Será que eles estão com medo? Pode ser. Futuro não parece brilhante. Mas solução estaria com negacionistas climáticos autoritários? Desespero produz loucuras. E, historicamente, extrema direita cresce em meio a crises.”É essa a juventude que quer tomar o poder? Vocês não estão entendendo nada!” Essa frase clássica de Caetano Veloso não sai da minha cabeça desde que vi os resultados das eleições estaduais de Brandemburgo, realizadas no domingo, no leste da Alemanha. Mais uma vez, o partido de ultradireita Alternativa para a Alemanha (AfD), que é vigiado pelo serviço secreto interno do país por suspeita de ameaça à democracia e tem ideias abertamente xenófobas, teve muitos votos.

Eles ficaram em segundo lugar, com 29,2%, atrás do Partido Social Democrata (SPD), a sigla do chanceler federal Olaf Scholz, que obteve 30,9%. Esse resultado não é surpresa para quem acompanha a política alemã. A AfD cresce assustadoramente e a região onde eles nadam de braçadas é, justamente, o Leste, nos estados que faziam parte da antiga Alemanha Oriental comunista.

Mas um outro dado assusta e surpreende: o partido de direita radical deve boa parte do seu sucesso nessas eleições aos jovens. Sim, entre os eleitores que têm entre 16 e 24 anos, a AfD ficou com 31% dos votos. Entre os jovens com 25 a 34 anos, o partido ultradireitista ficou com 33%. Chocante.

A eleição de Brandemburgo só confirma uma tendência que já vinha sido observada. Na eleição estadual da Turíngia, no início do mês, 38% dos eleitores com idades entre 18 e 24 anos votaram na AfD. Que tal?

“O que está acontecendo? Mas por quê?” Essas perguntas rondam as conversas entre democratas do país. No domingo, após postar o gráfico com os votos dos jovens, o parlamentar pelo SPD Michael Roth escreveu no X: “Quero entender isso, mas ainda não consigo. O que está acontecendo com os jovens? Vontade de provocar? Influência familiar? Curiosidade sobre o autoritarismo? Desgosto com a liberdade e a diversidade? Sensação de sair prejudicado?” Muitos também não conseguem entender e a resposta não é simples. Talvez todas as alternativas aventadas pelo parlamentar sejam parte da resposta.

Mas o primeiro motivo que vem à mente para explicar o sucesso da AfD entre a Geração Z é o sucesso dos ultradireitistas no TikTok, um fato comprovado. Um estudo recente mostrou que a legenda é o partido alemão que faz o melhor uso da plataforma. Entre seus sucessos, estão vídeos feitos com inteligência artificial (IA), mostrando, por exemplo, jovens em mercados tradicionais do país sendo atacados por estrangeiros. Dá certo. E faz sucesso.

A AfD é um partido responsável por vários escândalos. No início do ano, a denúncia de que membros do partido teriam feito uma reunião onde planejaram um plano de deportação em massa de estrangeiros, incluindo aqueles que têm passaporte alemão. O partido também tem membros investigados por suspeita de receber dinheiro ilegal da Rússia. Mas será que os jovens sabem disso? Provavelmente não.

Medo do futuro

As redes sociais são um fator importante no crescimento da extrema direita no mundo todo, claro. Mas não o único motivo. Talvez os vídeos do TikTok sirvam ao seu propósito justamente para alimentar fantasias que se espalham (com ajuda do Whatsapp) sobre, por exemplo, estrangeiros malvados que vão roubar seus empregos e até te matar. Essa campanha é feita principalmente contra os muçulmanos.

Além disso, os jovens estão insatisfeitos. E têm motivos. Esse não é um bom momento para o país e para o mundo, com a guerra na Ucrânia, desencadeada pela invasão russa, o conflito entre Israel e o Hamas, a inflação, a tragédia climática.

Os jovens do Leste estão ainda mais frustrados, pois uma desigualdade entre Leste e o Oeste alemão ainda persiste, mais de 33 anos depois da queda do Muro de Berlim.

Será que os jovens estão com medo? Pode ser. O futuro não parece brilhante mesmo. Mas a solução seria voltar para negacionistas climáticos autoritários? Bem, o desespero produz loucuras. E, historicamente, a extrema direita cresce em meio a crises.

Talvez esses jovens estejam também se rebelando contra as antigas gerações (o que faz parte), que acreditam em coisas antigas e ultrapassadas, como, por exemplo, voto e democracia (contém ironia).

O pêndulo político, que tendia para a esquerda e o centro na Europa, agora pende para a direita radical. E, infelizmente, isso não acontece só na Alemanha e na Europa. Jair Bolsonaro, Pablo Marçal, Donald Trump e Javier Milei são também muito populares entre os jovens e estão aí para provar. Em todos esses países, eleitores jovens votam em quem consideram “outsiders da política”, como se eles fossem rebeldes “antissistema”. Votar na AfD seria uma atitude “muito louca”. Sim, eles estão brincando com a democracia.

Eu entendo que os jovens sejam niilistas de modo geral e “sigam modinhas” para se encaixar. E hoje em dia está difícil acreditar no futuro mesmo. Mas sei que a solução para os problemas do mundo não é deixar de acreditar na democracia. Cuidado, jovens, “há perigo na esquina”.

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Nina Lemos é jornalista e escritora. Escreve sobre feminismo e comportamento desde os anos 2000, quando lançou com duas amigas o grupo “02 Neurônio”. Já foi colunista da Folha de S.Paulo e do UOL. É uma das criadoras da revista TPM. Em 2015, mudou para Berlim, cidade pela qual é loucamente apaixonada. Desde então, vive entre as notícias do Brasil e as aulas de alemão.

O texto reflete a opinião da autora, não necessariamente a da DW.