10/06/2017 - 9:40
O presidente da Associação Brasileira de Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), Venilton Tadini, afirma que, apesar da crise, os investidores continuam interessados nas oportunidades do setor. Mas ele destaca que a infraestrutura brasileira tem questões que precisam ser resolvidas, como a falta de projetos estruturados para ir a leilão. Segundo ele, se tudo tivesse resolvido no País e não houvesse crise política, a vida já seria muito dura para solucionar os problemas da infraestrutura. “Para sair da situação que estamos hoje não será fácil”, diz ele, referindo-se ao baixo nível de investimento do País, que pode cair abaixo de 15%. A seguir trechos da entrevista:
Qual o reflexo da turbulência política no setor?
Há sempre um baque inicial. Mas o setor tem questões estruturais que precisam ser resolvidas e estão em andamento, como a estruturação do PPI, a forma de tratar os projetos, a estrutura dos editais e a preocupação com a proteção cambial. Tudo isso está em andamento e pode ser visto no resultado positivo dos leilões de transmissão, de portos e aeroportos, além do leilão de rodovias do Estado de São Paulo. Mas o País vive uma situação paradoxal. Você tem um déficit terrível de infraestrutura e não tem projetos maduros do ponto de vista de racionalidade econômica, da priorização e racionalidade microeconômica.
Mas hoje há ambiente para fazer um novo leilão?
Sim. Do ponto de vista da sinalização do núcleo econômico do governo nada foi alterado, conforme se vê nos pronunciamentos do ministro da Fazenda e dos presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado sobre a prioridade da agenda no Congresso. Com isso, você vê que rapidamente as flutuações negativas da bolsa e do câmbio voltaram. Se o mercado acreditar que essa agenda não vai andar e que o núcleo econômico do governo não vai continuar, o câmbio não será esse e a bolsa vai vir abaixo de 60 mil pontos. Mudou o patamar, mas uma coisa muito suave diante da turbulência que pode ocorrer caso a incerteza se torne crônica.
Hoje haveria investidor para arrematar algum projeto?
Acho que sim. Se as condições macroeconômicas, ou seja, se os juros continuarem em queda e o câmbio com relativa estabilidade, e as condições microeconômicas bem colocadas, haverá investidor interessado. São projetos de muitos anos. Agora, o que se teme é que, com a instabilidade, não se consiga nem trabalhar na viabilidade de projetos porque há uma dispersão de preço relativo enorme, porque ficam indefinidas as questões de previdência e trabalhista, de câmbio e de juros. Aí não dá pra fazer cálculo nenhum.
Mas hoje já não está assim?
O que está ocorrendo com o câmbio? Deu uma mexida e rapidamente voltou.
Mas há incerteza sobre as reformas?
Hoje há uma dúvida. Agora, no momento em que essa dúvida se transformar em realidade de que os ajustes não vão ocorrer, aí você vai ver o que vai ocorrer com câmbio e com os juros. Mas essa situação de instabilidade maior e incerteza ainda não existe. Há uma dúvida.
De qualquer forma, os investimentos estão muito baixos.
Sem dúvida. Do ponto de vista macroeconômico, você está mudando as variáveis para criar um ambiente de negócio para a atração de capital externo e interno. Estava sendo criado esse clima. Hoje, as condições objetivas não mudaram. Se tivesse qualquer expectativa mais negativa você já teria a diminuição da entrada de recursos, aumento da saída de recursos e o câmbio em outra direção. Por outro lado, não chegamos ao fundo do poço. O investimento está indo pra abaixo de 15%. Então, estamos longe de sairmos do processo recessivo. Temos algum sinal de IBCR (Índice de Atividade Econômica Regional), que ainda não se refletiu na taxa de desemprego. Mas, conforme for, o andar da carruagem pode piorar. O que estou dizendo é que não verificamos isso ainda. A certeza da piora e da instabilidade ainda não se enraizou nos agentes econômicos.
E por que não temos projetos?
Simplesmente por que o País perdeu a capacidade de fazer planejamento de longo prazo, de definir suas prioridades em projetos estruturantes. O que se habituou a fazer nos últimos anos é relação de projetos. Uma coisa é ter o nome do porto e de um trecho ferroviário, outra é ter o projeto mostrando a racionalidade econômica, a inserção dele do ponto de vista da competitividade, da prioridade da ação pública. Não temos projetos com esse nível de detalhamento. Há uma relação de projeto. É preciso transformar isso em projetos para serem licitados.
Estamos investindo metade do que é necessário para manter a infraestrutura. Na prática, o que isso significa?
Significa que há uma diminuição da competitividade, que a nossa inserção na economia global está piorando e que a atração de novos investimentos para novos segmentos da indústria não está ocorrendo. A indústria saiu de quase 18% do PIB para 10%. Aliás, daqui a pouco não vai precisar de infraestrutura, porque estamos perdendo indústria. Desde o Plano Real, a gente esqueceu as políticas estruturantes, de como definir o caminho de inserção internacional, as políticas de fronteira, a estrutura de geopolítica para definir eixos de crescimento. Estamos fazendo investimento de infraestrutura sendo agredidos pelos fatos, não por critério de racionalidade econômica. Como há deficiência em tudo, o projeto que fica maduro primeiro você coloca para licitar.
A infraestrutura está se deteriorando?
Para aquilo que já existe, sim. A malha rodoviária está deteriorada. A gente estava com o pé na areia movediça e agora estamos pela cintura. Não é só a crise de curto prazo para resolver. Se tudo tivesse resolvido, a vida já seria dura na infraestrutura. Para sair disso não será fácil. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.