Em janeiro de 2025, a Regulação Europeia sobre Desmatamento (EUDR) entrará plenamente em vigor. A norma estabelece regras e procedimentos com o objetivo de impedir que produtos de origem agrícola oriundos de áreas de desmatamento entrem em circulação no mercado comum europeu.

A determinação incide sobre sete setores: gado bovino, café, cacau, produtos florestais (que abrange papel, celulose e madeira), soja, óleo de palma e borracha.

O regulamento deve ser cumprido pelos importadores europeus e recai, por tabela, sobre os exportadores, e se processa por meio de procedimentos de diligência prévia, que se dividem em três momentos: provimento de informações, mensuração de risco e, uma vez detectado o risco, medidas de mitigação.

É natural que uma iniciativa que promete modificar substancialmente o ambiente de negócios entre Brasil e Europa cause apreensão nos setores exportadores nacionais. Ainda mais no caso do EUDR. A norma foi desenvolvida nas esferas das autoridades europeias, sem que houvesse um diálogo mais amplo com parceiros comerciais em fóruns multilaterais, o que resultou em alguns pontos que ainda carecem de maior clareza e entendimento.

Um exemplo: a nova legislação impede a importação de produtos originários de áreas desmatadas a partir de 2020, sem fazer distinção entre desmatamento legal ou ilegal, aspecto relevante quando se compara o Código Florestal brasileiro com o seu equivalente europeu.

No Brasil, as regras determinam que, em imóveis rurais localizados na Amazônia Legal, a reserva será de 80% da propriedade nas áreas de florestas; 35% nas de cerrado; e 20% para os imóveis em áreas de campos gerais. Nas demais regiões do país, independentemente do tipo de vegetação, a área mínima de reserva é de 20%. Já em países da EU, somente 4% das propriedades rurais precisam ser preservadas. Lembrando que, na União Europeia, as regras de preservação variam significativamente entre os países.

O EUDR levanta questões importantes e tem aspectos que ainda precisam de maior clareza. Merece ser questionado e aperfeiçoado nos organismos de comércio internacional, a fim de cumprir a sua função primeira: uma iniciativa de incentivo à economia de baixo carbono. Do contrário, há o risco de se converter numa tentativa mal disfarçada de protecionismo verde.

A nova regulação, ainda que imprecisa, teve o condão de jogar luz sobre o arcabouço institucional que rege o setor agropecuário brasileiro e mostrar que o país está apto a se adequar às exigências europeias. Além da legislação nacional, o segmento de produtos florestais, que represento, atende de forma voluntária a normas sólidas que garantem a rastreabilidade, a sustentabilidade e a conformidade de sua produção.

O Brasil é, hoje, o maior exportador de celulose do mundo. O volume, em 2023, foi recorde, chegando a 18 milhões de toneladas, com 24% desse total exportado para a União Europeia.

Desde 1994, a nossa celulose possui certificação. É possível saber a origem de cada árvore estocada nos pátios das empresas. O setor é referência global no manejo sustentável de árvores cultivadas. São plantadas, diariamente, 1,8 milhões de árvores, que se somam às espécies presentes em 6,73 milhões de hectares de área nativa conservada — uma extensão maior do que o Estado do Rio de Janeiro. Ambas as áreas contribuem para que o setor, na média, capture mais carbono da atmosfera do que o total emitido em seus processos fabris.

Há também um esforço contínuo das empresas para descarbonizar os seus sistemas de produção. Nesse sentido, destaca-se a produção de bioenergia a partir do licor preto, subproduto do cozimento da madeira para produção de celulose. Hoje, essa fonte já alimenta 86% do consumo energético das fábricas do setor.

Tais exemplos mostram que a chegada do EUDR deve ser encarada não como um entrave, mas, antes, como uma oportunidade para o segmento dos produtos florestais e o setor agropecuário nacional exportador avançarem e transformarem seus predicados em diferencial competitivo. O movimento na direção de uma economia de baixo carbono acelera. E, na busca por processos ambientalmente sustentáveis e de respeito à vida, temos, sem dúvida, soluções inovadoras e viáveis a oferecer.

* Mariana Lisbôa é Advogada, Head Global de Relações Corporativas da Suzano, Presidente da Associação Baiana das Empresas de Base Florestal (ABAF) e Diretora do Departamento de Relações Internacionais e Comércio Exterior na FIESP.