Jornalista judia de origem alemã Ruth Weiss, que faleceu aos 101 anos, enfrentou o apartheid tanto na África do Sul como no exílio e escreveu incansavelmente contra o ódio, a exclusão e o racismo.A Alemanha se despede da jornalista Ruth Weiss, que se tornou uma importante voz da luta contra o apartheid. Ela faleceu em 5 de setembro aos 101 anos em Aalborg, na Dinamarca, onde vivia. Seu funeral será realizado nesta segunda-feira (15/09) no cemitério judaico da cidade alemã de Münster.

Ruth Weiss conheceu bem cedo o ostracismo e a exclusão social. Ela nasceu em 1924 na família judia Löwenthal e cresceu numa pequena vila perto de Fürth, na Baviera. Ruth Löwenthal era a única criança judia na escola. Ela posteriormente descreveu sua infância como “uma época maravilhosa” – até 1933, quando o partido nazista chegou ao poder na Alemanha. Foi aí que a vida de Ruth e de sua família mudou rapidamente: o pai dela perdeu o emprego e, como judeu, não conseguia encontrar outro. Ruth passou a ser isolada pelos demais na escola.

“De um dia para o outro, eu deixei de existir para o professor. Ele parou de me questionar durante as aulas e ninguém mais brincava comigo durante o recreio. Eu carregava um álbum na mochila, e ninguém mais queria escrever algum pequeno poema nele”, lembrou em entrevista à DW.

A família Löwenthal morava perto da cidade de Nurembergue, um reduto nazista no sul da Alemanha. Hitler escolheu Nurembergue para ser a cidade dos encontros nacionais do partido, e os nazistas dominavam as ruas. Em 1935, as chamadas Leis Raciais de Nurembergue foram promulgadas. Com elas, o antissemitismo não só se tornou legal como também obrigatório. Essa foi a base legal para a perseguição aos judeus.

A África do Sul, um novo país

Ruth e a família dela fugiram para a África do Sul em 1936 num dos últimos navios. A fuga os salvou da morte sob o regime nazista, mas eles não foram bem-vindos em seu novo refúgio.

“Posso dizer que fomos de um país antissemita para um outro país antissemita. Estudei numa escola muito pobre, num bairro pobre. Eu sabia que meus colegas não me aceitavam, e que isso acontecia pelo mesmo motivo que na Alemanha”, contou.

Luta contra o apartheid

Logo ficou claro para Ruth que o novo país também excluía pessoas. Ela tinha 24 anos quando o apartheid, a opressão sistemática da maioria não branca da população, foi imposto pelo Estado na África do Sul.

“Após a Guerra, os brancos pobres, apesar da pobreza, tinham ao menos um empregado negro, que desprezavam. Isso foi o que eu, infelizmente, vivenciei desde o primeiro dia, então eu também sabia qual era minha atitude em relação a esse país.”

Ela rejeitou o apartheid, conheceu pessoas com ideias semelhantes, cultivou amizades com intelectuais negros e conheceu o futuro marido, o jornalista Hans Weiss. Sob a égide dele, deu seus primeiros passos no jornalismo.

Com o fim do casamento, ela passou a se dedicar inteiramente ao jornalismo, escrevendo sobre a opressão dos negros e a resistência deles para jornais de renome. Escrever contra o apartheid a colocou na lista negra do regime impostos pelos brancos, e as consequências foram duras.

Ruth Weiss se tornou uma voz importante na luta pela independência da África do Sul – e foi punida com a perda da sua nacionalidade: “Fui expulsa da África do Sul durante uma estada na Alemanha. Só me permitiram retornar à África do Sul por uma noite para me despedir dos meus pais, quando meu filho tinha 2 anos e meio.”

Ela passou a criar o filho sozinha e morou em vários lugares, entre eles Londres, Colônia e Harare, no atual Zimbábue. Em Colônia, trabalhou como editora-sênior para o Departamento África da DW de 1975 a 1978.

Ruth Weiss foi uma lutadora incansável contra o apartheid, o ódio, o racismo e o colonialismo. Em 2005 ela foi indicada ao Prêmio Nobel da Paz; em 2014, condecorada com a Cruz do Mérito de Primeira Classe da República Federal da Alemanha; e, em 2023, com a mais prestigiosa ordem de mérito da África do Sul, a Ordem dos Companheiros de O. R. Tambo.