TERÇA-FEIRA, 22 DE JULHO: Bovespa divulga um fato relevante sobre a reorganização societária para unificação da TOTVS e da Datasul em um só grupo. Quinta-feira, 24 de julho: Laércio Cosentino, presidente da TOTVS, entra na sede da companhia, em São Paulo, acompanhado de Miguel Abuhab e Jorge Steffens, presidentes do conselho e da Datasul, respectivamente. Nas mãos, uma bandeira branca da paz. ?Depois de muitos anos de elogios e disputas decidimos nos unir?, brinca Cosentino. O executivo tem motivos de sobra para quebrar a timidez habitual. Quase dez anos depois da primeira tentativa de incorporação, ele convenceu Abuhad, fundador e maior acionista da Datasul, a concordar com o negócio. Em pouco mais de 30 dias, a decisão foi tomada e agora aguarda- se o sinal verde dos outros acionistas. A notícia pegou os nove mil funcionários das duas empresas de surpresa, assim como o mercado de ações. Em uma transação de R$ 700 milhões, TOTVS e Datasul formam um conglomerado de R$ 778 milhões de receita bruta anual, uma base de 21 mil clientes em 18 países e 270 canais de distribuição. ?Estamos criando uma AmBev dos softwares?, acrescenta Cosentino. Juntas, elas conquistarão a liderança no mercado brasileiro e a segunda colocação na América Latina, superando a Oracle e ficando atrás da SAP. ?E qual será a Budweiser do segmento??, deixa no ar Abuhad, no mesmo tom descontraído, evidenciando a ambição de crescimento da nova gigante.

A comparação com a recente transação da InBev não surgiu por acaso. A obsessão de Cosentino pelo modelo de negócios da cervejaria vem de longa data. A InBev concretizou em menos de uma década o que o executivo sonhava em fazer desde os 19 anos de idade. Determinado, ele descobriu na faculdade de engenharia, em 1978, a vocação para o segmento de tecnologia. Três anos depois de ingressar na fornecedora de sistemas Siga, de Ernesto Haberkorn, convidou o chefe para um almoço. No encontro, propôs entrar no quase desconhecido mundo da microinformática. Cosentino sabia que a explosão dos computadores pessoais estava próxima e queria estar à frente da revolução. Haberkorn saiu de lá convencido. Nascia ali a Microsiga. De funcionário, Cosentino virou sócio de seu primeiro e único chefe. A nova empresa acabou comprando a Siga em 1989. ?Ele sempre teve uma liderança extraordinária. Criou uma cultura corporativa muito forte e é muito reconhecido pelos seus funcionários?, conta Maurício Fernandes, vice-presidente da Virtus, holding de TI. Outra particularidade de Cosentino está em um estilo próprio de gestão. Todos os dias, às 10h, interrompe suas atividades para se juntar aos funcionários no terraço da confortável sede da TOTVS. O momento é dedicado a conversas informais, piadas e um bom café da manhã.

Os projetos de Cosentino sempre foram mais ambiciosos do que a condição financeira de sua empresa. Por conta disso, criou um modelo inédito de franquias de distribuição e, em seguida, atraiu o fundo Private Equity Advent Internacional. Foi com um aporte financeiro de R$ 40 milhões do BNDES, em 2005, que a Microsiga recuperou a cota do fundo e iniciou uma reviravolta no mercado de ERP brasileiro, segmento de softwares que controlam e automatizam todas as atividades de uma empresa. Na época, as líderes nacionais eram Logocenter, RM Sistemas, Datasul e Microsiga. Cosentino não sossegou enquanto não incorporou as três concorrentes. A primeira da lista foi a Logocenter, dando origem à holding TOTVS, que significa ?totalidade?, em latim. Um ano depois, em 2006, abriu o capital na Bolsa de Valores. O IPO captou R$ 460 milhões, o que possibilitou a compra da RM Sistemas um mês depois da estréia na Bolsa.

Só faltava incorporar a Datasul. As duas empresas adotaram estratégias semelhantes. Ao mesmo tempo que a TOTVS se desenvolvia, a Datasul ganhava musculatura com um modelo de gestão baseado em franquias de desenvolvimento e com um IPO, que captou R$ 137 milhões, também em 2006. Desde então, estendeu sua presença para a América Latina, os Estados Unidos, o México e o Canadá. Paralelamente, Cosentino comprou seis empresas e Jorge Steffens, da Datasul, coordenou a compra de dez companhias.

Mas os fatos recentes provaram que, assim como para o CEO da In- Bev, Carlos Brito, nada é impossível para Cosentino. Da mesma forma que a transação da cervejaria, o homem dos softwares precisou de pouco mais de um mês para ?incorporar? e não ?adquirir?, como prefere dizer, a Datasul. Uma transação que gerou uma certa estranheza entre os analistas de mercado. ?A TOTVS pagou barato pela Datasul, quase 19% a menos do que estimávamos?, diz o analista Alex Pardella, da Banif Securities. A analista Jaqueline Lison, do Banco Fator, vê com bons olhos a aquisição para a TOTVS. ?A empresa consolidará sua posição de mercado na América Latina?, acredita. Com a incorporação da empresa, a TOTVS terá R$ 230 milhões em caixa e, em breve, receberá uma linha de crédito de R$ 400 milhões do BNDES ? verba o suficiente para Cosentino continuar seu plano de aquisições. ?Somos da filosofia de Napoleão. Primeiro é preciso avançar no mercado interno para depois seguir expandindo nossas fronteiras. Passo a passo chegaremos lá?, anuncia o consolidador.