20/09/2017 - 12:05
O ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot afirmou que os novos áudios gravados por delatores do grupo J&F com conteúdo capaz de anular o acordo dos executivos Joesley Batista e Ricardo Saud não foram enviados à Procuradoria-Geral da República por engano. Segundo ele, tratou-se de uma “casca de banana”. As gravações fizeram com que Janot pedisse abertura de inquérito ao Supremo Tribunal Federal para investigar os indícios de conduta criminosa dos delatores. Em uma das gravações, de quatro horas, Batista e Saud falam sobre suposta atuação do então ex-procurador da República Marcello Miller, dando a entender que ele estaria auxiliando na confecção de propostas de colaboração para serem fechadas com a PGR. Tal conduta configuraria, em tese, crime e ato de improbidade administrativa.
“Na leitura que fizemos, isso (entrega de áudios indicando omissão de informações aos procuradores) não poderia ter sido um equívoco, foi uma casca de banana mesmo. O ministro (Edson) Fachin (relator da Lava Jato no STF) lacrou os 11 áudios, nem nós conhecemos. Eles, com medo de um dos 11 áudios ser um dos que estão recuperados pela polícia, colocaram um jabuti. Lá na frente, quando estourasse o negócio, diriam que entregaram e nós ficamos calados. É óbvio que foi uma armadilha. E como desarma uma armadilha? Coloca luz sobre ela. Santa Carol (procuradora Ana Carolina Rezende)!”, relatou Janot em entrevista ao jornal Correio Braziliense.
Fora do cargo há três dias, Janot já espera uma pressão ainda maior agora que deixou a chefia do Ministério Público. “A pressão para cima de mim só vai aumentar”, diz o ex-procurador.
Janot afirma, ainda, que não foi à cerimônia de posse da sucessora Raquel Dodge porque não foi convidado e, sobre as acusações de agir com interesses partidários, afirma que “não criminalizou a política, criminalizou os bandidos”.
Embora sem criticar diretamente Raquel, Janot disse ter se “espantado” com a mudança na equipe da Lava Jato – apenas dois procuradores que trabalhavam com ele na operação foram mantidos. “Eu me espantei porque havia ofício formal, com convite para que toda a equipe da Lava Jato continuasse”, disse. O ex-procurador-geral diz que, durante churrasco de sua despedida no sábado, 16, dois procuradores de sua equipe receberam um telefonema da equipe de Raquel sendo desconvidados para a força-tarefa, Fernando Alencar e Rodrigo Telles.
Ausente na cerimônia de posse de Raquel, na segunda-feira, Janot diz que “quem vai em festa sem convite é penetra”. Com a presença do denunciado presidente Michel Temer (PMDB) na cerimônia, o ex-procurador geral nega que se sentiria constrangido na presença do peemedebista. “Estou na minha casa, as pessoas que têm que se sentir constrangidas, não sou eu”, disse.
Janot prefere não responder se há riscos para a Operação Lava Jato com a sua saída, mas diz duvidar que mudanças atinjam as forças-tarefa de Curitiba, Rio e São Paulo. “Se houver risco, não acredito que isso contamine nem Curitiba, nem Rio, nem São Paulo, que já têm investigações com pernas próprias”.
Sobre a comissão criada no Congresso para investigar empréstimos da JBS no BNDES, Janot acredita que ela é para “investigar os investigadores”. “Essa CPI não pode ser a CPI dos investigadores. Essa CPI tem que seguir o escopo dela. Não é a CPI dos empréstimos do BNDES? E querem investigar quem? Eu?”, questiona.
O ex-procurador-geral diz, ainda, que faz parte da defesa ter como estratégia desconstruir a figura do acusador. “De repente, passo a ser o vilão da história”, disse na entrevista. “O que fizeram comigo vão fazer com outros”.
O encontro com o advogado Pierpaolo Bottini, que representa Joesley, em um bar, foi justificado por Janot. “Meio dia, em um lugar público, frequentado por um zilhão de pessoas? A conversa não durou 10 minutos, não falamos de trabalho, de nada disso”, diz ao justificar que a reunião não é comparável ao encontro de Joesley com Temer no Palácio do Jaburu. “E advogado de bandido não é bandido, a gente tem que ter esse relacionamento”, acrescenta.
Janot não quis dizer se se sentiu traído pela suspeita de o ex-procurador Marcelo Miller ter tido encontros prévios com os delatores. “Se ele fez isso, foi sem o nosso conhecimento. E se fez sem o nosso conhecimento, ele não pode contaminar um ato que é nosso”, disse ao defender a validade das provas entregues pelos delatores.
O ex-procurador-geral, porém, diz que se sentiu traído ao saber do caso do procurador Ângelo Goulart, suspeito de ter atuado como infiltrado na força-tarefa da Operação Greenfield, e confirmou ter vomitado quatro vezes ao ter conhecimento dos fatos.