15/07/2025 - 14:10
Com a realização da COP30 marcada para 2025 em Belém do Pará, a Amazônia volta ao centro do debate internacional sobre clima e sustentabilidade. Mas o que poucos percebem é que, além de ser o maior patrimônio ambiental do planeta, a floresta amazônica pode se tornar o solo mais fértil para o surgimento de deep techs brasileiras startups baseadas em ciência de ponta com capacidade de resolver desafios complexos da humanidade.
Em pleno século XXI, mais de 90% da biodiversidade amazônica segue inexplorada do ponto de vista bioquímico. Estima-se que a floresta abriga mais de 130 mil espécies de plantas, fungos e microrganismos, sendo que apenas uma fração mínima foi estudada em laboratórios. No entanto, as poucas descobertas feitas até agora já indicam um potencial extraordinário. Compostos com propriedades anti-inflamatórias, antivirais, neuroprotetoras e antioxidantes vêm sendo identificados em espécies nativas, abrindo caminho para a criação de novos medicamentos, cosméticos e alimentos funcionais de altíssimo valor agregado.
A diferença, hoje, está na tecnologia. A combinação de inteligência artificial, sequenciamento genético, química fina, bioensaios automatizados e nanotecnologia permite que startups atuem como verdadeiras mineradoras de ativos biológicos, reduzindo o tempo e o custo entre a descoberta de uma molécula e sua aplicação prática. É justamente aí que entram as deep techs da bioeconomia amazônica.
Se o Brasil organizar um esforço coordenado de pesquisa, licenciamento e desenvolvimento industrial, especialistas projetam que só com 10% das espécies da floresta sendo mapeadas, o país poderia gerar mais de 26 mil novas patentes nos próximos anos patentes estas que podem dar origem a centenas de empresas intensivas em conhecimento, de base científica e com alto potencial de exportação tecnológica.
Enquanto isso, países como a China já estruturaram políticas públicas robustas para transformar a biodiversidade em inovação proprietária. Com apenas uma fração da riqueza biológica brasileira, o país asiático já lidera o ranking global de patentes na área de fitoterápicos e biotecnologia vegetal, com mais de 30 mil registros. O contraste com o Brasil é gritante: mesmo detendo mais de 15% da biodiversidade global, o país participa com menos de 0,5% das patentes farmacêuticas registradas no mundo.
Esse cenário de subutilização vem acompanhado de um problema silencioso: a biopirataria tecnológica. Pesquisadores e empresas estrangeiras já registraram, fora do país, mais de 2 mil patentes baseadas em compostos amazônicos, como jaborandi, andiroba e copaíba, sem repartição justa de benefícios com as comunidades tradicionais ou com o Estado brasileiro. A falta de uma infraestrutura científica sólida e de uma política estratégica de proteção intelectual contribui para que o Brasil siga exportando matéria-prima e importando ciência embalada em produtos premium.
Com a COP30 em Belém, o Brasil tem a chance de virar esse jogo. Além de atrair investimentos multilaterais para preservação ambiental, o país pode posicionar a Amazônia como o coração de um novo modelo econômico baseado em deep techs tropicais. Para isso, é necessário estruturar uma cadeia de inovação que envolva laboratórios de bioensaios, centros de química avançada, plataformas de dados genéticos e mecanismos de financiamento dedicados à propriedade intelectual.
Estudos do WRI e do CGEE apontam que a bioeconomia pode representar até 15% do PIB brasileiro nas próximas duas décadas, desde que se invista entre R$ 2 e R$ 10 bilhões em infraestrutura científica e tecnológica nos próximos 10 anos. Esses recursos podem vir tanto de fundos públicos como BNDES, FINEP, Fapesp e Fapeam quanto de capital privado nacional e internacional, por meio de fundos ESG, mecanismos de inovação aberta e parcerias com grandes indústrias dos setores farmacêutico, cosmético e alimentar.
Nesse cenário, startups deep techs brasileiras têm a oportunidade de liderar uma nova onda de industrialização verde. Empresas que dominam bioprocessos, síntese de compostos naturais, tecnologias de cultivo celular e edições genéticas de precisão poderão transformar moléculas únicas da floresta em tratamentos de última geração, alimentos regenerativos e cosméticos bioativos exportáveis. Além de gerar valor econômico, essas empresas podem cumprir um papel fundamental na preservação da floresta e no reconhecimento dos saberes ancestrais das populações amazônicas.
A Amazônia pode, sim, ser a maior plataforma de inovação profunda do planeta. Mas isso exige uma decisão política e estratégica: transformar biodiversidade em ciência, ciência em patentes e patentes em negócios que respeitem, valorizem e regenerem o bioma. Se a COP30 inaugurar esse ciclo, o Brasil poderá deixar de ser apenas o “guarda-florestal do mundo” e se tornar protagonista da maior revolução tecnológica baseada na natureza do século XXI.