22/08/2017 - 11:00
No mesmo dia em que foi confirmada a demissão do secretário Gilberto Natalini, a Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente, ainda sob seu comando, relatou à Justiça de São Paulo uma série de irregularidades e suspeitas envolvendo licenças ambientais de obras na capital, que vão da falta de pagamento de taxas por construtores à pressão e ameaça a servidores por empresas de consultoria que cuidam dos processos de liberação de empreendimentos. A Justiça já encaminhou as informações ao Ministério Público, e a Prefeitura investiga a denúncia.
As irregularidades foram relatadas em junho pela arquiteta que chefia a assessoria da Câmara Técnica de Compensação Ambiental (CTCA), órgão que analisa e emite o Termo de Compromisso Ambiental (TCA), necessário para a obtenção do Habite-se. No relatório enviado à Justiça, a CTCA afirma que quando a atual chefia do órgão tomou posse, em maio deste ano, o departamento mantinha 2.068 processos administrativos em tramitação, mas parte estava alocada “de modo não convencional, em locais indevidos”, sem explicação para isso.
O texto diz ainda que havia “mais de uma dezena de processos com certificados elaborados e publicados sem o pagamento do preço público” e “um grande número de pedidos de emissão de guias para pagamento ao Fundo Municipal de Meio Ambiente não emitidas”, causando prejuízo aos cofres públicos.
Ameaças
Além das questões técnicas, a secretaria relatou “pressões e ameaças” por oito empresas de consultoria contratadas pelos construtores, que cuidam de 70% dos processos de licenciamento ambiental no Município. São citadas: Kaplan Ambiental, Agrotexas, Arvoredo, Gaia Ambiental, Podarte, Brascaule, Dias Ambiental e IGJ Paisagismo. Procuradas, elas negam pressões, mas se queixam de “lentidão”
No documento, a chefe da CTCA afirma que “tem sido extremamente difícil lidar com o assédio e as ameaças que estamos sofrendo nos dias de atendimento” às empresas. As pressões viriam por ligações telefônicas e mensagens. Uma funcionária chegou até a ser avisada para “tomar cuidado com suas filhas quando saísse sozinha de casa”, segundo o relato.
Todos os TCAs são emitidos apenas mediante o recolhimento de tributos e execução de ações de compensação ambiental, caso as obras provoquem cortes de árvores ou causem outros danos. Após um pente-fino, o total de processos em tramitação havia caído para 1.897, dos quais 1.200 ainda aguardavam a apresentação dos alvarás por parte das empresas ou prazos para as firmas cumprirem ações de compensação ambiental.
Esse detalhamento foi enviado por Natalini à Justiça na sexta-feira, 18, dia em que ele foi demitido pelo prefeito João Doria (PSDB). Segundo a reportagem apurou, Natalini era cobrado internamente justamente para acelerar o processo de licenciamento de obras. Ele justificou a demora com a necessidade de investigar esse suposto esquema para liberar obras irregulares.
Empresas
As informações foram repassadas à Justiça juntamente com um recurso apresentado pela secretaria municipal contra uma liminar obtida pela Brookfield, incorporadora que pedia celeridade na análise de um certificado ambiental. O recurso, assinado por Natalini, afirma que a liminar havia sido concedida após narrativa “desleal” feita pela empresa.
É quando ele passa a listar as ações que estavam em curso para moralizar o setor de licenciamento. “Diante das graves irregularidades encontradas em relação aos procedimentos envolvendo tanto termo de compromisso ambiental quanto certificado ambiental de recebimento provisório, está ocorrendo maior cuidado e detalhamento na análise dos respectivos requerimentos.”
Defesas
A gestão João Doria informou, por nota oficial, que “está investigando as informações reportadas pelo ex-secretário à Controladoria-Geral do Município (CGM) e ao Poder Judiciário” e “não haverá prejuízos às apurações” com a saída de Gilberto Natalini da pasta.
“A CGM oferecerá suporte àqueles que se sintam, eventualmente, incomodados por eventuais pressões, até mesmo com a possibilidade de transferir funcionários para que estes sejam protegidos”, diz a nota da Prefeitura.
O novo controlador-geral do Município, Guilherme Mendes, informou que uma auditoria interna já foi feita na secretaria. “O que estamos fazendo agora é abrir uma sindicância na Corregedoria para apurar responsabilidades”, disse. Mendes não soube informar o número de pessoas investigadas e se a apuração inclui outras empresas.
A Brookfield, empresa autora da ação onde estão as informações do Verde, não quis comentar o caso. As empresas Agrotexas, Arvoredo, Podarte e IGJ negaram fazer pressão em cima dos servidores do Verde, mas reclamaram do que chamaram de “morosidade” ou “demora” para a emissão dos documentos.
A empresa Dias foi procurada, mas não respondeu aos questionamentos. A reportagem não conseguiu contato com as empresas Gaia, Brascaule e Kaplan. A gestão anterior, de Fernando Haddad (PT), não quis comentar o assunto. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.