Eles chegaram discretos, trabalharam em silêncio e no fim produziram um documento que mais parece um libelo ufanista brasileiro. Um grupo de executivos do Foreign Agricultural Service, espécie de CIA agrícola do governo dos Estados Unidos, desembarcou no País com o objetivo de investigar o potencial de expansão do Brasil no bilionário mercado internacional de cereais. Por trás da missão, o lobby do agribusiness americano, preocupado com a rápida expansão de concorrentes brasileiros nos mercados da Ásia e da Europa. Liderados por Michael Shean, os americanos visitaram Brasília, Goiás, Mato Grosso e São Paulo, conversaram com autoridades do governo e com toda a cadeia produtiva. De volta a Washington, produziram o documento Brazil: Future Agricultural Expansion Potential Underrrated (Brasil: Potencial de Expansão Agrícola é Subestimado), ao qual DINHEIRO teve acesso com exclusividade. ?Estimativa conservadora demonstra que o Brasil poderia aumentar sua área cultivada para no mínimo 170 milhões de hectares?, registra o documento. Para se ter a dimensão dessa estimativa, basta lembrar que o Brasil tem hoje 41,8 milhões de hectares plantados, contra 85 milhões dos EUA e 80 milhões da China. Sabe-se há muito que o Brasil utiliza somente 5% de seu território na agricultura (contra 19% dos EUA), mas sempre pairou a dúvida a respeito do potencial de expansão. Hoje, a área plantada tem crescido 4% ao ano. Segundo os americanos, o Brasil tem a capacidade de quadruplicar a atual área plantada. ?Essa expansão é possível sem implicar em qualquer desmatamento da Bacia Amazônica?, ressalta o documento.

?Esse estudo deve e atrair mais investimentos estrangeiros para a agricultura brasileira?, avalia Carlos Nayro Coelho, diretor de Políticas e Acordos Comerciais do Ministério da Agricultura, responsável pelo contato com o governo americano. ?Por outro lado, despertados para o perigo do Brasil, muitos produtores americanos devem aumentar a pressão por subsídios?, acrescenta. Os EUA têm a mesma área plantada há praticamente um século. Desde então, toda a expansão do setor agrícola se dá somente nos ganhos de produtividade. De acordo com os EUA, o Brasil também está se saindo bem nessa área. Mais, está produzindo inovações tecnológicas ?revolucionárias? para aumentar a produtividade. Uma delas é criação de sementes transgênicas nacionais. Só no caso da soja, o custo de produção pode diminuir em 50%, numa economia de até US$ 50 por hectare. O relatório também cita os avanços da Embrapa no desenvolvimento de linhagens especiais de soja e milho. Em Roraima, espantam-se os americanos, já há três colheitas de soja por ano. ?Os brasileiros poderão obter a curto prazo produtividade adicional no cultivo de grãos e oleaginosas da ordem de 30% a 70%?, calculam os americanos. ?O Brasil tem capacidade de prosperar, ao contrário de seus competidores, mesmo quando em um ambiente de menores preços para commodities?. Apesar de toda a louvação em relação ao potencial brasileiro, há uma contradição aparente no estudo. ?Para que tudo isso se viabilize, é preciso que os Estados Unidos abram suas portas e removam seus subsídios?, diz Antônio de Salvo, presidente da Confederação Nacional da Agricultura.