25/01/2018 - 11:53
Em 1996, a ovelha Dolly ficou conhecida por ser o primeiro animal clonado a partir de uma célula adulta, com uma técnica conhecida como transferência nuclear de célula somática (SCNT, na sigla em inglês). Agora, mais de duas décadas depois, cientistas chineses utilizaram pela primeira vez a mesma técnica para produzir os primeiros clones de macacos. De acordo com especialistas ouvidos pelo jornal O Estado de S. Paulo, porém, o avanço não significa que a ciência está mais próxima de uma técnica de clonagem para reprodução humana.
A clonagem de primatas era considerada um grande desafio e os cientistas levaram décadas para desenvolver um método capaz de realizá-la com sucesso. Segundo os autores do estudo, publicado na quarta-feira, 24, na revista Cell, esse tipo de clonagem em macacos permitirá pesquisas com populações de animais “personalizados” e geneticamente uniformes. Assim, será possível estudar uma doença genética, por exemplo, produzindo dois macacos idênticos, com uma modificação no gene cuja atuação se pretende verificar.
“Há muitas questões sobre a biologia dos primatas que podem ser estudadas a partir desse modelo adicional”, afirmou o autor principal do estudo, Qiang Sun, da Academia Chinesa de Ciências. “Isso vai criar modelos para análise não só de doenças cerebrais com base genética, mas também de câncer, doenças imunológicas ou distúrbios metabólicos. Também poderemos testar a eficácia de drogas para esses problemas antes do uso clínico.”
Os dois macacos clonados, batizados de Zhong Zhong e Hua-Hua, nasceram há oito semanas e seis semanas, respectivamente. Eles não são os primeiros clones de primatas, pois em 1999 um macaco Rhesus foi clonado por um método mais simples, semelhante ao processo natural que leva ao nascimento de gêmeos. Essa técnica, porém, pode gerar no máximo quatro clones por vez.
Zhong Zhong e Hua Hua, por outro lado, foram criados com a técnica SCNT, na qual o núcleo de uma célula reprodutiva é removido e substituído pelo núcleo de células já diferenciadas de outras partes do corpo. Esse óvulo reconstruído se desenvolve em um clone do organismo que doou o núcleo. Em tese, não há limites para clones.
Para fazer a clonagem, os cientistas transferiram células de fibroblastos – um tipo de célula do tecido conjuntivo – de fetos de macacos para um óvulo de uma macaca cujo núcleo foi extraído. O óvulo resultante foi implantado em duas macacas adultas. Zhong Zhong e Hua Hua são clones dos mesmos fibroblastos de fetos. Como foram utilizadas “barrigas de aluguel” diferentes, um nasceu 15 dias depois do outro, embora sejam clones idênticos.
Antes de utilizar fibroblastos de fetos, os cientistas utilizaram macacos adultos como doadores dessas células, mas o resultado foi um fracasso: os clones gerados viveram apenas por algumas horas. “Tentamos vários métodos diferentes, mas só esse funcionou. Falhamos muito antes de encontrar uma maneira de clonar um macaco com sucesso”, disse Sun.
Segundo os cientistas, os núcleos de células diferenciadas de macacos têm se mostrado extremamente resistentes à SCNT, em comparação às células de outros mamíferos, como camundongos, vacas e ovelhas. A dificuldade, de acordo com eles, consiste em reprogramar o código genético da célula madura quando ele é fundido ao óvulo cujo núcleo foi extraído – já que os genes desse tipo de célula contêm as “marcas” que controlam sua ativação e inativação. Superar esse problema exigiu três anos de trabalho.
Eficiência limitada
De acordo com Lygia da Veiga Pereira, pesquisadora do Laboratório Nacional de Células-Tronco Embrionárias, o estudo é um marco para a ciência, “pois os primatas são modelos muito melhores para o estudo de doenças em humanos”. “Mas ele (o trabalho) também mostra que o método ainda não é eficiente o bastante para gerar uma quantidade satisfatória de clones de macacos para realizar esse tipo de análise.”
Segundo ela, a principal novidade é o uso de moduladores epigenéticos. “O grande desafio da clonagem com reprogramação celular é apagar as marcas epigenéticas – isto é, as marcas que determinam os genes a ficarem ativos ou inativos – e colocar uma nova marca, de acordo com o que precisamos. Eles fizeram isso utilizando moduladores epigenéticos, que funcionam como ‘borracha química’, apagando as marcas originais dos fibroblastos, facilitando sua reprogramação.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.