09/06/2017 - 9:21
Ele fez fama como o arquiteto dos paulistanos abonados. Não tem ideia de quantas mansões desenhou nos Jardins, mas jura “que não há nenhuma rua na região que não tenha pelo menos uma casa feita por mim”. Foi pioneiro da Alameda Gabriel Monteiro da Silva, hoje reduto de lojas de design, mobiliário e decoração de interiores. Aos 90 anos, completados no dia 1º, o arquiteto Ugo di Pace, italiano radicado no Brasil desde 1948, só quer se divertir.
“Fiz uma observação. Quanto tempo me resta de vida? Um, dois, cinco (anos)?”, indaga. “Quero vivê-los como gostaria: no meio de minhas coleções de arte, que são minha vida, usufruindo com meus amigos o prazer de falar, de sentir, de apreciar a cultura.” Di Pace decidiu aposentar as pranchetas no ano passado e acaba de abrir uma galeria na mesma Alameda Gabriel Monteiro da Silva que ajudou a consagrar.
Galeria, não, aliás. Como ele faz questão de frisar, seu empreendimento é um estúdio – batizado de Studio 689. “Porque não é um espaço para venda de obras de arte. Minha intenção é me divertir com isso. Já ouvi o que queria ouvir, já ganhei o que queria ganhar”, ressalta. “Estar aqui é viver uma nova juventude. Ligo para meus amigos e falo que estou expondo. Todos vêm. E todos gostam.”
No espaço, a ideia é mesclar mostras com objetos e quadros de sua valiosa coleção pessoal de mais de 2 mil peças – de itens do século 2 a.C a quadros contemporâneos – com exposições de artista do seu gosto. Na última quarta, abriu ali uma mostra do artista Odamar Versolatto.
Jardins
Quando o arquiteto decidiu abrir seu primeiro escritório na Gabriel, em 1967, não imaginava que o local seria transformado em um reduto do ramo. “Foi uma oportunidade. Era uma casa barata à venda, na esquina com a (Rua) Groenlândia”, conta ele. “Antes, tive escritório na Avenida Ipiranga e na Rebouças.” Ficou nesse imóvel até a década de 1970, quando comprou o mesmo lugar onde hoje é o estúdio. No ano 2000, locou o ponto e foi projetar no bairro Morumbi, perto de onde mora.
“No ano passado, estava para renovar o contrato do locatário e resolvi voltar. Mas não para projetar”, relata ele. Nascia aí o atual espaço.
Di Pace parece orgulhoso do que se tornou a Gabriel. “Nem em Miami (nos Estados Unidos) há casas tão bonitas. Essa meninada fez muito bem para São Paulo, abriu lojas lindas, com conteúdo muito bom. Aqui é o único lugar onde eu me sinto feliz”, pontua.
Sobre a cidade, aliás, sua opinião também alude aos americanos. “Eu vou dizer uma coisa para você: até uns 15, 20 anos atrás, eu achava São Paulo uma cidade feia”, confessa. “Agora estou achando até bonita. Porque surgiram uns novos lugares que nem a região da (Avenida Engenheiro Luís Carlos) Berrini, aqueles prédios que fizeram perto do Shopping JK Iguatemi, avenidas enormes, grandes… Parece Nova York… Isto deu um upgrade extraordinário. Estou achando gostoso isso tudo.”
Enquanto dirige todos os dias entre seu apartamento no Morumbi e o seu estúdio nos Jardins, não raras vezes reflete sobre as transformações da cidade que o acolheu há quase 70 anos. “A vida daquele tempo se resumia às Ruas 7 de Abril e Barão de Itapetininga, onde ficavam as galerias de arte e os três cafés que a sociedade frequentava”, suspira. “Três quartos da vida no Brasil e, não tem jeito, me sinto mais brasileiro do que italiano.”
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.