Há 38 anos, o bancário gaúcho Miguel Cícero Terra Lima carrega um crachá no Banco do Brasil. Desde o início da carreira, quando foi aprovado em um concurso para se tornar caixa de agência, até assumir a presidência da empresa de previdência complementar Brasilprev há exatamente um ano, ele sobreviveu a 18 presidentes do BB, acompanhou a oferta de ações de 2010 e, mais recentemente, participou da preparação da abertura de capital da BB Seguridade na bolsa, maior oferta pública inicial de 2013. Agora, Terra Lima quer mais. A empresa que comanda é a número 1 do ramo em captação e possui aproximadamente 1,64 milhão de clientes. 

 

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Crescimento na agenda: há um ano no comando, Terra Lima tem como desafio

ampliar a base de clientes

 

No entanto, ela perde em patrimônio para concorrentes como Itaú Unibanco e Bradesco. Seu desafio para 2014 será não só manter a fatia de mercado da companhia, atualmente em 22,04%, mas também elevar o total de ativos – que ficou ao redor de R$ 80 bilhões em 2013. “Vamos tentar manter o ritmo de crescimento”, afirma Terra Lima. Caso o objetivo seja alcançado, o volume deverá ultrapassar a barreira dos R$ 100 bilhões em 2014, levando-se em consideração que o avanço, nos 12 meses encerrados em outubro, foi de 26,4%, segundo dados da Federação Nacional de Previdência Privada e Vida (Fenaprevi). 

 

Mesmo assim, não será suficiente para alcançar a liderança do Bradesco, que detém R$ 117,8 bilhões, com uma participação de 32,3%. “É a única métrica em que não somos líderes, apesar de o sermos em crescimento”, diz Terra Lima, que destaca o avanço ocorrido desde 2009, quando os ativos somavam apenas R$ 29 bilhões. “Vamos devagar e sempre. Afinal, o nosso lema é continuidade e disciplina.” Terra Lima assumiu a tarefa em um momento delicado para o mercado de previdência, principalmente pelo cenário turbulento de 2013. Os gestores consideraram o ano passado uma quase tempestade perfeita. 

 

A economia cresceu menos que o esperado e, para piorar, os fundos foram pegos de surpresa com o aumento da taxa de juros ao longo do ano. “No fim de 2012, os gestores acreditavam que os juros se manteriam baixos em 2013, e quando o Banco Central mudou a direção, tivemos uma mudança brusca”, afirma Osvaldo Nascimento, presidente da Fenaprevi. Para tornar ainda mais difícil o quadro, a grande aposta dos especialistas não se confirmou. Os executivos do setor esperavam que, depois de comprar carro, casa e eletrodomésticos, a classe C emergente iria eleger a previdência privada como o novo objeto de desejo. No entanto, isso não ocorreu. 

 

Entre 2005 e 2011, mais de 40 milhões de brasileiros ascenderam das classes D e E para a classe C. Já o número de planos de previdência privada avançou de 6 milhões para 14 milhões. Mesmo tendo mais do que dobrado em termos relativos, o mercado não acompanhou o crescimento absoluto dos novos clientes em potencial. O aumento do emprego foi outro entrave. Atualmente, mais de 70 milhões de brasileiros têm carteira assinada e contam com a proteção do INSS, o que retira mercado da previdência privada. “A maioria das pessoas acha que o teto de R$ 4 mil pago pela previdência social é mais do que suficiente, pois supera largamente o salário de muitos trabalhadores”, diz Nascimento. 

 

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Aldemir Bendine, presidente do Banco do Brasil: esteve à frente

da maior abertura de capital brasileira. Em 2013, a BB Seguridade

levantou R$ 11,4 bilhões na bolsa

 

“Além disso, a falta de educação financeira no Brasil e de uma reforma da previdência inibem o desenvolvimento dos planos privados.” Para crescer, Terra Lima aposta em dois segmentos de mercado ainda pouco explorados pela empresa. Um deles está, literalmente, em casa: os correntistas do Banco do Brasil. Outro alvo prioritário são as companhias de médio porte, conhecidas como middle market. A estratégia segue os mesmos passos dos produtos de previdência voltados para micro e pequenas empresas, lançados em outubro do ano passado e que agradaram aos clientes. 

 

Em apenas 60 dias, o volume de novos negócios foi o equivalente à metade de tudo o que foi comercializado pela Brasilprev nos últimos cinco anos. A explicação para tamanho interesse é o formato do produto. Nele, a previdência do funcionário não precisa contar com a participação financeira da empresa contratante. Ou seja, o dono do negócio assina um contrato em sua agência do Banco do Brasil e, a partir de então, todos os empregados podem aderir ao plano. Além disso, quando os participantes atingem um determinado patamar de recursos, a companhia pode assinar um contrato adicional que oferece aos funcionários a possibilidade de acessar linhas com taxas mais baixas.

 

A expectativa é mudar a composição da carteira de clientes da Brasilprev, que hoje é composta em 90% por pessoas físicas e apenas 10% por pessoas jurídicas. “A tendência é mudar, mas isso leva tempo, porque o mercado de pessoas físicas também aumenta muito”, afirma Terra Lima. “Este vai ser o ano em que vamos arregaçar as mangas para ficar ainda mais perto dos clientes.” Foi isso que garantiu, por exemplo, que, em tempos de resgate dos fundos de previdência, acontecidos em meados de 2013, a Brasilprev tenha tido captação líquida positiva. “Fizemos um roadshow com nossos especialistas para explicar para os clientes que previdência é investimento de longo prazo e que não valia a pena realizar prejuízo”, diz. 

 

Mesmo com o movimento de retirada recorde para o setor no ano, a captação líquida da indústria ficou no azul. De acordo com dados compilados pela Associação Brasileira de Entidades do Mercado Financeiro e de Capitais (Anbima), o total chegou a R$ 22,7 bilhões, mas ainda assim ficou abaixo dos mais de R$ 35 bilhões de 2012. “Estou mais otimista com 2014, acredito que a captação vai crescer 10%”, afirma Nascimento, da Fenaprevi. Terra Lima também está otimista. Quando perguntado sobre um futuro mais longínquo, o executivo, que há quase quatro décadas trabalha no BB, sorri e diz que esse será o seu último posto na casa. “Vai chegar a hora de pegar a previdência privada e ir morar na praia.”

 

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