos do fluxo cambial no mês, como informado à tarde. Em junho (até o dia 14), o fluxo total é positivo em US$ 6,337 bilhões, resultado de entradas líquidas de US$ 2,104 bilhões pelo canal financeiro e de US$ 4,233 bilhões no comércio exterior. No ano, até o último dia 14, o fluxo total é positivo em US$ 12,172 bilhões, graças à entrada de US$ 37,956 bilhões via comércio exterior, uma vez que houve saídas líquidas de US$ 37,956 bilhões pela conta financeira.

A alta do dólar no mês pode ser atribuída a um movimento comprador expressivo no segmento de derivativos cambiais (dólar futuro, mini contratos, cupom cambial e swaps), em meio a apostas especulativas contra o real e busca por proteção (hedge). Os investidores estrangeiros carregam posição comprada em dólar ao redor de US$ 78 bilhões, perto do pico histórico.

O economista-chefe do Banco Master, Paulo Gala, afirma que, apesar do momento bom da economia, com crescimento e inflação corrente comportada, o Brasil vive uma crise de confiança, com dúvidas sobre o futuro do arcabouço fiscal e da condução da política monetária.

“Hoje uma parte significativa da incerteza está ligada a quem será o próximo presidente do Banco Central e quais serão suas políticas. Por isso, a decisão do Copom é tão importante, pois simboliza o que poderá acontecer no futuro”, afirma Gala, em relatório. “O nível atual da Selic é excessivo, mas a forma de proceder no corte de juros e no controle da inflação é crucial. Cortar agora, com um voto dividido ou unânime, pode ter um efeito reverso, elevando mais os juros longos e desvalorizando o real”.