28/08/2025 - 6:19
Algumas conquistas que alcancei enquanto aluno da rede pública foram subestimadas e desvalorizadas. É necessário que todo o jovem seja incentivado e não o contrário.Durante o ensino fundamental, vivenciei uma situação que permanece marcada em minha memória e que, ainda hoje, me faz refletir sobre como as palavras podem carregar significados profundos.
Em um dia comum, após receber uma prova de matemática corrigida, fiquei feliz por ter conquistado a nota máxima. Movido pelo entusiasmo de criança, compartilhei o resultado com uma pessoa que eu gostava muito esperando apenas um gesto de reconhecimento. No entanto, a resposta não foi a que imaginei.
Ela se voltou a outra estudante de escola particular e, em tom de comparação, disse: “Olha, ele tirou 10!”. A estudante, quase de imediato, retrucou: “Olha a qualidade do meu ensino comparado ao dele”. A frase, carregada de julgamento, me atingiu como um soco invisível e em segundos, aquela conquista, que antes me enchia de orgulho, transformou-se em motivo de constrangimento.
Estudantes da rede pública: subestimados
Esse episódio, apesar de simples, revela muito sobre o preconceito velado que alunos de escola pública enfrentam. Não se trata apenas de um comentário isolado, mas de um reflexo de como a sociedade, muitas vezes, enxerga a educação pública como inferior e desvaloriza os méritos daqueles que dela fazem parte.
É como se o esforço individual perdesse relevância quando colocado lado a lado com a estrutura e os recursos oferecidos por escolas privadas. O peso da desigualdade aparece não apenas nas estatísticas, mas também em situações cotidianas e silenciosas, que moldam a autoestima e a percepção de valor dos estudantes.
A experiência pessoal que vivenciei é, na verdade, a realidade de milhões de jovens brasileiros. De acordo com pesquisas educacionais, alunos da rede pública enfrentam jornadas de estudo marcadas pela falta de professores, de materiais didáticos atualizados, de infraestrutura adequada e, muitas vezes, de incentivo.
Apesar disso, alcançam conquistas significativas que deveriam ser celebradas. No entanto, como na cena que presenciei, essas vitórias frequentemente são diminuídas por comparações vindas da sociedade elitista que ignora o contexto desigual em que cada estudante está inserido.
Desigualdade educacional assume diversas formas
Mais do que falar sobre mim, este relato revela um problema maior: a desigualdade educacional no Brasil. Ela não se restringe apenas ao acesso a escolas, mas se estende à qualidade do ensino, às oportunidades de aprendizado e, principalmente, ao reconhecimento social.
Quando um estudante da rede pública alcança bons resultados, não é apenas um número em uma prova. É a prova de resiliência, dedicação e superação diante de condições adversas. Desvalorizar esse esforço significa reforçar barreiras sociais já existentes e perpetuar preconceitos que silenciam talentos.
Ao compartilhar esta história, ainda sinto o peso daquele momento e lembro como minha alegria pode ser rapidamente diminuída. É impossível não pensar em quantos outros jovens vivem situações semelhantes e sentem, assim como eu senti, que seus méritos não são reconhecidos. É isso que me faz acreditar que cada vitória, mesmo silenciosa, merece ser celebrada e valorizada.
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Vozes da Educação é uma coluna semanal escrita por jovens do Salvaguarda, programa social de voluntários que auxiliam alunos da rede pública do Brasil a entrar na universidade. Revezam-se na autoria dos textos o fundador do programa, Vinícius De Andrade, e alunos auxiliados pelo Salvaguarda em todos os estados da federação. Siga o perfil do programa no Instagram em @salvaguarda1.
Este texto foi escrito por Eduardo Ramir Camargo Roncen, de 18 anos, de Xanxerê em Santa Catarina, e reflete a opinião do autor, não necessariamente a da DW.