27/02/2002 - 7:00
Anne Mulcahy, principal executiva da Xerox, até tentou disfarçar a euforia. Mas bastava alguém perguntar, nos últimos dias, sobre o futuro de sua companhia e a resposta, precedida de um largo sorriso, vinha pronta: ?A Xerox está de volta!? Ainda é cedo para estourar champanhe, é verdade, mas a empresa, que há dois anos acumulava dívidas de US$ 16,4 bilhões, havia perdido metade de seu valor patrimonial e parecia incapaz de convencer o mercado de que não era só sinônimo de copiadora, mostrou, enfim, sinais de reação. No último balanço, referente ao quarto trimestre de 2001, a Xerox exibiu o primeiro lucro, de US$ 79,9 milhões, após mais de dois anos de um intenso vermelho em seus resultados. A conquista se deu graças a um programa de redução de custos que também teve como efeito o fortalecimento do caixa da companhia ? em US$ 4,5 bilhões ? e a redução de quase metade das dívidas. ?Este é o começo de uma nova era para a Xerox?, disse Anne Mulcahy em entrevista exclusiva a DINHEIRO. Dias após o anúncio do lucro, divulgado no final de janeiro, o valor das ações da empresa de Connecticut subiu 10%. No acumulado do ano os papéis fecharam com alta de 37%. Analistas se surpreenderam, bancos abriram as portas para renegociar dívidas ? e voltaram a oferecer crédito ? e acionistas levantaram as mãos para os céus.
A ex-vendedora de equipamentos Xerox e atual chairwoman começou a reerguer a empresa com uma drástica redução de custos. Era preciso cortar US$ 1 bilhão rapidamente e ao mesmo tempo encontrar alternativas para fortalecer o caixa da companhia. Na outra ponta, Anne precisava convencer os credores a sentarem à mesa para renegociar dívidas. Em outubro de 2000, a estratégia saiu do papel e entrou como uma bomba no mercado. De saída, a Xerox fechou fábricas e mandou 13 mil funcionários embora. A heroína do mercado virou, neste episódio, vilã dos sindicatos. O enxugamento também atingiu a parte operacional da companhia. Dezesseis unidades de negócios transformaram-se em sete e joint ventures foram desfeitas ou vendidas. Atividades periféricas, como logística e assistência técnica, passaram para as mãos de parceiros e metade da produção foi direcionada à gigante Flextronics.
Faltava encontrar um rumo para os negócios da companhia. A Xerox viveu durante anos acomodada com sua condição de sinônimo de copiadora e ignorou as transformações do mercado. Só que a tecnologia engoliu a tradição, as perdas se acumularam e a empresa foi obrigada a rever sua estrutura. Escolheu o mesmo caminho seguido por gigantes como HP ou IBM: o de oferecer soluções tecnológicas para grandes e médias empresas, fornecendo know-how e equipamentos. Em outras palavras, a empresa passou a prestar consultoria para otimizar processos de gestão, manufatura ou desenvolvimento de produtos com o auxílio de parceiros de peso na área de softwares e tecnologia digital. A divisão de serviços já responde por 45% das receitas. As vendas são completadas com a área de produção (grandes equipamentos para empresas de porte) e office (pequenas máquinas para companhias médias). Nestas, a Xerox prepara novidades que podem assegurar o crescimento. Entre elas, máquinas pequenas que reúnem tecnologia de fax, impressão, cópia e são capazes de enviar e-mails. Há também o Igen3, equipamento digital para impressão colorida que deverá competir com marcas japonesas como a Canon. ?Mas o Igen3 chegará ao mercado no segundo semestre, enquanto as rivais japonesas já estão vendendo produtos. O iene fraco também ajuda a concorrência e por isso o produto da Xerox demorará a ganhar espaço?, avalia Ben Reitzes, do banco UBS Warburg. ?O foco na divisão de serviços talvez seja a aposta mais acertada?.
No Brasil, terceira operação da empresa no mundo, as atividades relacionadas à prestação de serviços vêm crescendo 200% ao ano nos últimos quatro anos. Thaís Marca, gerente da divisão de Global Services, contabiliza 70 grandes empresas em sua carteira de clientes, entre elas Itaú, Bradesco, Embraer, Electrolux e GM. Também fechou contrato com companhias de outros países como a Glaxo no México e a Pedevesa na Venezuela. ?A filial brasileira virou referência para outras unidades?, elogia Anne. ?O Brasil tem papel fundamental na reorganização da companhia?. No ano passado, Anne destacou para a filial brasileira o executivo português José Clara, homem que já havia comandado as operações da corporação na Inglaterra e Ásia Central. Missão de Clara: pilotar a operação enxugamento desenhada por Anne.
A Xerox do Brasil seguiu à risca a cartilha de corte de custos ? mandou embora 1,2 mil funcionários e terceirizou atividades ? e fez outras modificações. O financiamento de máquinas, por exemplo, deixou de ser feito com recursos próprios. Na quarta-feira 20, a companhia assinou contrato com três grandes bancos para fazer esta tarefa ? Clara não revelou o nome dos parceiros. A parte de distribuição foi repassada à holandesa TNT Logistics. Outro passo importante foi a mudança no sistema de importação de impressoras. O braço brasileiro deixará de importar direto da matriz repassando este serviço às empresas Ingram Micro e Tech Data. ?Isto significa redução de custos e conseqüente melhora no preço dos produtos?, afirma Clara. Por fim, a empresa irá concentrar esforços no atendimento às mil maiores empresas privadas e os 500 maiores órgãos e empresas públicas. Pequenas companhias serão atendidas por terceiros. A operação deve render US$ 316 milhões aos cofres da filial.
A lição de casa vem sendo cumprida. A grande questão dos analistas é saber até quando Anne terá fôlego para continuar cortando custos, desenvolvendo produtos de ponta e convencendo clientes de que o nome Xerox não foi permanentemente comprometido com a letargia do passado. Recuperações deste porte são raras, mas a história mostra exceções. A Xerox luta para ser uma delas.
A receita de Anne |
A principal executiva da Xerox Corp. falou com exclusividade a DINHEIRO na segunda-feira 18. Eis os principais trechos: Sobre corte de custos: Estratégia de crescimento: Dívidas de US$ 8,5 bilhões: Programa de recuperação da Xerox: |