O ex-presidente da Bolívia Carlos Mesa acredita que o momento  político brasileiro evidencia a solidez democrática do País. Embora  considere que um processo de impeachment sempre tem um viés político em  sua fundamentação, Mesa acredita que as instituições investigativas,  representadas pela Operação Lava Jato, são capazes hoje de garantir a  transparência dos fatos no Brasil.

“A possibilidade de a  estabilidade política e a vigência da democracia não estarem em risco  demonstra que o País tem solidez democrática”, afirmou Mesa, em  entrevista à reportagem. O político presidiu a Bolívia entre 2003 e  2005, anos em que, no Brasil, a presidência era ocupada por Luiz Inácio  Lula da Silva.

Diante do processo de impeachment e dos  desdobramentos das investigações da Polícia Federal (PF) no âmbito da  Lava Jato, Mesa foi enfático ao elogiar o processo investigativo. “O que  ocorre no Brasil, mais do que o incremento da corrupção, que sem dúvida  é um tema altamente preocupante, é uma capacidade muito grande para  revelar feitos irregulares que também ocorriam no passado, e que não se  conhecia como se conhece agora através da Operação Lava Jato”, afirmou o  político boliviano. “Isso implica uma responsabilidade e um compromisso  do Ministério Público para levar adiante uma investigação sem limites e  sem nenhum tipo de restrição”, complementou.

Mesa  salientou, contudo, que um processo de impeachment, ainda que dependa da  sustentação jurídica, sempre está vinculado a uma mobilização política.  ”Não há nenhum tipo de ação na política que não tenha componente  político. Há uma compreensível forma de atuar dos políticos de  aproveitar a debilidade do oponente. Todo impeachment tem um componente  político”, disse Mesa, que participou hoje do fórum “Desafios ao Estado  de Direito na América Latina – Independência Judicial e Corrupção”,  promovido pela FGV Direito SP, pelo Bingham Centre for the Rule of Law  (Londres) e pelo escritório global de advocacia Jones Day.

Questionado  se o número de casos de corrupção revelados pela Polícia Federal  durante os governos de Lula e da presidente Dilma Rousseff era  surpreendente, Mesa evitou citar os líderes brasileiros, e reforçou a  defesa ao modelo investigativo brasileiro. “As dimensões da corrupção  (no Brasil) são muito impressionantes para qualquer país do mundo, não  só para a América Latina. Porém, também há que se destacar que a essas  investigações é permitido revelar coisas que provavelmente vinham  acontecendo há muitos anos antes dos últimos períodos”, enfatizou.

Mais  cedo, Mesa participou de uma rodada de debate com o professor da FGV  Direito SP e membro do Ministério Público do Estado de São Paulo,  Ronaldo Macedo Jr., que comparou a Operação Lava Jato ao filme “Tropa de  Elite”. “O que se viu na Operação foi a formação da Tropa de Elite:  jovens policiais e um juiz, que está sendo tratado como um ‘salvador’.  Mas o que há de impressionante nessa operação foi a formação de uma  equipe que trabalha conjuntamente, coordenadamente”, disse.

Para  ele, no âmbito das investigações sobre corrupção, a delação premiada e  os acordos de leniência rompem com a percepção antiga de igualdade, mas  que atenuam a atual definição de igualdade. “Mas é claro que traz novos  problemas: a seletividade que traz isso”, ponderou Macedo.