Quando saíram os números de emplacamentos de outubro, divulgados pela Fenabrave (Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores), os QGs da Ford e da Hyundai reagiram de forma diferente. Os da Ford, conformados como se fossem torcedores do Atlético Mineiro. Os da Hyundai, animados como se tivessem a pontuação do Corinthians. As folhas e os sites, claro, trataram de amplificar o fato novo: a Hyundai ultrapassou a Ford. E foi isso que aconteceu, mas, como eu já comentei aqui no blog República do Automóvel, os números nem sempre contam toda a verdade.

Soube da notícia no Japão, cobrindo o Salão de Tóquio, então deixei para analisar o ranking quando voltasse de lá. De fato, com 16.496 automóveis e comerciais leves emplacados, a Hyundai ficou em quarto lugar em outubro, pois a Ford registrou apenas 16.243 veículos. A troca de posições entre os dois fabricantes aconteceu porque a Hyundai teve um acréscimo de 1.065 vendas em relação a setembro (+6,7%), enquanto a Ford perdeu 3.270 licenciamentos (-16,7%). Isso foi o resultado de um mês muito ruim para dois modelos “fordianos”: o Ka (caiu de 7.486 para 5.880) e o EcoSport (foi de 2.655 para 2.333 num mês em que o rival Duster subiu de 2.697 para 3.053). É a primeira vez, desde que a atual geração do EcoSport iniciou sua plena produção, que o modelo da Ford fica atrás do crossover da Renault no ranking da categoria.

Isso é uma tendência? A partir de agora teremos a Hyundai ocupando a posição de quarta maior montadora do Brasil? Não! O que aconteceu em outubro foi pontual. A queda do Ka ocorreu muito mais nas vendas diretas para frotistas, taxistas etc. do que nas vendas de varejo nas concessionárias. Nas vendas diretas, o Ka caiu de 3.258 em setembro para 1.899 em outubro (e o Hyundai HB20 subiu de 1.355 para 2.242). No varejo, o Ka teve uma pequena queda de 4.228 para 4.011 (o mesmo aconteceu com o HB20, que foi de 7.534 para 7.506). Portanto, a imagem do Ka continua a mesma. Segundo a Ford, houve uma diminuição da oferta da linha Ka em outubro “em razão da transição da linha 2015 para o ano-modelo 2016, com aprimoramentos de equipamentos, ocasionando intervalo de produção, além de férias coletivas para os empregados de Camaçari”. A paralisação da produção ocorreu entre os dias 14 de setembro e 2 de outubro e afetou também a linha EcoSport.

Agora em terceiro lugar no ranking dos crossovers/SUVs, atrás do Honda HR-V (38.631 vendas acumuladas) e do Renault Duster (28.724), o Ford EcoSport (28.689) tem ainda o Jeep Renegade em seu calcanhar (26.134). As vendas diretas nunca foram o forte do EcoSport (caiu de 1.036 para 727), mas sim do Renault Duster (subiu de 1.241 para 1.982). Portanto, embora a paralisação de Camaçari possa explicar sua queda, é um carro que tem sua posição ameaçadíssima. Quanto ao Ford Ka, apesar da queda provocada pela interrupção da produção, ele vai bem.

Atualmente, é o segundo carro de entrada (popular) mais vendido no Brasil, com 75.444 emplacamentos em 2015, atrás apenas do Fiat Palio (100.215). Da mesma forma, o hatch da Ford ocupa a vice-liderança nas vendas diretas, com 27.871 licenciamentos, contra 30.137 do Fiat Uno, o líder. Mas a Ford quer mais: “Com a normalização da produção, esperamos manter o desempenho de vendas do modelo adequado ao volume atual de demanda e acreditamos que vamos fechar 2015 com o Ka líder nas vendas no varejo e diretas”.

Somado com a versão sedã (Ka+), as vendas diretas do Ka sobem para 40.881 (portanto, mais de 10.000 à frente do Uno). Quando a Ford diz “varejo”, entretanto, deve estar se referindo ao ranking geral da categoria Carro de Entrada, que soma ambos, pois exclusivamente no varejo ele acumula 47.573 vendas – portanto, está atrás do Chevrolet Onix (88.831), do Fiat Palio (77.427), do Hyundai HB20 (76.737) e até do VW Fox (55.783). Mesmo se somarmos os 16.353 emplacamentos da versão sedã, a dobradinha Ka/Ka+ chegará a 63.926. Aplicando o mesmo critério da dobradinha hatch/sedã, a dupla Onix/Prisma dá um banho: já acumulou 135.231 vendas nas concessionárias. Depois vêm HB20/HB20S, com 114.476, e Palio/Siena, com 113.518. Logo atrás do Ka/Ka+ aparece a dupla VW Gol/Voyage, com 62.178.

No final das contas, nem a Ford é o Atlético Mineiro nem a Hyundai é o Corinthians. Afinal, num ano que já acumulou perdas de 23,3%, só a Honda (+15,2%), a Mercedes-Benz (+37,7%), a Audi (+36,2%) e a BMW (+3,7%) podem comemorar o fato de terem vendido mais carros em 2015 do que no mesmo período do ano passado. A Ford teve uma queda de 11,0% no volume de vendas e a Hyundai recuou 11,4%. A Ford passou de 243.343 vendas (9,1%) para 217.086 (10,5%). Já a Hyundai foi de 190.380 no ano passado (7,1%) para 168.578 este ano (8,2%). A diferença entre elas, que era de 52.963 veículos, agora é de 48.508. Ainda é muito carro! Portanto, Ford e Hyundai estão mais ou menos como o Santos e o São Paulo, brigando pelo quarto lugar. Corinthians mesmo seria a Honda, que subiu de 108.517 na temporada passada (4,0%) para 125.061 na atual (6,0%).

Os números, ah, os números…