O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou nesta quinta-feira, 16, o Projeto de Lei Complementar (PLC 68/2024) que regulamenta a reforma tributária sobre o consumo. O texto foi aprovado pela Câmara dos Deputados em 17 de dezembro e, desde então, aguardava pela sanção de Lula.

Durante a cerimônia, Lula disse que “um milagre aconteceu” no Brasil para permitir a aprovação da reforma tributária neste seu mandato.

O presidente se referiu ao fato de que, quando assumiu para seu terceiro mandato, ouvia que ele teria dificuldades para governar, diante do fato de que não teria uma maioria no Congresso e que o Legislativo tinha conseguido um controle maior sobre o Orçamento da União.

“Um milagre aconteceu no comportamento da Câmara e do Senado. Quando fui eleito em 2002, o que mais se falava era que eu não conseguiria governar o País e que não duraria um mandato sequer, porque seríamos um fracasso”, contou o presidente, relembrando de quando foi eleito pela primeira vez, em 2002. “O dado concreto é que as coisas deram certo e fui reeleito. Fui eleito por uma governança muito exitosa, por causa da equipe que tinha e do comportamento do Congresso”, completou.

“Agora, quando fui eleito (em 2022), ouvia que era impossível governar esse País no momento em que o Congresso tinha roubado o Orçamento do presidente e que a direita tinha eleito mais gente que a esquerda. Muita gente dizia que seria impossível governar e aprovar a reforma tributária, porque o governo era muito minoritário”, afirmou, elogiando que o regime democrático permitiu o diálogo e debate sobre a proposta para que ela fosse aprovada depois de décadas.

Lula disse, ainda, que “quando a gente acredita que é possível fazer alguma coisa, ela acontece” e que “para fazer coisa acontecer, precisamos ter pessoas certas”.

Texto sancionado

Entre os principais pontos da reforma estão a redução ou isenção de incidência de impostos, a devolução de tributos para consumidores de baixa renda, o chamado cashback, a compra internacional pela internet e a vinculação dos mecanismos de pagamento com sistema de arrecadação.

Os vetos ainda serão detalhados pelo governo. Segundo o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, os vetos serão divulgados na edição de sexta-feira, 17, do Diário Oficial da União. Haddad disse que os vetos são “laterais” e focaram em pontos que poderiam causar erros de interpretação.

Legado

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse durante seu discurso que a reforma tributária é o maior legado da economia a ser entregue pelo governo para a população, ainda que seus efeitos não sejam vistos de forma imediata.

Haddad disse ainda que não era possível o Brasil avançar na economia com o atual sistema tributário nacional.

Alíquota

O secretário extraordinário da Reforma Tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, afirmou nesta quinta que estimativas da pasta apontam que a alíquota padrão da nova tributação sobre consumo ficará em torno de 28%.

De acordo com o secretário, a alíquota deve ficar apenas um pouco acima do que era a do texto aprovado na Câmara dos Deputados antes de ir para o Senado.

Quando o texto da reforma foi entregue ao Congresso, em abril do ano passado, a alíquota média era estimada em 26,5%. Porém, depois de alterações aprovadas pela Câmara, as projeções subiram para 27,97%.

Aleksandros Markopoulou, advogado tributarista no Ayres Ribeiro Advogados, avalia que “o Projeto sancionado, com poucos vetos pontuais, mas que não alteram o mérito e a espinha dorsal da reforma tributária, permanece sendo muito boa para o país, pela simplificação do sistema tributário atual”. Entre as principais sanções, o advogado aponta que a manutenção do diferencial competitivo para a indústria de refino de petróleo localizada na Zona Franca de Manaus (ZFM), sobretudo para a Refinaria da Amazônia (Ream).

Markopoulou destacou, com exclusividade para o site IstoÉ Dinheiro como ficam algumas alíquotas.

Confira os principais pontos da reforma tributária:

IBS e CBC

A nova legislação promove, gradualmente, a substituição de Pis, Cofins, IOF-Seguros, IPI, ICMS e ISS por dois impostos. O IBS (Imposto Sobre Bens e Serviços, de competência compartilhada entre estados, municípios e o Distrito Federal) e a CBS (Contribuição Sobre Bens e Serviços, de competência da União). O ente federativo para cobrança será o do local de destino das operações onerosas com bens materiais e imateriais. 

As alíquotas de referência do IBS e da CBS serão previstas por Resolução do Senado Federal, sendo que os Estados e Municípios definirão as alíquotas do IBS, que deverão ser uniformes para todas as operações tributáveis. 

Estima-se que a alíquota total poderá na faixa de 28%.

Na importação, o IBS e a CBS incidirão sobre bens ou serviços, qualquer que seja sua finalidade, mediante a aplicação das regras gerais. Na exportação, não haverá incidência do IBS e da CBS.

O ressarcimento de saldos credores de IBS e CBS passam a ter prazos de 60 ou 120 dias para serem analisados. 

O Projeto de Lei trata também do IS, o Imposto Seletivo, que ficou conhecido como ‘imposto do pecado’, pois incide sobre produtos prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, como carros poluidores, cigarros, bebidas alcoólicas e açucaradas, alimentos industrializados, entre outros.

Já os medicamentos voltam à lista de itens que pagam menos impostos.

Para os regimes próprios da CBS, Markopoulou aponta que a alíquota zero se aplica a serviços de educação de ensino superior por instituição privada de ensino durante o período de adesão ao Programa Universidade para Todos (Prouni).

Não cumulatividade

O IBS e a CBS são marcados pelo princípio da não cumulatividade. As operações anteriores geram créditos a serem abatidos nas posteriores. Os tributos levam em consideração o princípio da neutralidade, pelo qual deve-se evitar distorções às decisões de consumo e organização da atividade econômica.

Os tributos incidirão sobre operações onerosas com bens materiais e imateriais, inclusive direitos, e serviços decorrentes de qualquer ato ou negócio jurídico, o que compreende o valor integral cobrado pelo fornecedor a qualquer título. 

Cesta básica

A regulamentação determina a isenção total de impostos para alimentos considerados essenciais da cesta básica nacional, casos de arroz, feijão, carnes, farinha de mandioca, farinha de trigo, açúcar, macarrão e pão comum, mandioca, inhame, batata-doce e coco, café e óleo de babaçu, manteiga, margarina, leite fluido, leite em pó e fórmulas infantis definidas por previsão legal específica, além de óleo de babaçu, grãos de milho e de aveia e diversos tipos de queijo.

Redução de alíquotas

O projeto de lei complementar também traz regimes diferenciados, com redução de alíquotas do IBS e da CBS, a profissionais intelectuais; serviços de saúde e educação; produtos de higiene pessoal utilizados por pessoas de baixa renda; serviços e operações ligados à segurança nacional, segurança da informação e da segurança cibernética; produtos agropecuários aquícolas, florestais e extrativistas; produções nacionais artísticas, culturais, entre outros.

Split payment

Essa inovação refere-se a um pagamento dividido, no qual o valor pago pelo comprador é dividido entre credores tributários (referente ao valor dos tributos) e o vendedor (que recebe o valor líquido). O lojista não precisará recolher manualmente o imposto.

Cashback

Já o cashback diz respeito à devolução de impostos recolhidos às famílias de baixa renda, cadastradas no CadÚnico, a partir de alguns requisitos. A finalidade é diminuir o efeito regressivo da tributação.

Zona Franca

Nos termos do que determina a Constituição, o PLP também assegura a manutenção do regime favorecido à Zona Franca de Manaus, além de prever tratamento diferenciado às Áreas de Livre Comércio.

Administração tributária

No que diz respeito à administração tributária, há previsão de que o Poder Executivo da União e o Comitê Gestor do IBS, respectivamente, editarão o regulamento da CBS e do IBS. As disposições comuns serão aprovadas por ato conjunto do Comitê Gestor do IBS e do Poder Executivo, devendo constar dos regulamentos dos tributos.

Tanto o Poder Executivo da União quanto o Comitê Gestor do IBS devem atuar com vistas a harmonizar as normas, interpretações e obrigações relacionadas a esses tributos, além de realizar uma avaliação quinquenal da eficiência, eficácia e efetividade dos regimes estabelecidos pelo regulamento da reforma tributária.

Regimes diferenciados

Entram como regime diferenciado de tributação, com isenção, os serviços de transporte público coletivo de passageiros rodoviário e metroviário de caráter urbano, semiurbano e metropolitano; as bagagens de viajantes e de tripulantes, acompanhadas ou desacompanhadas, e as remessas internacionais.

Com alíquota zero:

  • Dispositivos médicos;
  • Dispositivos de acessibilidade próprios para pessoas com deficiência;
  • Medicamentos;
  • Produtos de cuidados básicos à saúde menstrual;
  • Produtos hortícolas, frutas e ovos;
  • Automóveis de passageiros adquiridos por pessoas com deficiência (PCD) ou com transtorno do espectro autista;
  • Automóveis de passageiros adquiridos por motoristas profissionais que destinem o automóvel à utilização na categoria de aluguel (táxi);
  • Serviços prestados por Instituição Científica, Tecnológica e de Inovação (ICT) sem fins lucrativos.

Com redução da alíquota em 30%

  • Serviços prestados por profissionais que exercerem atividades intelectuais de natureza científica, literária ou artística, submetidas à fiscalização por conselho profissional.

Com redução da alíquota em 60%

  • Serviços de educação;
  • Serviços de saúde;
  • Dispositivos médicos;
  • Dispositivos de acessibilidade próprios para pessoas com deficiência (PCD);
  • Medicamentos;
  • Alimentos destinados ao consumo humano;
  • Produtos de higiene pessoal e limpeza majoritariamente consumidos por famílias de baixa renda;
  • Produtos agropecuários, aquícolas, pesqueiros, florestais e extrativistas vegetais in natura;
  • Insumos agropecuários e aquícolas;
  • Produções nacionais artísticas, culturais, de eventos, jornalísticas e audiovisuais;
  • Comunicação institucional;
  • Atividades desportivas;
  • Bens e serviços relacionados à soberania e à segurança nacional, à segurança da informação e à segurança cibernética; e
  • Projetos de reabilitação urbana de zonas históricas e de áreas críticas de recuperação e reconversão urbanística dos Municípios ou do Distrito Federal.

Com crédito presumido

  • Bens e serviços de produtor rural ou de produtor rural integrado, não contribuintes;
  • Serviço de transporte de carga de transportador autônomo pessoa física que não seja contribuinte;
  • Resíduos sólidos de coletores incentivados para utilização em processo de destinação final ambientalmente adequada;
  • Gradualmente definido de 2029 a 2032, chegando a 20% em 2033;
  • Aquisições, para revenda, de bem móvel usado de pessoa física que não seja contribuinte.

*com informações de Reuters