Por Letícia Franco

Quando a WeWork surgiu nos Estados Unidos, em 2010, os escritórios de trabalho compartilhados – no inglês, coworkings – já existiam. Apesar de não ser uma ideia nova, o timing da empresa foi fundamental. Em meio às dificuldades da crise financeira de 2008, a WeWork apresentou ao mercado um modelo de negócios disruptivo – com muito happy hour! –, ao mesmo tempo em que se beneficiou das taxas de juros baixas e da vacância das instalações comerciais. A empresa, que agitou o setor no início da década passada, chegando a ser avaliada em US$ 47 bilhões, continua como centro das mudanças desse mercado. Mas agora de maneira negativa.

Há cinco anos, a companhia enfrenta desafios financeiros em diversos países, como o Brasil, que culminaram no pedido de recuperação judicial (Chapter 11) nos Estados Unidos, aprovado em maio deste ano. Por aqui, os problemas da WeWork, como a inadimplência dos aluguéis, tornaram-se oportunidades para suas concorrentes ampliarem os negócios. Ainda mais em um mercado que, ao contrário da companhia, apresenta crescimento. “A expectativa é de que o setor cresça a uma taxa de 17,5% ao ano até 2029”, disse à DINHEIRO Marco Crespo, COO da Woba, rede de escritórios flexíveis por assinatura.

• Se entre 2019 e 2023 a WeWork acumulou tropeços, entre eles a tentativa fracassada de Oferta Pública Inicial (IPO, na sigla em inglês) em 2019, a saída do CEO Adam Neumann e o Chapter 11, em novembro passado, o setor, ao contrário, cresceu.
• No Brasil, a quantidade de espaços de trabalho compartilhados saltou 63%, alcançando a marca de 2,4 mil coworkings, segundo o Censo do Coworking da Woba.
 A crise da WeWork no País é ainda mais evidente a partir do comunicado ao mercado de ao menos seis Fundos de Investimentos Imobiliários (FIIs) sobre a ocorrência de inadimplência referente às locações no mês de junho deste ano.

No mercado, comenta-se que a estratégia da WeWork é enxugar o tamanho e devolver parte dos seus pontos, assim como fez nos EUA, Canadá e Europa. Procurada pela reportagem, a empresa não se pronunciou.

O modelo de coworking se expande para estádios e shoppings. No detalhe, o Base Coworking, no Allianz Parque (Crédito:Divulgação)

A crise da WeWork resulta no fortalecimento dos atuais concorrentes, que estão atentos. De acordo com a plataforma Market Analytics, da SiiLA, a WeWork ocupa 28 empreendimentos só em São Paulo, sendo ao menos 70% de alto padrão. Líder mundial no segmento, o IWG (International Workplace Group), que atua no País com 82 unidades das marcas Regus, Spaces e HQ, já fechou contratos com clientes da concorrente.

Segundo Tiago Alves, CEO do IWG no Brasil, a companhia assumiu em junho um prédio da WeWork na rua Cerro Corá, na zona oeste da capital paulista. Além disso, há oito oportunidades de negociações com clientes insatisfeitos da WeWork. “Além de proprietários de espaços, tem a demanda de inquilinos, grandes empresas, que não querem atrelar sua imagem a esses problemas”, afirma. Há três décadas no País, a operação local da IWG está com planos de expansão para São Paulo e outras regiões. Estima 30 novas unidades em 2024 — número que pode aumentar a depender dos rumos da WeWork.

Quem também está ampliando suas operações nesse momento é a GoWork, fundada em 2013 na cidade de São Paulo. A empresa ganhou 33 contratos e 316 estações de trabalho da WeWork, segundo Fernando Bottura, CEO da GoWork. Hoje, a companhia possui 13 empreendimentos no total, sendo oito deles monousuário, ou seja, todos os andares são dedicados à operação da GoWork, e cinco mistos, quando aluga diversos andares em um prédio. Os empreendimentos somam 42 mil metros quadrados de área total e representam 10 mil posições de trabalho para locação. “A empresa também está orçando mais 3 mil estações de trabalho de empresas que estão em busca de um novo coworking”, disse o executivo à DINHEIRO. Com o investimento de R$ 14 milhões para a abertura de novos empreendimentos, a GoWork prevê faturar R$ 80 milhões em 2024, um aumento de 29% sobre 2023.

Tiago Alves, CEO do IWG no Brasil, destaca expansão da empresa no País e negociações com clientes da WeWork (Crédito:Raphael Monteiro)

MUDANÇAS

Trabalho presencial, híbrido ou remoto? Híbrido. É o que apontou o Panorama de Facilities 2024 da Woba. Pequenas e médias empresas (PMEs), startups, empreendedores ou grandes companhias? Embora seja para qualquer tipo de empresas, o mercado mudou.

Grandes companhias têm aderido ao coworking, como Itaú, Bradesco, Stellantis e XP, que utilizam a plataforma Woba, e IBM, Amazon e Disney, que são clientes do IWG. Bottura, CEO da GoWork, afirmou que 57% de seus clientes são grandes companhias. Todo esse movimento tem uma explicação, seja pela expansão de colaboradores em home office durante a pandemia ou pela redução de custos. De acordo com Virgilio Lage, especialista da Valor Investimentos, o coworking é uma boa opção por conta dos impostos. “O Brasil está entre os países com impostos mais caros, então esse tipo de serviço, terceirizado, pode valer mais a pena para as empresas do que começar do zero”, afirma.

Ele ainda pondera que esse é um fator positivo para o futuro do setor no País, já que, segundo ele, o formato enfrenta cinco riscos: modelo de negócios questionado, exposição à crise (como a pandemia), concorrência forte, volatilidade do comportamento corporativo e incerteza sobre o futuro.

O cenário é mais positivo do que negativo, apesar da crise de uma das gigantes do setor e dos riscos do formato. Isso porque sua expansão também tem chegado a locais além dos grandes centros empresariais, chegando até a ambientes inusitados como os estádios de futebol. Exemplos disso são o Base Coworking, no Allianz Parque, o Coworking Fiel, na Neo Química Arena, e o Cowork Arena, na Arena das Dunas, em Natal. Além de shoppings, como é o caso do Shopping Curitiba, que possui um espaço de trabalho compartilhado gratuito. Esse pode não ser o grande momento da WeWork, como em 2010, mas parece ser o do mercado de coworking.