01/08/2025 - 15:42
Uma vida à la James Bond? A maioria dos funcionários da Stasi, o Ministério de Segurança do Estado, estava longe disso: atuavam como burocratas, em escritórios, ou vigiavam parentes e amigos.”Camaradas, precisamos saber tudo!”, costumava dizer Erich Mielke, chefe do Ministério da Segurança do Estado (Stasi) de 1957 a 1989, a seus funcionários. E, assim sendo, os cidadãos da República Democrática Alemã (RDA) – o nome oficial da finada Alemanha Oriental – eram sistematicamente vigiados.
Os informantes da Stasi podiam estar em qualquer lugar, entre colegas de trabalho ou amigos. A tarefa: localizar “parasitas do povo”, que, para a RDA, eram pessoas que criticavam ou desafiavam o regime e se aliavam ao “inimigo de classe”, ou seja, aos capitalistas “imperialistas” ou “fascistas” do Ocidente.
Com o argumento de proteger seus próprios cidadãos da suposta ameaça ocidental, o Muro de Berlim começou a ser erguido de 13 de agosto de 1961 como uma “barreira antifascista”.
Métodos: vigilância e intimidação
O “inimigo”, no entanto, também estava dentro do país, onipresente. Podia ser alguém que tivesse contado uma piada sobre o presidente do Conselho de Estado, ouvido música proibida, recebido cartas suspeitas com selos de países ocidentais ou mesmo pedido autorização para visitar a República Federal da Alemanha, a Alemanha Ocidental.
Tudo era suspeito, tudo estava no radar da Stasi. Fundada em 1950, a organização se considerava o “escudo e a espada” do Partido Socialista Unitário da Alemanha (SED), que deveria neutralizar todos os “inimigos” e, assim, garantir seu domínio na RDA.
Os funcionários da Stasi abriam o correio, grampeavam telefones e invadiam residências sem autorização. Intimidavam as pessoas, espalhavam boatos de que alguém era alcoólatra ou homossexual – ou, ainda mais perverso, de que mantinha contato com a Stasi. Muitos cidadãos da RDA acabaram presos por criticarem o regime.
Razões para trabalhar na Stasi
O próprio povo chamava a Stasi de “A firma” ou “Horch und Guck” (ouça e observe). Quando o Muro de Berlim caiu, no final de 1989, a Stasi tinha cerca de 90 mil funcionários efetivos e – dependendo da fonte – entre 100 mil e 200 mil colaboradores “não oficiais”; isto é, informantes que, voluntariamente ou sob pressão, denunciavam o “comportamento inadequado” de amigos e familiares.
O que os levava a apoiar um regime tão injusto? “Pode ter sido a sensação de poder sobre os outros. Mas também pode ter sido uma tradição familiar, de seguir os passos dos pais e talvez até dos avós que já faziam esse trabalho. Claro, havia também as promessas do ministério de que poderia ser uma atividade interessante, que talvez fosse possível até mesmo trabalhar no exterior. E, no fim das contas, era um emprego seguro, inclusive para quem não tinha uma carreira”, explica o historiador Philipp Springer.
Cotidiano monótono
Para seu livro “Die Hauptamtlichen” (que em tradução livre seria algo como “Os funcionários de carreira”), Springer encontrou no arquivo da Stasi fotos raras que mostram funcionários no trabalho. Normalmente, como supervisores, eles não apareciam na frente, mas sim atrás das câmeras. No entanto, o imaginário popular de uma vida emocionante de agente não era algo concreto.
“Talvez tenha havido um pouco de vida ao estilo James Bond quando se estava em missão no exterior e se espionava secretamente, por assim dizer. Na RDA, em áreas que não estavam tão próximas da atividade de espionagem propriamente dita, não era tão emocionante quanto se poderia imaginar”, diz Springer.
As fotos do livro apresentam momentos mais banais e amadores. Vê-se um homem na copiadora, outro numa escrivaninha e uma mulher trabalhando na cozinha. Às vezes, aparece apenas uma mão que pega um arquivo, ou pés diante de um aquecedor.
“É claro que são áreas que, à primeira vista, parecem totalmente normais e nada emocionantes, mas, ao mesmo tempo, são interessantes e enfadonhas como se aquelas pessoas trabalhassem numa empresa qualquer”, afirma o autor.
“No fim das contas, porém, todos esses funcionários também contribuíram para manter o aparato funcionando. Todos faziam parte desse sistema e foram treinados política e ideologicamente para acreditar que suas tarefas eram extremamente importantes para preservar o socialismo na RDA e defender o país dos supostos inimigos do Ocidente”, complementa.
Pequenas engrenagens na máquina da “firma”
Nem todos os retratados puderam ser identificados pelo nome. Quando isso foi possível, Philipp Springer contou suas histórias.
Um exemplo é a tenente Elfi-Elke Mertens, cujo pai já havia trabalhado na Stasi, e seu marido também era funcionário. Ela foi elogiada por seus superiores por sua “excelente disposição e dedicação”, sendo considerada “diligente” e “muito disposta”. Tanto que prometeu influenciar uma parente que queria viajar para o Ocidente. “Eu e meu marido conversaremos com ela novamente e, se ela não estiver disposta a desistir da viagem, romperemos nossos laços com ela”, comprometeu-se Mertens com seus superiores.
A sargento Sylke Kindler também está no livro. Ela apresentou a proposta de fixar uma câmera no fundo da cesta de compras para fotografar discretamente os arredores por meio de um orifício.
Consta também o ambicioso major-general Horst Böhm, tão leal ao regime que cometeu suicídio após o colapso da RDA, em 1990.
É permitido publicar fotos e nomes de funcionários da Stasi, diz Springer, mesmo daqueles que ainda estão vivos e talvez temam por sua reputação.
“A gente sempre pensa: ‘Bem, é uma máquina enorme e todos são pequenas engrenagens’. Mas, no fim das contas, são pessoas que decidem participar ou não de algo assim e dedicam toda a sua vida a trabalhar para um aparato injusto. E, claro, elas também precisam lidar com o fato de que existem arquivos sobre elas”, argumenta Springer.
Aprender com o passado
O fim definitivo dos serviços secretos da RDA ocorreu em janeiro de 1990. Mais de 111 quilômetros de arquivos, 41 milhões de fichas e mais de 1,7 milhão de fotos seguem disponíveis, além de cerca de 15 mil sacos de arquivos destruídos.
Muitos cidadãos da RDA solicitaram acesso a esses materiais: queriam saber qual papel seus amigos ou familiares desempenharam. Eram vítimas ou perpetradores? Ainda hoje, segundo Springer, há muitas solicitações.
“Mas também no plano político ou nacional isso deveria ter um papel importante, na minha opinião, porque foi todo um aparato que cometeu injustiças. É importante manter viva a memória disso. E acho que os jovens também deveriam se interessar por esse assunto, para que compreendam que têm a responsabilidade de garantir, em última instância, o nosso sistema democrático”, conclui.